Do UOL
Ao longo de 126 anos de história republicana, o Brasil teve
até hoje 34 presidentes que chegaram ao poder de diversas formas: eleição
direta por voto popular ou indireta pelo Congresso Nacional, golpe de Estado ou
através da linha sucessória. Sete deles, junto com Júlio Prestes, que nem
chegou a assumir o cargo, foram de alguma maneira tirados do poder -- ameaça
que ronda a atual presidente, Dilma Rousseff, que enfrenta um processo de
impeachment na Câmara dos Deputados.
Desde o marechal Deodoro da Fonseca, derrubado pelas Forças
Armadas depois de fechar o Congresso, até Fernando Collor de Mello, que
renunciou em 1992 após ver seu impeachment aprovado pela Câmara, o UOL compila
os presidentes que não tiveram condições de cumprir seu mandato até o final. A
lista inclui Jânio Quadros, que renunciou em 1961 ao dizer que "forças
terríveis" o impediam de governar.
A reportagem contou com auxílio dos professores de História
Daily de Matos Oliveira, do Curso Objetivo, e Célio Tasinafo, da Oficina do
Estudante.
Deodoro da Fonseca (1891)
O marechal liderou o levante das Forças Armadas que derrubou
Dom Pedro 2º em 1889 e foi o primeiro presidente da República, mas seu governo
durou apenas dois anos. Segundo Daily Oliveira, Deodoro era um monarquista que
só se uniu ao movimento republicano em nome da unidade militar. Governou
provisoriamente até fevereiro de 1891, quando foi eleito indiretamente. Em
novembro, sem apoio dos parlamentares, decidiu fechar o Congresso. Outro
marechal, o vice-presidente Floriano Peixoto, contou com apoio da Marinha para
obrigar a saída de Deodoro, que acabou renunciando. Apesar da Constituição de
1891 pedir a convocação de novas eleições em caso de saída do presidente,
Floriano Peixoto, conhecido como "Marechal de Ferro", se manteve no
poder até 1894 e entregou o cargo para o civil Prudente de Morais, vencedor das
primeiras eleições presidenciais do Brasil.
Eleito em 1926, Washington Luís foi o último presidente da
República Velha, conhecida pelo domínio das oligarquias paulista e mineira no
poder. Washington Luís enfrentou a crise internacional de 1929, que afetou
diretamente a exportação brasileira de café, e resistência de militares de
ideiais nacionalistas. Ainda assim, elegeu seu sucessor, o então governador
paulista, Júlio Prestes, no pleito de 1930. Prestes venceu a eleição em março,
derrotando Getúlio Vargas, em um pleito marcado por denúncias de fraude e
rachas entre as oligarquias. Em julho, o assassinato do vice de Vargas, João
Pessoa, em um crime aparentemente não relacionado à disputa presidencial,
agravou as hostilidades. Em outubro, Vargas, com apoio dos militares, foi à
capital exigir a saída de Washington Luís, que deixou o Palácio do Catete
preso, rumo ao Forte de Copacabana. Sua queda ocorreu um mês antes de passar o
cargo para Júlio Prestes, que nem chegou a assumir. Ambos se exilaram no
exterior temporariamente após a Revolução de 1930. "Eles estavam isolados.
Não tinham apoio nem das oligarquias, nem da população e nem do Exército.
Qualquer esboço de reação foi abafado", diz Célio Tasinafo.
Getúlio Vargas (1945 e 1954)
O líder da revolução que acabou com a República Velha
comandou um governo provisório até 1934, quando foi eleito indiretamente para
um mandato que se encerraria após as eleições presidenciais de 1938. Um ano
antes, no entanto, Vargas estabeleceu o Estado Novo (acabando com as eleições
diretas) até 1945, ano do fim da Segunda Guerra Mundial. O governo ditatorial
de Vargas não condizia com o apoio do país aos Aliados no conflito que encerrou
os regimes de Hitler e Mussolini, e aos poucos o líder brasileiro, que já
enfrentava forte oposição, reestabeleceu a democracia, permitindo a volta dos
partidos políticos e convocando eleições para aquele ano. Mesmo assim, os
militares temiam um novo golpe e depuseram Getúlio que, sem ter os direitos
cassados, se manteve na política e foi eleito senador. Vargas voltou ao poder
pelo voto popular em 1951, mas com oposição de militares, empresários e de
políticos --o principal era Carlos Lacerda, da UDN. Em meio a denúncias de
corrupção envolvendo seu governo, Vargas enfrentou e superou um processo de
impeachment em junho de 1954. Em 5 de agosto, no entanto, a situação se agravou
após o Atentado da Rua Tonelero, que vitimou o major da FAB Rubens Vaz --o ato,
supostamente orquestrado pela segurança de Getúlio, visava Carlos Lacerda, que
ficou ferido. Acuado por políticos e militares, Vargas se recusou a renunciar.
