Marina Silva virou sinônimo de ameaça a um Estado degradado
pela traficância de poder enriquecedora de dirigentes partidários que se
distanciaram da representação do povo e do pluralismo político, certos da
impunidade assegurada pela dissimulação da verdade e da propaganda enganosa.
Programas assistenciais insuficientes são apresentados como
conquistas do povo pobre, sempre chamado a se opor aos demais brasileiros, os
da classe média, chamados de ricos, na versão caricata da luta de classes que
traz fortunas aos bajuladores bem remunerados do poder.
De tão miseráveis, os miseráveis não percebem que são
enganados quando se anuncia quantos brasileiros saíram da linha de extrema
pobreza, definida por uma renda mensal inferior a setenta reais para cada
pessoa de uma família. Abaixo de setenta está na extrema pobreza. Com setenta e
um, está fora. É de um ridículo que beira a atrocidade. É o cinismo a desacatar
os pobres
Felizes estão os que recebem o Bolsa Família. Como já dizia
o Betinho, quem tem fome tem pressa. Mas tal felicidade ficaria abalada se
soubessem que ganham uma terça parte do auxílio-reclusão.
Pois é em nome dessas e outras migalhas alardeadas como
alavancas da dignidade da pessoa e da cidadania que se escorcha a população com
impostos, taxas, contribuições que sustentam as máquinas corrompidas.
Contra quem se insurge, vem o brado galhofeiro da luta de
classes, que ecoa no silêncio covarde dos que têm o dever de falar e silenciam
temerosos do patrulhamento que dissuade a reação à farsa.
Os beneficiários da farsa, da tragédia e do medo impõem
obstáculos à trajetória de Marina e ao registro, na Justiça Eleitoral, da Rede,
e procuram desqualificar suas virtudes anunciando que eles não cumpriram as
regras do jogo. Temem a rebeldia de uma voz serena.
De que jogo falam, afinal de contas? Da cumplicidade, das
alianças secretas? Do oportunismo? Da delinquência estatal e privada?
Pois bem. Eles desconheciam o jogo e suas regras, e, se o
conheciam, preferiram não jogá-lo. Mantiveram a postura digna e decidiram não
encaminhar à Justiça 220 mil fichas de verificação duvidosa.
Correndo contra tudo, já tiveram validados 450.432 apoios ao
Rede e 95.206 outros não foram validados sem qualquer razão explicativa do ato
administrativo, como mandam nossas leis. Totalizam, portanto, 545.638
apoiamentos legalmente amparados, 53 mil acima do número mínimo de 492 mil.
Não há mágica nos números. A mágica estará na interpretação
da lei. Prazos não cumpridos pelo poder público e recusa de emitir documentos
segundo as normas atacam direitos dos cidadãos.
No caso de Marina querem inverter a história, como se
estivesse ela a pedir um privilégio. Se o estivesse, talvez fosse atendida. Mas
não está. Reclama o cumprimento da Constituição do País.
Em 27 de novembro de 1984, ao decidir questão sobre a
eleição indireta para Presidente da República, ocorrida em 1985, o Tribunal
Superior Eleitoral, o mesmo ao qual agora Marina recorre, decidiu contra as
regras desejadas pelo Poder de então, que queria anular os votos dados a
candidato de partido diferente do parlamentar votante. Pela pleiteada regra da fidelidade
partidária, Paulo Maluf estaria previamente eleito presidente da República. O
Tribunal se louvou acima de tudo na Constituição e libertou o parlamentar
eleitor da regra da fidelidade partidária: deu Tancredo. A ditadura acabou.
Artigo do deputado federal Miro Teixeira (PDT-RJ), publicado no O Globo.
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