Christianne Maroun, O Globo
Ao que tudo indica, o novo presidente dos Estados Unidos,
Donald Trump, vai mesmo cumprir sua promessa de campanha de se lixar para a
influência do homem nas mudanças climáticas, especificamente quando o tema é
indústria fóssil.
Myron Ebell, seu indicado para a transição na agência de
proteção ambiental do país (EPA) é um cético sobre nossa influência no clima do
planeta e lendário crítico das tratativas mundiais para mitigar o impacto dos
processos da nossa sociedade nessa questão ambiental global.
Mas o quanto isso importa para nós aqui no Brasil — e para o
resto do mundo? Para responder a esta pergunta, precisamos analisar o impacto
da escolha de Trump sob duas vertentes.
A primeira diz respeito efetivamente às emissões de gases de
efeito estufa dos EUA. O país é o segundo maior emissor mundial desses gases,
muito devido à economia de consumo que é a base estrutural de crescimento do
país. Valorizar a energia fóssil é uma escolha temerária que certamente irá
contribuir para o aumento das emissões dos EUA. Considerando que uma molécula
de CO2 (o principal gás de efeito estufa em termos de volume) fica de 100 a 200
anos na atmosfera da Terra e se mistura completamente e de forma homogênea, não
faz diferença se ela é emitida nos EUA, na África do Sul ou na China. Vai
interferir no clima do mundo todo, inclusive no nosso aqui no Brasil.
A segunda vertente, e talvez igualmente importante, é que a
EPA sempre foi um exemplo para o mundo. Grande parte de metodologias, estudos e
ações efetivamente implementadas nos EUA e no resto do planeta é fruto dos
investimentos em estudos científicos, criatividade e pró-atividade da agência
norte-americana. Colocar a EPA na geladeira fóssil poderá até ilusoriamente aquecer
a economia dos EUA por um tempo, mas o principal aquecimento será o do clima da
Terra. E a mudança do clima afeta a economia, e o mais importante: afeta
diretamente a vida das pessoas, não só dos EUA como em todo o planeta.
Programas inovadores criados pela EPA, como o Energy Star
(1992), que alia a redução de custos à eficiência energética, reduzindo
emissões de gases de efeito estufa e economizando bilhões de dólares para os
americanos, foram implementados em diversos países do mundo, incluindo o Brasil.
Em 2013 foi lançado o Plano de Mudanças Climáticas dos EUA,
uma estratégia com foco na preparação para os efeitos dessas mudanças, redução
da poluição de carbono nos EUA e fornecimento de assistência técnica
internacional. Um programa recente que poderia nos beneficiar e que pode não
ser levado adiante sob a nova direção.
Diante dos fatos atuais, só nos resta torcer para que a
sociedade americana se mobilize para resguardar o que vem sendo feito em prol
da mitigação das mudanças climáticas.
E torcer também para que a EPA seja uma instituição sólida o
suficiente para sobreviver ao governo Trump, sem retrocessos estruturais e com
o menor impacto possível nas ações já implementadas com tanto esforço e
profissionalismo, ao longo de muitas décadas.
Christianne Maroun é professora do curso de Engenharia
Ambiental da PUC-Rio
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