O ex-ministro da Casa Civil e da Fazenda Antonio Palocci
(PT) foi preso temporariamente na manhã desta segunda-feira (26) na 35ª fase da
Operação Lava Jato, em São Paulo.
Ele decolou com policiais federais no começo desta tarde, no
aeroporto de Congonhas, rumo a Curitiba.
A nova fase da operação, intitulada Omertà, investiga
indícios de uma relação criminosa entre o ex-ministro e a empreiteira
Odebrecht.
O juiz federal Sergio Moro decretou o bloqueio de bens de
Palocci e de outros acusados até o valor de R$ 128 milhões. Segundo o
magistrado, esse é o montante indicado em planilha da Odebrecht que
supostamente registra os valores de propina que estavam sob a gestão do
ex-ministro –desse total, Palocci teria recebido R$ 6 milhões.
A medida atinge contas e investimentos bancários dos
investigados.
No despacho de prisão de Palocci, assinado no último dia 12,
o juiz federal Sergio Moro afirma que há provas de que Palocci coordenou o
repasse de propinas da Odebrecht para o PT.
"Surgiram provas, em cognição sumária, de que ele
[Palocci] recebia e era responsável pela coordenação dos recebimentos por parte
de seu grupo político de pagamentos subreptícios pelo Grupo Odebrecht",
escreveu o juiz na decisão.
Segundo a PF, há indícios de que o ex-ministro tenha atuado
diretamente para obter vantagens econômicas para a empresa em contratos com o
poder público e se beneficiado de valores ilícitos. Entre as provas obtidas
pela força-tarefa estão e-mails que mostram indícios da atuação de Palocci nos
crimes sob investigação. No escopo da delação premiada que a Odebrecht negocia
com a Procuradoria, executivos da empreiteira detalham a relação de Palocci com
o grupo.
Entre as negociações envolvendo Palocci, apuradas pela PF,
estão as tentativas de aprovação do projeto de lei de conversão da MP 460/2009
que resultou em benefícios fiscais à empreiteira baiana, aumento da linha de
crédito no BNDES para um país africano com a qual a empresa tinha relações
comerciais, além de interferência no procedimento licitatório da Petrobras para
aquisição de 21 navios sonda para exploração do pré-sal.
Nesta manhã, agentes federais estiveram no escritório de
Palocci e na casa do ex-ministro, nos Jardins, mas o local da prisão do petista
não foi divulgado pela PF. Cerca de 180 policiais federais e auditores fiscais
cumprem 27 mandados de busca e apreensão, três de prisão temporária e 15
mandados de condução coercitiva em São Paulo Rio de Janeiro, Espírito Santo,
Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal.
Como a Folha já informou, Palocci era conhecido internamente
na Odebrecht como "italiano" e esse apelido figura em planilhas de
pagamentos apreendidas pela PF em fases anteriores.
Branislav Kontic, ex-assessor de Palocci na Casa Civil, e
Juscelino Dourado, seu ex-chefe de gabinete na Fazenda, também tiveram mandados
de prisão expedidos. Kontic, conhecido como Brani, continuou trabalhando com o
petista mesmo depois de Palocci ter deixado a pasta.
Sociólogo de formação, Brani trabalhou na Projeto, consultoria
de Palocci. Duas empresas ligadas ao nome dele estão sob a mira dos
investigadores: a Anagrama Consultoria e Assessoria e a Epoke Consultoria em
Mídia Ltda.
Já Dourado pediu demissão do cargo depois de admitir na CPI
dos Bingos que marcou reuniões do então ministro com empresários. Era um dos
frequentadores da chamada "casa do lobby", localizada no lago sul, em
Brasília.
Outro alvo de condução coercitiva desta segunda foi o
empresário Milton Lira, apontado como operador do PMDB. Ele prestou depoimento
da superindetndência da PF de Brasília onde foi questionado sua relação com a
Odebrecht.
Segundo porta-vozes de Lira, ele afirmou que não tem relação
com a empreiteira baiana.
FUNDAMENTOS
Segundo Moro, o "risco à aplicação da lei penal" e
o "risco à ordem pública" justificam as prisões da 35ª fase da Lava
Jato.
O juiz afirma que as investigações não rastrearam ainda toda
a movimentação dos valores ilícitos repassados sob coordenação da Palocci e é
possível que os pagamentos tenham, em parte, ocorrido em contas secretas no
exterior ainda não identificadas ou bloqueadas.
"Enquanto não houver tal identificação, há um risco de
dissipação do produto do crime, o que inviabilizará a sua recuperação. Enquanto
não afastado o risco de dissipação do produto do crime, presente igualmente um
risco maior de fuga ao exterior, uma vez que os investigados poderiam se valer
de recursos ilícitos ali mantidos para facilitar fuga e refúgio no
exterior", fundamentou o magistrado.
Quanto ao risco à ordem pública, Moro escreveu que "o
contexto não é de envolvimento episódico em crimes de corrupção e de lavagem de
dinheiro, mas do recebimento sistemático de propinas, remontando a relação
entre o Grupo Odebrecht e Antônio Palocci Filho a pelo menos 2006 e
estendendo-se se por anos".
