Editorial O Globo
A evolução do quadro político ganha velocidade vertiginosa,
com o afastamento de Renan Calheiros (PMDBAL) da presidência do Senado, por
decisão liminar do ministro do Supremo Marco Aurélio Mello, a pedido do partido
Rede.
Em momentos normais, sem crises na política e na economia,
já seria algo polêmico. Afinal, o pedido do partido se baseia em decisão já
tomada pela Corte, no início de novembro, porém não promulgada, de que réu em
ação penal não pode ser parte da linha de substituição do presidente da República.
Mas Marco Aurélio se assenta em base legal para ter aceitado
o pleito da Rede. A liminar, porém, é polêmica e ajuda a agravar uma das
facetas da crise, o conflito entre as instituições. Por isso, a Corte precisa,
com extrema urgência, colocar em votação no Pleno o mérito deste caso.
O principal personagem nessa história é o, até ontem no
início da tarde, presidente do Senado, com vários processos na Corte, um deles
àquela altura de novembro prestes a ser julgado. Isso aconteceu e Renan virou
réu.
Na parte final daquele julgamento, quando já havia votos
suficientes para aprovar o alijamento de réus da linha sucessória, o ministro
Dias Toffoli pediu vista do processo, que se encontrava no gabinete de Marco
Aurélio.
Ao se criticar a demora de Toffoli em devolver o processo
para a efetivação do veredicto, o ministro alegou não o ter recebido, quando
essa tramitação na Corte ocorre por via digital. Mello chegou a emitir nota
sobre o alegado atraso.
A este fato controvertido se somou o de ontem, com a aceitação
do pedido de liminar por Marco Aurélio, com base na decisão de um julgamento
suspenso pelo pedido de vista. O momento é tenso, multidões voltam às ruas, mas
as instituições precisam continuar serenas, cumprindo leis, ritos e normas.
Tampouco é aceitável que rusgas entre ministros nas altas
Cortes injetem mais tensão na atmosfera. Manter o calendário de votações no
Congresso é essencial. Será lamentável se a posse de Jorge Viana (PT-AC),
sucessor de Renan, de partido da oposição, vier a atrasar a estratégica
aprovação da PEC do teto, semana que vem.
Ou de outros projetos cruciais para a estabilização da
economia e da própria política. Caso da reforma da Previdência, em fase de
desembarque no Congresso. O domingo nas ruas convertera Renan em alvo prioritário,
no lugar de Eduardo Cunha, por uma dessas coincidências irônicas também
afastado da presidência da Câmara por decisão do STF.
A conjugação dos fatos não tem ajudado os políticos
interessados em conter a Lava-Jato. À medida que a tramitação dos acordos de
delação premiada e de leniência, no âmbito da Odebrecht, avança, os esquemas
subterrâneos — alguns nem tanto —, montados para proteger parlamentares e
políticos em geral citados em depoimentos, têm enfrentado percalços.
O mais recente é o afastamento de Renan, algo que será ainda
decidido pelo plenário da Corte. Mas é certo que, politicamente atingido pela
liminar, será muito difícil que Renan consiga influenciar na votação que estava
prevista para hoje do projeto contra “abusos de autoridade”, de autoria do
político, tão criticado pela Justiça e o MP, entre outros organismos públicos.
E também nas ruas.
Mas também é importante agora o Supremo voltar a dar
previsibilidade à sua atuação.
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