Por Mario Simas Filho, da ISTOÉ
A história ensina que alcaides e governantes em geral não
costumam terminar bem quando são movidos por um insaciável apetite
arrecadatório. Na Inglaterra, da primeira metade do século XVII, o rei Carlos I
se notabilizou como um ávido criador de “tonelagem e peso”, como eram tratados
os impostos na época.
Graças a sua sanha de arrecadar mais e mais, jogou o reino
sob uma ditadura militar de 11 anos, estabeleceu uma guerra civil e acabou
decapitado em 30 de janeiro de 1649. No Brasil, o estopim da Inconfidência
Mineira foi exatamente a “Derrama”, expressão usada para designar as taxas que
os chamados homens bons (os ricos) deveriam pagar à Coroa para atingir a meta
da arrecadação.
Em 1788 os portugueses estabeleceram que a contribuição
deveria chegar a 100 arroubas de ouro. No ano seguinte veio a insurreição. São
apenas dois exemplos que certamente o professor de ciência política da
Universidade de São Paulo, Fernando Haddad, conhece bem. O problema é que o
prefeito paulistano, Fernando Haddad, parece não ter assimilado o ensinamento.
O morador de São Paulo paga o maior Imposto Predial e
Territorial Urbano do Brasil, embora esteja longe de usufruir dos melhores
serviços públicos. O título de grande arrecadador, no entanto, não satisfaz o
prefeito, que, com menos de um ano de gestão, já vem ganhando a alcunha de
Hataxa e propõe à Câmara um reajuste equivalente a pelo menos seis vezes a
inflação.
Para saciar a ganância argumenta com a enorme valorização
imobiliária. Uma tese já questionada na Justiça, pois a valorização dos imóveis
é uma expectativa de seus proprietários que poderá ou não se concretizar no
momento de uma eventual comercialização. E nesse momento há um tributo
específico a ser pago pelo contribuinte.
Outro argumento é o de que a prefeitura precisa fazer caixa
para enfrentar o congelamento das tarifas de ônibus e atender às demandas
manifestadas nas ruas em junho. Também não tem sentido, na medida em que o
próprio governo municipal não sabe os destinos de pelo menos 50% do que é
arrecadado com o IPTU.
Não encontra parâmetro no mundo aplicar na correção do IPTU
a variação do mercado imobiliário, embora a Planta Genérica de Valores deva
mesmo ser corrigida. Qualquer aumento acima da inflação é absurdo! E, mais,
pode e deve gerar uma avalanche de inadimplência de contribuintes sem condições
de honrar o compromisso. Afinal, muitos desses possuem o imóvel há anos, quando
essa suposta valorização provocada pela especulação imobiliária atual não era
sequer cogitada.
Seus orçamentos certamente não comportarão – na maioria dos
casos – uma descarga do reajuste, inacreditável, de dois dígitos. O equívoco de
Haddad deverá trazer históricos prejuízos eletorais não só ao PT, mas a toda a
classe política que compactuar com esse descalabro tributário.
Na Câmara dos Vereadores reside o último foco de resistência
à medida, que deverá ser julgada mais uma vez nesta semana, sob protesto
generalizado da população paulistana. Como aconteceu com Carlos I na Inglaterra,
o Legislativo tenta fazer alguma resistência. Lá, o rei fechou o Parlamento.
Aqui, Haddad buscou aumentar a bancada de vereadores para
fazer valer suas taxas. Não seria mais lógico, eficaz e prudente investir na
investigação sobre os destinos dados ao que já é arrecadado do que castigar o
contribuinte com novas tungadas? Haddad, com menos de um ano de governo, pode
estar se credenciando para o papel de um dos mais impopulares administradores
municipais, E, às vésperas da corrida que irá definir a sucessão presidencial,
isso não é nada bom.
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