Sem enxergar alternativas, p presidente deu um tiro no peito no Palácio do
Catete em 24 de agosto. Sua morte provocou comoção popular e reverteu a onda de
rejeição a Vargas por causa das polêmicas em seu segundo mandato, levando o
presidente ao status de herói nacional. Em 1954, novamente presidente, Vargas
se suicidou após sofrer forte pressão política da oposição.
Carlos Luz (1955)
O vice-presidente Café Filho assumiu o cargo após o suicídio
de Vargas, mas a tensão política persistiu. Nas eleições de 1955, venceu a
chapa formada por Juscelino Kubitschek (PSD) e João Goulart (PTB, herdeiro do
varguismo), por uma pequena vantagem sobre o candidato da UDN, Juarez Távora. A
UDN e a oposição tentou articular um golpe para evitar que Juscelino assumisse
o poder. Em novembro de 1955, 50 dias antes da posse de JK, Café Filho se
afastou por motivos de saúde. O presidente da Câmara dos Deputados, Carlos Luz,
herdou o cargo interinamente, mas foi deposto três dias depois pelo general
Henrique Lott, com apoio do Congresso, pela acusação de conspirar contra JK.
"Carlos Luz disse que o Juscelino não podia ser considerado legítimo
conseguindo só 35% dos votos", diz Daily Oliveira. Luz tentou reagir, mas
desistiu. Com o país em estado de sítio, Nereu Ramos, vice-presidente do
Senado, assumiu o cargo até a posse de JK. Também acusado de conspiração, Café
Filho foi impedido de retomar o poder. "Café Filho e Carlos Luz não
conseguiram base de sustentação política nem militar. E naquele ambiente, o
presidente precisava de apoio das Forças Armadas", diz Célio Tasinafo.
Jânio Quadros (1961)
De ascensão meteórica, Jânio Quadros chegou à Presidência
com apenas 13 anos de vida política. Jânio venceu as eleições de 1960 com apoio
da UDN e votação recorde, mas desde o início sofreu forte oposição no
Congresso. Segundo Daily Oliveira, a popularidade de Jânio, que prometia caçar
os corruptos, caiu no mesmo ritmo da alta dos preços no país. Ele ainda reatou
as relações com a União Soviética e homenageou Che Guevara, o que desagradou
militares, os Estados Unidos e a UDN, preocupados com a relação de Jânio com
países e líderes socialistas. Sem apoio do Congresso, ele renunciou em 25 de
agosto de 1961 dizendo que "forças terríveis" o obrigaram a tomar
essa decisão. Segundo Daily Oliveira, Jânio tentou uma manobra para que sua
renúncia não fosse oficializada pelo Congresso -- era sexta-feira, e os
deputados já se preparavam para deixar Brasília. Assim, Jânio planejava
conquistar apoio popular durante o fim de semana para retomar o poder na
segunda. "Só que o presidente do Congresso fechou o espaço aéreo de
Brasília e convocou os parlamentares para voltar. A renúncia foi lida e Jânio
foi obrigado a sair, sem comover a população como esperava", afirma
Oliveira.
João Goulart (1964)
Se Jânio Quadros já sofria rejeição pela relação com
governos socialistas, João Goulart, ex-ministro de Vargas ligado ao
sindicalismo, sofria uma oposição ainda maior, tanto civil quanto militar.
Goulart estava na China no dia da renúncia de Jânio e só voltou quando o
Congresso aprovou uma emenda institucional que instaurou o parlamentarismo. Em
janeiro de 1963, Jango convocou um plebiscito que decidiu pelo retorno do
presidencialismo, retomando seus poderes de presidente. Mesmo assim, Goulart
continuou sem apoio parlamentar e tentou mobilizar as classes populares para
conseguir governar. Em março de 1964, com o país polarizado, Jango discursou no
Rio de Janeiro e falou sobre a intenção de promover a reforma agrária.
Militares, empresariado, Igreja Católica, imprensa e setores conservadores se
uniram, sob o temor das reformas de base e de um regime socialista, e Goulart
foi deposto pelo Exército entre 31 de março e 2 de abril, quando partiu para o
Uruguai. Ele foi o último presidente civil até José Sarney, em 1985.
Fernando Collor (1992)
O primeiro presidente eleito em quase 30 anos durou 33 meses
no poder. O país enfrentava um momento de grave crise econômica, com
hiperinflação, e as primeiras medidas de Collor para conter a recessão foram
congelar preços e salários e confiscar os depósitos bancários por 18 meses.
Eleito por uma pequena vantagem em relação a Luiz Inácio Lula da Silva, seu
adversário no segundo turno, Collor logo perdeu apoio popular e também no
Congresso. Denúncias de um esquema de corrupção comandado por Paulo César
Farias, seu tesoureiro na campanha presidencial, abalaram o governo, que sofreu
um processo de impeachment. Em meio a grandes manifestações pela saída de
Collor, o presidente viu o impeachment aprovado pela Câmara dos Deputados em 29
de setembro de 1992 e foi afastado da presidência, dando lugar ao vice Itamar
Franco. Collor renunciou em 29 de dezembro, um dia antes de o Senado votar a
favor do impeachment e da perda de mandato.
Nenhum comentário:
Postar um comentário