quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

DESENCONTROS NO SUPREMO NÃO PODEM AMEAÇAR REFORMAS

Editorial O Globo
A evolução do quadro político ganha velocidade vertiginosa, com o afastamento de Renan Calheiros (PMDBAL) da presidência do Senado, por decisão liminar do ministro do Supremo Marco Aurélio Mello, a pedido do partido Rede.
Em momentos normais, sem crises na política e na economia, já seria algo polêmico. Afinal, o pedido do partido se baseia em decisão já tomada pela Corte, no início de novembro, porém não promulgada, de que réu em ação penal não pode ser parte da linha de substituição do presidente da República.
Mas Marco Aurélio se assenta em base legal para ter aceitado o pleito da Rede. A liminar, porém, é polêmica e ajuda a agravar uma das facetas da crise, o conflito entre as instituições. Por isso, a Corte precisa, com extrema urgência, colocar em votação no Pleno o mérito deste caso.
O principal personagem nessa história é o, até ontem no início da tarde, presidente do Senado, com vários processos na Corte, um deles àquela altura de novembro prestes a ser julgado. Isso aconteceu e Renan virou réu.
Na parte final daquele julgamento, quando já havia votos suficientes para aprovar o alijamento de réus da linha sucessória, o ministro Dias Toffoli pediu vista do processo, que se encontrava no gabinete de Marco Aurélio.
Ao se criticar a demora de Toffoli em devolver o processo para a efetivação do veredicto, o ministro alegou não o ter recebido, quando essa tramitação na Corte ocorre por via digital. Mello chegou a emitir nota sobre o alegado atraso.
A este fato controvertido se somou o de ontem, com a aceitação do pedido de liminar por Marco Aurélio, com base na decisão de um julgamento suspenso pelo pedido de vista. O momento é tenso, multidões voltam às ruas, mas as instituições precisam continuar serenas, cumprindo leis, ritos e normas.
Tampouco é aceitável que rusgas entre ministros nas altas Cortes injetem mais tensão na atmosfera. Manter o calendário de votações no Congresso é essencial. Será lamentável se a posse de Jorge Viana (PT-AC), sucessor de Renan, de partido da oposição, vier a atrasar a estratégica aprovação da PEC do teto, semana que vem.
Ou de outros projetos cruciais para a estabilização da economia e da própria política. Caso da reforma da Previdência, em fase de desembarque no Congresso. O domingo nas ruas convertera Renan em alvo prioritário, no lugar de Eduardo Cunha, por uma dessas coincidências irônicas também afastado da presidência da Câmara por decisão do STF.
A conjugação dos fatos não tem ajudado os políticos interessados em conter a Lava-Jato. À medida que a tramitação dos acordos de delação premiada e de leniência, no âmbito da Odebrecht, avança, os esquemas subterrâneos — alguns nem tanto —, montados para proteger parlamentares e políticos em geral citados em depoimentos, têm enfrentado percalços.
O mais recente é o afastamento de Renan, algo que será ainda decidido pelo plenário da Corte. Mas é certo que, politicamente atingido pela liminar, será muito difícil que Renan consiga influenciar na votação que estava prevista para hoje do projeto contra “abusos de autoridade”, de autoria do político, tão criticado pela Justiça e o MP, entre outros organismos públicos. E também nas ruas.
Mas também é importante agora o Supremo voltar a dar previsibilidade à sua atuação.
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