O magistrado sustenta que a planilha de repasses a Palocci
apreendida na Lava Jato indica que ainda há saldo de propinas a ser pago e o
"fato de ele não mais exercer cargo ou mandato público não impediu que
continuasse como recebedor ou intermediador de pagamentos, em 2012 e 2013 pelo
menos, para o seu grupo político".
LIMITE DO PRAZO
Deflagrada seis dias antes das eleições, a nova fase da Lava
Jato aproveita o último dia previsto em lei para a prisão de um eleitor (com
exceção de prisões em flagrante, por condenação criminal ou por desrespeito a
salvo-conduto).
Em entrevista à imprensa, a Polícia Federal, no entanto,
negou que a deflagração da operação estivesse relacionada à proximidade das
eleições. "A ação da polícia é pautada nos fatos e no tempo da
investigação; não tem relação nenhuma com eleições", disse o delegado Igor
Romário de Paula.
As prisões feitas nesta segunda são temporárias e se encerram
em cinco dias. Para os investigadores, porém, é possível prorrogá-las por mais
cinco dias, se necessário, ou convertê-las em prisões preventivas (válidas por
tempo indeterminado).
"Essa previsão da lei existe para garantir o direito ao
voto de pessoas que estejam livres. Mas não se aplica a pessoas presas",
disse o delegado Filipe Pace. "Se houver elementos para pedir a conversão
da prisão em preventiva, vamos pedir."
CARREIRA
Antonio Palocci foi eleito vereador de Ribeirão Preto em
1988, mandato incompleto por ter sido eleito deputado estadual. Ficou apenas
dois anos no cargo, pois foi eleito prefeito da cidade em 1992.
Em 1998, mais uma vez foi eleito deputado federal, interrompendo
o mandato para ocupar novamente o cargo de prefeito de Ribeirão. Como deputado
federal, foi o relator do projeto de lei que mudou o regime de exploração do
petróleo no pré-sal, no fim dos anos 1990.
Chefiou a pasta da Fazenda nos primeiros anos do governo
Lula, entre janeiro de 2003 e março de 2006, quando foi substituído por Guido
Mantega.
Retornou ao ministério no governo Dilma, em 2011, desta vez
à frente da Casa Civil, permanecendo apenas seis meses no cargo. Em 2010, ele
havia sido coordenador de sua campanha à presidência.
ANTECIPADA
No último domingo (25), o ministro da Justiça Alexandre de
Moraes já havia declarado, segundo o jornal "O Estado de S. Paulo",
que novas investigações da Lava Jato seriam realizadas nesta semana. A conversa
ocorreu com integrantes do MBL (Movimento Brasil Livre) em um ato de campanha
do deputado federal Duarte Nogueira, em Ribeirão Preto.
Horas depois, sua assessoria de imprensa informou que a
declaração era apenas uma "força de expressão", usada pelo ministro com
o intuito de garantir a continuidade das investigações.
OPERAÇÃO
"O nome Omertà, dado à investigação policial, é um
termo usado pela máfia italiana para designar a "lei do silêncio" e a
obrigação de não se delatar companheiros diante de autoridades ou rivais –pacto
que, quando quebrado, é punido com morte.
Para a PF, é uma referência "à origem italiana do
codinome que a construtora usava para fazer referência ao principal investigado
[Palocci] da fase, bem como ao voto de silêncio que imperava no Grupo Odebrecht
que, ao ser quebrado, permitiu o aprofundamento das investigações".
Omertà também é o nome de um livro de Mario Puzzo, o mesmo
autor de "O Poderoso Chefão".
"Nos casos dos investigados para os quais foram
expedidos mandados de condução coercitiva, estes estão sendo levados às sedes
da Polícia Federal nas respectivas cidades onde foram localizados a fim de
prestarem os esclarecimentos necessários. Os investigados serão liberados após
serem ouvidos no interesse da apuração em curso."
A Polícia Federal, o Ministério Público Federal e a Receita
Federal farão uma coletiva de imprensa no auditório da PF, em Curitiba, às 10h.
OUTRO LADO
O advogado de Palocci, José Roberto Batochio, disse que o
ex-ministro nega todas as acusações.
O criminalista disse estranhar o fato dos presos recentes
estarem associados a gestões petistas. "Só os do PT são presos. É um fato
difícil de explicar", afirmou, fazendo referência a outros partidos
investigados na Operação Lava Jato.
Batochio disse ter se encontrado com o ex-ministro após a
prisão para verificar a agenda que irão ter daqui para frente e afirmou ser
muito cedo para definir se entrará com pedido de habeas corpus. "É
prematuro".
O criminalista conversou com jornalistas em frente à
Superintendência da Polícia Federal em São Paulo. Sobre a coletiva de imprensa
da PF que tratou da prisão de Palocci, afirmou: "Absolutamente vazia, só
presunções, só deduções, só imaginação, nada de provas."
Em nota, o BNDES disse que "está na fase final de revisão
das operações já realizadas" e que está colaborando com o Tribunal de
Contas da União.
A Folha não conseguiu contato com a defesa de Branislav
Kontic. Procurada, a defesa de Juscelino Dourado ainda não se manifestou.
Nenhum comentário:
Postar um comentário