Editorial O Globo
A presentada à sociedade como medida moralizadora da
política, a proibição do financiamento de campanhas por empresas, aceita pelo
Supremo, por maioria de votos, numa ação movida pela OAB, terá nas eleições
municipais de outubro o primeiro grande teste. Cujo resultado será negativo.
O desfecho ocorreu no crescendo de uma campanha, na qual o
PT e aliados estiveram à frente, a favor do financiamento público total da
política. Seria um passo contra os interesses do contribuinte — levado a arcar
também com o aumento desses gastos —, para quem era acenada a ilusão de que a
estatização das finanças da política conteria de maneira eficaz a corrupção.
Usavam este argumento enquanto se beneficiavam do assalto
lulopetista a empresas públicas, a Petrobras em primeiro lugar. No mínimo, uma
contradição. Ou hipocrisia. No Planalto, a presidente Dilma tratou de sancionar
um grande aumento do fundo partidário — de R$ 290 milhões para R$ 870 milhões.
Era um passo rumo ao financiamento público total, algo que
interessava ao PT pelo tamanho da sua bancada e por ideologia mesmo. Quando o
melhor era aperfeiçoar as regras das doações de empresas, torná-las mais
transparentes e a legislação, mais eficaz e dura.
Não veio a estatização, mas o STF, ao alijar as empresas das
doações, aumentou a importância do fundo partidário para as legendas. Sem as
pessoas jurídicas no circuito, restam o dinheiro do fundo e o conhecido e
cultivado caixa dois. A Lava-Jato demonstra como não falta tecnologia para
transferir dinheiro sem deixar rastros.
Até a Justiça Eleitoral foi usada para lavar propinas
geradas na Petrobras. O tiro n’água do veredicto do Supremo não estimula apenas
o dinheiro “por fora”, quase um esporte nacional do mundo da política. Mas
também torna mais desigual a concorrência entre candidatos.
Aqueles com patrimônio, ricos, saem na frente. Também os com
acesso a igrejas, cuja movimentação financeira nunca chama a atenção das
autoridades. Há ainda a atração crescente do submundo pela representação
política, caso das milícias. E se o lobby da jogatina tiver sucesso no
Congresso, talvez em 2018 roletas entrem nesta ciranda do caixa dois.
É comum dizer-se que todo cuidado será pouco, que o MP e a
Justiça precisarão estar atentos. Mas falta sustentação legal para uma
repressão eficiente. Ganha, então, relevância ainda maior o conjunto de dez
propostas de combate à corrup- ção alinhadas pelo Ministério Público e que
chegaram ao Congresso sustentadas em mais de dois milhões de assinaturas.
Entre as propostas, a criminalização do caixa dois,
defendida pelo juiz Sérgio Moro na comissão especial que analisa o pacote. Os
dois maiores escândalos da era lulopetista — mensalão e petrolão; este,
destaque na história do país — justificam a conversão em leis das sugestões
encaminhadas ao Congresso, com apoio popular, no modelo do projeto da Lei da
Ficha Limpa.
Agora, com a volta das pessoas jurídicas para os
subterrâneos da política, devido ao STF, mais ainda o poder público precisa
estar em condições institucionais para punir os desvios e, assim, ajudar a
criar uma cultura de seriedade no financiamento eleitoral. O que é verdade
mesmo se as empresas continuassem a poder bancar candidatos e partidos.
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