Do UOL
A ex-primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva, 66, teve
morte confirmada na noite desta sexta-feira (03). Após realizarem exames
protocolares pela manhã, os médicos submeteram a mulher do ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva a uma bateria derradeira que comprovou a morte, conforme
boletim médico divulgado e assinado pelos médicos Antonio Antonietto e Miguel
Srougi.
"O óbito da Sra. Marisa Letícia Lula da Silva foi
constatado às 18h57 desta sexta-feira (03/02)", diz o breve texto
divulgado pelo hospital.
No início da noite, o padre Julio Lancelotti reuniu alguns
amigos e familiares e deu a "unção dos enfermos" para dona Marisa.
Na quinta-feira, um doppler transcraniano já havia mostrado
que dona Marisa não tinha mais fluxo cerebral. A partir de então, a família
Lula da Silva autorizou o início dos procedimentos para a doação de órgãos. Os
exames finais, porém, eram necessários para seguir o protocolo internacional.
Às 15h30 de ontem, equipes da OPO (Organização de Procura de
Órgãos) e do Sírio Libanês já tinham avaliado quais órgãos estariam em
condições de serem transplantados. Na noite desta sexta, a Secretaria Estadual
de Saúde confirmou que serão doados rins, fígado e as córneas. O procedimento
de extração deve ter início à meia-noite. Depois, os órgãos serão encaminhados
aos hospitais onde estão os receptores, não divulgados.
O corpo da ex-primeira-dama será velado no Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo, onde ela e Lula se conheceram. O funeral
será aberto ao público e realizado entre as 9h e as 15h deste sábado (4). Em
seguida, o corpo será cremado no Jardim da Colina, também na cidade do ABC paulista,
em cerimônia privada.
Marisa Letícia foi internada em estado grave no hospital
Sírio-Libanês no dia 24 de janeiro, após sofrer um AVC (Acidente Vascular
Cerebral) hemorrágico. Ela chegou a apresentar uma ligeira melhora na
terça-feira (31), e a sedação começou a ser reduzida. Como ela não reagiu bem,
voltou a ser sedada, mas piorou na quarta-feira.
O ex-presidente Lula ficou ao lado da mulher durante quase
todo o período de internação, deixando o hospital apenas por algumas horas
diárias. Segundo relatos de políticos e amigos que o visitaram, o petista tem
oscilado momentos de profunda tristeza e de serenidade e passou frequentemente
pela UTI onde a mulher estava.
Entre os políticos que estiveram no Sírio Libanês para
prestar condolências à família, os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso
(PSDB), Dilma Rousseff (PT) e José Sarney (PMDB), além do atual presidente
Michel Temer (PMDB). Lula ainda recebeu visitas de deputados, vereadores,
senadores, governadores, artistas e outros diversos amigos da família.
Militantes petistas também acompanharam o período de internação e fizeram
novenas em frente ao hospital pela vida de dona Marisa.
Origem humilde
Filha de agricultores de ascendência italiana, Marisa nasceu
em uma casa de pau-a-pique, no bairro dos Casa, sobrenome de seu avô, que tinha
um sítio no interior de São Bernardo do Campo, no ABC paulista.
Ainda criança, mudou com a família para o centro da cidade e
aos 13 anos passou a trabalhar embalando bombons Alpino na fábrica de
chocolates Dulcora. Aos nove, havia sido babá das sobrinhas do pintor Candido
Portinari.
Deixou o emprego para casar, aos 19 anos. Seis meses depois,
o marido, taxista, foi assassinado a tiros em uma tentativa de assalto,
deixando a jovem viúva grávida de quatro meses do seu primeiro filho, Marcos.
Ela conheceu Lula, também viúvo, em 1973, no Sindicato dos
Metalúrgicos da cidade. Ele trabalhava no Serviço de Assistência Social do
sindicato quando Marisa foi buscar um carimbo para recolher a sua pensão como
viúva. Os dois começaram a namorar e casaram-se menos de um ano depois.
Marisa acompanhou Lula desde o início de sua vida política,
durante as greves de operários no ABC paulista no fim dos anos 1970 – ele
tornou-se presidente do sindicato um ano depois do casamento, em 1975.
