Por Dora Kramer colunista do O Estado de S. Paulo
Diga-se o que for sobre a senadora Marta Suplicy. Ressalte-se a impertinência, a inadequação verbal e o toque acentuado de presunção, mas reconheça-se nela uma qualidade em escassez no mercado: a insubordinação mental.
Fala alto o que seus companheiros de PT dizem em voz baixa, mas não repetem em público por medo de contrariar o comandante em chefe.
Quando Lula queria fazer de Ciro Gomes candidato a governador de São Paulo, Marta foi a única a verbalizar a insatisfação da maioria, dizendo que ele não tinha "nada a ver" com o Estado.
Quando o ex-presidente deu os primeiros sinais de que faria de Fernando Haddad candidato a prefeito, Marta postulava o lugar e duvidou: "Só se for para perder".
Depois avisou que José Serra acabaria sendo candidato pelo PSDB e mais adiante se rebelou contra a aliança com o prefeito Gilberto Kassab, considerando a hipótese "um pesadelo".
Há dois dias disse via Twitter que a estratégia do PT na eleição municipal está errada e aconselhou Haddad a "gastar sola de sapato" se quiser deslanchar.
Marta Suplicy tem falado pouco, evitado entrevistas e, sobretudo, se esquivado da pressão para mergulhar na campanha como uma espécie de embaixadora de Haddad junto ao eleitorado, principalmente o feminino e residente na periferia da cidade.
Nesse vácuo vicejam dúvidas sobre a disposição dela de reforçar o time petista nessa eleição e também surgem versões de que Lula poderia recuar e fazê-la candidata do PT à Prefeitura.
O que é fato ou ficção, ninguém melhor que a própria para esclarecer.
"Isso (recuo de Lula) não vai acontecer nem eu tenho pretensão de voltar à disputa. É página virada, já aceitei que não sou candidata, mas não preciso participar de uma campanha equivocada nem acreditar que existem soluções mágicas porque elas não existem", diz a senadora.
A magia a que se refere é o poder que se atribui a ela, ou a Lula, de fazer decolar a candidatura de Haddad. "Quem precisa se conectar com o público é o candidato, não dá para transferir isso", argumenta.
Participar ela vai. Mas só no momento certo, a partir do início oficial da campanha ou, daqui até lá, em situações que considere realmente importantes. Por exemplo: no próximo dia 13 na inauguração de um Centro Educacional Unificado (CEU) em São Bernardo. "No momento inclusive tenho muito trabalho como vice-presidente do Senado."
A senadora acha que não adianta e pode até ser contraproducente sair pela cidade com o candidato a tiracolo como gostaria o partido. "Não acrescenta nada e pode até haver reação negativa daqueles que preferiam a minha candidatura."
Marta assegura que estará no horário de TV e dará declarações de apoio quando "couber". Agora, condiciona seu engajamento a mudanças profundas na estratégia.
As essenciais: "Ampliar as alianças e reforçar a presença de Haddad junto ao eleitorado e à militância. Ele é que precisa empolgar".
Em suma, a senadora faz seu jogo: administra com independência seu patrimônio eleitoral e leva o PT cortar um dobrado de aflição em decorrência da submissão cega a Lula.
Quando lhe interessa, Marta se submete às circunstâncias, mas mantém a alma intacta.
Sem saída. Com a reputação irremediavelmente ferida devido à proximidade com um notório cliente da Justiça dito empresário de jogos, o senador Demóstenes Torres não tem outro jeito a não ser encerrar por aqui sua curta carreira de político.
Até em nome dos muito bons serviços prestados ao mandato - em diversos campos, com destaque ao papel dele em prol da aprovação da Lei da Ficha Limpa -, o senador tem um dever de coerência: aplicar a si o mesmo rigor ético que adotou para tudo e para todos.
Lamentável que um parlamentar de qualidade tenha a trajetória interrompida enquanto outros envolvidos em episódios tão ou mais graves, e muito menos qualificados continuem por aí, mas o gesto da retirada serviria até para marcar a diferença.
Nenhum comentário:
Postar um comentário