Da ÉPOCA
Era abril de 2014 quando um homem chegou ao hangar de uma
empresa de táxi-aéreo em Brasília. Carregava uma mochila nas costas e, sem
delongas, mostrou ao funcionário um bolo de dinheiro vivo. Sacou a seguir uma
máquina para contar as cédulas. Somavam R$ 105 mil. O dinheiro se destinava a
pagar pelo uso de um jatinho, dias antes, para uma viagem a Punta del Este,
Uruguai. Quem pagou foi Pedro Medeiros, que fazia o papel de homem da mala para
seu primo influente, o empresário Benedito de Oliveira Neto, o Bené, delator na
Operação Acrônimo (da Polícia Federal, para investigar lavagem de dinheiro para
campanhas eleitorais). O principal convidado do voo era Fernando Pimentel,
então pré-candidato ao governo de Minas Gerais e amigo de Bené.
A viagem a Punta del Este é um símbolo da próspera relação
entre o petista, Bené e o grupo imobiliário JHSF, de São Paulo. De um lado,
Pimentel ganhou a viagem, doações eleitorais e R$ 1 milhão em caixa dois,
segundo admitiu à Polícia Federal um executivo da JHSF e revelou ÉPOCA em seu
site na quinta-feira, dia 19. Em troca, a empresa tinha em Pimentel um lobista
dentro do governo Dilma – ele era ministro do Desenvolvimento e tinha poder
sobre o BNDES.
As revelações foram feitas por Humberto Polati, então
diretor da JHSF. Após ÉPOCA divulgar o conteúdo de seu depoimento, a JHSF, que
tem ações na Bolsa, comunicou à Comissão de Valores Mobiliários (órgão
regulador do mercado de ações) sobre um acordo feito pelo herdeiro do grupo,
José Auriemo Neto, com o Ministério Público Federal. No acordo, Auriemo Neto
admitiu o pagamento de caixa dois a Pimentel e eximiu a JHSF de
responsabilidade. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) homologou o acordo.
“Assumi a exclusiva responsabilidade por contribuição ilegal de campanha, em
que nem a JHSF Participações S.A., nem suas controladas, tiveram envolvimento,
e que consubstanciou ilícito de menor potencial ofensivo, sem qualquer
conotação de corrupção. Nos termos do Acordo, farei doação de um milhão de
reais ao Hospital do Câncer de Barretos e, uma vez cumpridas as demais
condições legais, deverá ser extinta a punibilidade”, escreveu Auriemo.
Em seu depoimento, Polati contou ter ouvido de Bené que “era
chegada a hora de devolver o apoio dado por Fernando Pimentel no projeto do
aeroporto Catarina”. O término da obra em São Roque, São Paulo, interessava à
empresa.
Segundo o depoimento, o primeiro passo foi a viagem a Punta
del Este. Pimentel e seus convidados ficaram num hotel da JHSF, o luxuoso
Fasano Las Piedras. Lá, alugaram dois Mini Coopers e nada pagaram pela estada,
em março de 2014. O tour por Punta del Este era a comemoração dos 63 anos de
Pimentel, nascido em 31 de março. De acordo com o registro do depoimento,
“Benedito pediu ao declarante que os valores referentes a tal hospedagem
deveriam ser tratados diretamente com Benedito posteriormente. O declarante
afirmou que nada foi cobrado de Benedito e dos demais hóspedes, na ocasião do
checkout, em relação a diárias, serviços utilizados e aluguel de carros”.
O advogado de Pimentel, Eugenio Pacelli, admite que o
governador não pagou pela viagem. “Tudo foi coordenado por Benedito, que se
responsabilizou pelos pagamentos. E depois não pagou. Ele reservou em seu
nome”, afirma.
Polati relata ainda encontros pessoais com Pimentel na casa
do petista, em Brasília, em um jantar num restaurante português, também na
capital, e uma reunião na sede da JHSF. Depois da viagem, Polati disse que
Auriemo Neto acertou R$ 2,6 milhões em “contribuição” para Pimentel, em doação
eleitoral. Falou, ainda, em R$ 1 milhão em caixa dois, pagos diretamente ao
instituto de pesquisa Vox Populi.
O depoimento de Polati resulta da sexta fase da Operação
Acrônimo, que mirou na JHSF e no Vox Populi. A origem da investigação, como
ÉPOCA revelou, é a delação de Bené. Segundo ele, Pimentel fez lobby no governo
Dilma para atender a demandas da JHSF relacionadas ao aeroporto Catarina.
Apesar das revelações, Pimentel só será levado a julgamento após o Supremo
Tribunal Federal decidir se ele pode ser alvo de uma decisão do STJ. Antes, o
Supremo deverá definir se a Assembleia Legislativa de Minas Gerais tem de
autorizar o julgamento na Justiça. Até lá, o governador não pode ser julgado.
Procurada, a JHSF disse que “não comenta investigações em
andamento que estão sob segredo de Justiça”. “A empresa apoia e colabora com as
investigações.” O Vox Populi informou que não comentaria o caso. Eugenio
Pacelli, advogado de Fernando Pimentel, disse que o governador não cuidava das
doações de campanha. “O então ministro nunca fez solicitação alguma em seu
benefício ou de sua campanha. Apenas Benedito pode responder por atos ilegais e
realizados à margem da lei e sem o conhecimento do então candidato”, afirmou.
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