Nabil Bonduki, Folha de S.Paulo
Para quem ainda tinha dúvidas, Doria mostrou, na última
semana, que é pouco preparado para administrar uma cidade da complexidade de
São Paulo; se busca cargos mais elevados, precisa comer muito feijão com arroz
na planície.
A gestão pública requer atributos que vão muito além do
gerenciamento de um negócio. Área de conhecimento com teoria e conceitos
próprios, requer formação e experiência, além de habilidade política,
sensibilidade humana e capacidade de ouvir opiniões contraditórias antes de
tomar decisões.
A Prefeitura de São Paulo não é para amadores. Estrutura
complexa, com centenas de milhares de funcionários e terceirizados, lida com
inúmeras políticas setoriais, regidas por leis próprias, requerendo coordenação
e articulação. Não é uma empresa de marketing, um canal de comunicação ou um
negócio de lobby.
O prefeito ignora essa realidade. Preocupa-se mais com o
Facebook do que em formular políticas públicas em conjunto com sua equipe. Quer
aparecer como um gestor eficiente e autoritário, que acorda cedo e dorme tarde,
como se isso bastasse para gerir uma megacidade. Espera resultados rápidos,
mesmo que efêmeros, para reforçar essa imagem falsa.
Desinformado e sem estratégia, vislumbrou na equivocada ação
policial na cracolândia mais uma oportunidade para se promover como um
eficiente defensor da ordem e da limpeza urbana e social. De blusão preto, que
lembra as milícias fascistas, se misturou aos policiais e declarou que a
cracolândia tinha acabado, para espanto de seus próprios secretários.
Sem coordenação institucional, planejamento e apoio de
especialistas, achava que resolveria no grito um crônico drama social.
Improvisadamente, derrubou casarões ocupados, ferindo moradores, e anunciou um
arquiteto de grife para maquiar a área, como se essa fosse a questão. A
cracolândia mudou de lugar e se espalhou.
Ignorando as leis do país e os direitos humanos universais,
o prefeito pretendeu, com bravatas, tirar a questão social do mapa da cidade,
eliminando os seres humanos que considera indesejáveis e suprimindo os
territórios que ocupavam. Por fim, pediu autorização judicial para recolher,
coletiva e compulsoriamente, supostos usuários de drogas, contrariando a Lei
Antimanicomial, sancionada por FHC em 2001. A mobilização da sociedade, da
Defensoria Pública e do Ministério Público freou os instintos autoritários do
prefeito.
O prefeito "novo" reproduz o vício dos políticos
tradicionais: interrompe programas das gestões anteriores, sem propor nada no
lugar. De "novo", apenas a habilidade no Facebook. Que ele tenha a
humildade de dar dois passos atrás: ouvir os especialistas, avaliar os pontos
positivos e negativos do Braços Abertos e debater com a sociedade a melhor
forma de enfrentar o problema.
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