Ela foi a responsável por costurar a primeira bandeira do
Partido dos Trabalhadores. "Eu tinha um tecido vermelho, italiano, um
recorte guardado há muito tempo. Costurei a estrela branca no fundo vermelho.
Ficou lindo." Na época, estampava camisetas com a estrela símbolo da sigla
para arrecadar fundos para o partido e chegou a cadastrar as pessoas na rua,
buscando convencê-las da importância de montar um partido dos trabalhadores.
Em 1980, em plena ditadura, quando Lula e diversos
sindicalistas foram detidos no Dops (Departamento de Ordem Política e Social)
devido às greves, liderou uma marcha só com mulheres em protesto pelas prisões
políticas. "Hoje parece loucura. Fizemos uma passeata das mulheres em
1980, quando os dirigentes sindicais estavam presos. Encheu de polícia.
Os homens queriam dar apoio, mas dissemos não. Fizemos só
com as mulheres, eu de mãos dadas com meus filhos à frente", lembra em
entrevista à Fundação Perseu Abramo, em 2002.
Em 1º de janeiro de 2003, tornou-se primeira-dama após o
marido concorrer à Presidência quatro vezes, em 1989, 1994 e 1998. Passou a aparecer mais em palanques ao lado
de Lula durante a campanha de 2002.
Junto com o crescimento do PT, Marisa passou por um processo
de mudança, sob a orientação do publicitário Duda Mendonça. Ganhou um guarda-roupa
novo, em que terninhos ganharam espaço, e um corte de cabelo mais curto.
Enquanto ocupou o Palácio da Alvorada, adotou um
comportamento discreto. Uma vez ao ano, organizava festas juninas na Granja do
Torto, de propriedade da Presidência, quando participava das danças de
quadrilha ao lado do ex-presidente.
Causou polêmica ao ordenar que fossem plantados canteiros de
flores vermelhas, em formato de estrela, nos jardins do Palácio da Alvorada e
da Granja do Torto.
Nascida Marisa Letícia Casa, assumiu o sobrenome Silva ao se
casar com Lula. Quando o ex-presidente incorporou o apelido a sua assinatura,
passou também a assinar Marisa Letícia Lula da Silva. Para o ex-presidente, no
entanto, a mulher era apenas "galega", apelido pelo qual a chamava desde
que começaram a namorar, nos anos 1970.
Costumava dizer que foi pai e mãe dos filhos, a quem se
dedicou enquanto o marido avançava na vida pública. Cuidava sozinha do
apartamento em que a família vivia em São Bernardo.
"É ela quem manda. E ele obedece. Dona Marisa se dedica
a Lula e à família inteira. É o alicerce de Lula", definiu o cardiologista
e amigo da família, Roberto Kalil, médico de Lula há 30 anos, em entrevista ao
jornal O Globo em 2011, quando o ex-presidente teve a cabeça raspada pela mulher
durante o tratamento de câncer contra a laringe a que se submeteu.
Lava Jato
Dona Marisa era ré em uma ação penal, junto com o marido, na
Operação Lava Jato. Eles respondem pelos crimes de corrupção passiva e lavagem
de dinheiro em contratos firmados entre a Petrobras e a Odebrecht.
Segundo o Ministério Público, Lula recebeu propina da
empreiteira Odebrecht por intermédio do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci,
que também virou réu na ação, ao lado do empreiteiro Marcelo Odebrecht, e
outras cinco pessoas.
De acordo com a investigação, o dinheiro foi usado para
comprar um terreno, que seria usado para a construção de uma sede do Instituto
Lula (R$ 12,4 milhões), e um apartamento em frente ao que mora em São Bernardo
do Campo, na Grande São Paulo (R$ 504 mil).
A defesa de Lula informou que o ex-presidente aluga o
apartamento vizinho ao seu. Além disso, acrescentou que o Instituto Lula
funciona no mesmo local há anos e que o petista nunca foi proprietário do
terreno em questão.
Segundo os advogados do ex-presidente, a transação seria um
"delírio acusatório".
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