sábado, 28 de janeiro de 2017

MAIS UMA VIAGEM

Da ÉPOCA
Era abril de 2014 quando um homem chegou ao hangar de uma empresa de táxi-aéreo em Brasília. Carregava uma mochila nas costas e, sem delongas, mostrou ao funcionário um bolo de dinheiro vivo. Sacou a seguir uma máquina para contar as cédulas. Somavam R$ 105 mil. O dinheiro se destinava a pagar pelo uso de um jatinho, dias antes, para uma viagem a Punta del Este, Uruguai. Quem pagou foi Pedro Medeiros, que fazia o papel de homem da mala para seu primo influente, o empresário Benedito de Oliveira Neto, o Bené, delator na Operação Acrônimo (da Polícia Federal, para investigar lavagem de dinheiro para campanhas eleitorais). O principal convidado do voo era Fernando Pimentel, então pré-candidato ao governo de Minas Gerais e amigo de Bené.
A viagem a Punta del Este é um símbolo da próspera relação entre o petista, Bené e o grupo imobiliário JHSF, de São Paulo. De um lado, Pimentel ganhou a viagem, doações eleitorais e R$ 1 milhão em caixa dois, segundo admitiu à Polícia Federal um executivo da JHSF e revelou ÉPOCA em seu site na quinta-feira, dia 19. Em troca, a empresa tinha em Pimentel um lobista dentro do governo Dilma – ele era ministro do Desenvolvimento e tinha poder sobre o BNDES.
As revelações foram feitas por Humberto Polati, então diretor da JHSF. Após ÉPOCA divulgar o conteúdo de seu depoimento, a JHSF, que tem ações na Bolsa, comunicou à Comissão de Valores Mobiliários (órgão regulador do mercado de ações) sobre um acordo feito pelo herdeiro do grupo, José Auriemo Neto, com o Ministério Público Federal. No acordo, Auriemo Neto admitiu o pagamento de caixa dois a Pimentel e eximiu a JHSF de responsabilidade. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) homologou o acordo. “Assumi a exclusiva responsabilidade por contribuição ilegal de campanha, em que nem a JHSF Participações S.A., nem suas controladas, tiveram envolvimento, e que consubstanciou ilícito de menor potencial ofensivo, sem qualquer conotação de corrupção. Nos termos do Acordo, farei doação de um milhão de reais ao Hospital do Câncer de Barretos e, uma vez cumpridas as demais condições legais, deverá ser extinta a punibilidade”, escreveu Auriemo.
Em seu depoimento, Polati contou ter ouvido de Bené que “era chegada a hora de devolver o apoio dado por Fernando Pimentel no projeto do aeroporto Catarina”. O término da obra em São Roque, São Paulo, interessava à empresa.
Segundo o depoimento, o primeiro passo foi a viagem a Punta del Este. Pimentel e seus convidados ficaram num hotel da JHSF, o luxuoso Fasano Las Piedras. Lá, alugaram dois Mini Coopers e nada pagaram pela estada, em março de 2014. O tour por Punta del Este era a comemoração dos 63 anos de Pimentel, nascido em 31 de março. De acordo com o registro do depoimento, “Benedito pediu ao declarante que os valores referentes a tal hospedagem deveriam ser tratados diretamente com Benedito posteriormente. O declarante afirmou que nada foi cobrado de Benedito e dos demais hóspedes, na ocasião do checkout, em relação a diárias, serviços utilizados e aluguel de carros”.
O advogado de Pimentel, Eugenio Pacelli, admite que o governador não pagou pela viagem. “Tudo foi coordenado por Benedito, que se responsabilizou pelos pagamentos. E depois não pagou. Ele reservou em seu nome”, afirma.
Polati relata ainda encontros pessoais com Pimentel na casa do petista, em Brasília, em um jantar num restaurante português, também na capital, e uma reunião na sede da JHSF. Depois da viagem, Polati disse que Auriemo Neto acertou R$ 2,6 milhões em “contribuição” para Pimentel, em doação eleitoral. Falou, ainda, em R$ 1 milhão em caixa dois, pagos diretamente ao instituto de pesquisa Vox Populi.
O depoimento de Polati resulta da sexta fase da Operação Acrônimo, que mirou na JHSF e no Vox Populi. A origem da investigação, como ÉPOCA revelou, é a delação de Bené. Segundo ele, Pimentel fez lobby no governo Dilma para atender a demandas da JHSF relacionadas ao aeroporto Catarina. Apesar das revelações, Pimentel só será levado a julgamento após o Supremo Tribunal Federal decidir se ele pode ser alvo de uma decisão do STJ. Antes, o Supremo deverá definir se a Assembleia Legislativa de Minas Gerais tem de autorizar o julgamento na Justiça. Até lá, o governador não pode ser julgado.
Procurada, a JHSF disse que “não comenta investigações em andamento que estão sob segredo de Justiça”. “A empresa apoia e colabora com as investigações.” O Vox Populi informou que não comentaria o caso. Eugenio Pacelli, advogado de Fernando Pimentel, disse que o governador não cuidava das doações de campanha. “O então ministro nunca fez solicitação alguma em seu benefício ou de sua campanha. Apenas Benedito pode responder por atos ilegais e realizados à margem da lei e sem o conhecimento do então candidato”, afirmou.
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