sexta-feira, 31 de março de 2017

CORRUPÇÃO PASSIVA

BRASÍLIA - A Procuradoria-Geral da República (PGR) ofereceu denúncia ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) contra o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB). O tucano é acusado de corrupção passiva, por ter parte de uma dívida de campanha eleitoral, no valor de R$ 90 mil, paga em troca de um aditivo realizado em contrato do Estado com a Delta Engenharia.
Foram denunciados por corrupção ativa, na mesma investigação, o contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira; o empresário Fernando Cavendish, dono da Construtora Delta Engenharia; e Cláudio Dias Abreu, um ex-diretor da empreiteira para a região Centro-Oeste. O Estado teve acesso à denúncia, que foi oferecida no último dia 24 e permanece em segredo de justiça.
De acordo com a PGR, Carlinhos Cachoeira se valeu de “estreitas relações” com agentes políticos de Goiás para que a Delta estabelecesse “contratos vultosos, vários deles firmados com violação de dispositivos expressos de lei ou com prejuízo flagrante aos cofres públicos”. Em troca, o contraventor – considerado na denúncia um “operador oculto dos interesses da Delta” - oferecia propina aos agentes públicos.
O desvio total estimado com os pagamentos de propina é de R$ 370 milhões, fato que é objeto de ação penal na Justiça Federal do Rio de Janeiro.  Para a PGR, o “papel” de Marconi Perillo “era central” no esquema.  “Com a assunção à chefia do executivo estadual em 01/01/2011, Perillo chancelou o violento aumento do número de contratos de diversas áreas da Administração entregues à Delta Construções, em virtude do que recebeu vantagens indevidas dos demais acusados, por meio de empresas fantasma criadas para tanto”, descreve na denúncia o vice-procurador-geral eleitoral, José Bonifácio Borges de Andrada. Após a posse de Perillo, os valores de contratos da delta subiram da casa de R$ 5 milhões para R$ 70 milhões, de acordo com a PGR.
Os investigadores identificaram o repasse de verbas ilícitas a 18 empresas fantasma, que eram usadas para lavar o dinheiro. “Os pagamentos das propinas, diga-se, eram levados a efeito através de transferências feitas pelas empresas fantasma aos beneficiários sob a forma de quitação de despesas dos agentes públicos ou por meio de saques em dinheiro e entrega em espécie às autoridades”, escreveu o vice-procurador-geral.
O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que representa Marconi Perillo, afirmou que a defesa foi surpreendida porque achava que o assunto estava esclarecido. Sobre as interceptações, o advogado disse que não vai se posicionar porque já anulou em outros casos essas gravações. “Essa denúncia é fruto do momento punitivo brasileiro, porque a denúncia é desconectada dos fatos. Não houve nenhum irregularidade”, afirmou.
O advogado de Fernando Cavendish, Antonio Pitombo, disse que não vai comentar a denúncia. O Estado não conseguiu contato com a defesa de Carlos Ramos e de Claudio Abreu.
Denúncia. No caso específico, a denúncia oferecida pela PGR aponta que, entre 2011 e 2012, Cachoeira, Cavendish e Abreu ofereceram propina a Perillo, para garantir contratos da Delta com os vários órgãos do Estado de Goiás. Uma das promessas foi de pagamento uma dívida do governador com o marqueteiro eleitoral Luiz Bordoni. Em troca, a empresa buscava um aditivo em contrato para ampliar o número de carros locados pela Delta para a Secretaria de Segurança Pública (SSP).
O valor original do contrato era de R$ 66,1 milhões, que já havia sido aditivado em 15,78%. Posteriormente, foi realizado outro incremento, que fez a aditivação superar o porcentual de 25% permitido pela Lei de Licitações. Após incremento determinado pelo governador, o valor do contrato pulou para R$ 75,3 milhões.
A promessa de pagamento a Perillo, segundo a PGR, foi feita em 2011, em Goiânia (GO). Foram feitas duas transferências de R$ 45 mil cada através de empresas fantasma para a conta corrente de Bruna Bordoni, filha do marqueteiro eleitoral.
Para a PGR, Perillo “tinha ciência de que o valor dispendido com o contrato de locação, nos moldes como posto, era desvantajoso para a Administração e ilegal”. Bonifácio indica na denúncia que caso o Governo de Goiás tivesse optado por comprar as 1.981 viaturas locadas gastaria R$ 39,2 milhões no lugar dos R$ 75,3 milhões do aluguel.
“Mesmo assim, a vista do pagamento pelos demais acusados das duas parcelas de R$ 45 mil relativas a sua dívida de campanha eleitoral, o governador Marconi Perillo determinou fosse levada a execução a segunda aditivação do contrato no dia 31/11/2011”, escreveu o vice-procurador-geral da República.
Processo. O caso está sob relatoria do ministro Humberto Martins, no STJ, tribunal competente para analisar investigações e denúncias contra governadores. Um acusado só se torna réu após recebimento da denúncia e abertura de ação penal. No caso dos governadores, no entanto, há uma outra etapa: a autorização da Assembleia Legislativa do Estado para processar criminalmente o governador.
O Supremo Tribunal Federal (STF) já se manifestou reiteradas vezes pela validade da exigência de autorização do legislativo estadual para que se abra ação penal contra governadores acusados por crimes comuns. Há uma nova discussão nesse sentido, no entanto, levada à Corte por conta da denúncia contra o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT). O julgamento já teve início, mas ainda não foi finalizado no STF.
Delação. O Estado revelou que Cavendish negocia um acordo de delação premiada, no qual pretende detalhar supostos pagamentos de propinas a políticos do PMDB e do PSDB relacionados a obras nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Goiás, além de estatais federais como o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e Petrobrás. O acordo de colaboração se dá no âmbito da Operação Saqueador, da qual o empresário foi alvo em junho do ano passado.
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