Do PODER 360
Os 3 principais partidos políticos brasileiros passaram a agir
em conjunto para desmoralizar a Lava Jato. Assim opina a porta-voz nacional da
Rede Sustentabilidade, Marina Silva. Ela disse ainda não acreditar em abusos da
parte dos investigadores e elogiou a ação de procuradores e juízes.
A presidenciável recebeu o Poder360 na tarde da última 6ª
feira (26.mai.2017), na sede do partido comandado por ela, em Brasília.
É viável um “grande acordo nacional” para “estancar a
sangria” e acabar com as investigações de corrupção? “Eles [os principais
partidos] estão tentando”, diz Marina Silva.
“Exatamente aqueles que nunca se uniram em função de causas
para o Brasil agora se unem em favor de detratar a Lava Jato. E de tomar
medidas para enfraquecê-la”, diz ela.
Eis a transcrição integral da entrevista de Marina Silva:
Poder360 – Michel Temer deveria renunciar?
Marina Silva – Naquela oportunidade [em dezembro de 2016]
era a chance que ele tinha de prestar um serviço ao Brasil. E obviamente que
isso dependia da sua consciência. Mas diante da crise que nós temos, e do
aprofundamento da crise depois da delação de Joesley Batista, e da manifestação
dele de que não iria renunciar, eu acho que consciência é um produto escasso.
Então o melhor caminho é aquele que eu sempre defendi, desde 2015: a cassação
da chapa Dilma-Temer pelo TSE.
O TSE [ao cassar a chapa] cumpre com a legalidade do ponto
de vista constitucional, pois está comprovado que houve um crime eleitoral
grave, com o caixa 2 e o uso de dinheiro da corrupção. E ao mesmo tempo ajuda a
alcançar a finalidade, que é devolver à sociedade a possibilidade de escolher
aquele que irá fazer a transição para saírmos da crise.
A legislação diz que, em caso de cassação da chapa, a menos
que seja a 6 meses do pleito, é possível uma nova eleição. E tanto é possível
que está sendo aplicada para os governadores, no caso do governador [cassado]
do Amazonas [José Melo, do Pros]. E poderá ser apreciado pelo TSE, pois já há
inclusive um parecer pronto do ministro [do STF] Roberto Barroso.
Se houver eleições diretas agora, você será candidata? E no
caso de eleições indiretas?
Esse é um momento no qual eu acho que é um desserviço falar
em candidatura. Antes de a gente ter a decisão de que haverá novas eleições.
Aliás, esse movimento por eleição direta deveria ser um movimento da sociedade,
evitando o protagonismo exacerbado de figuras que potencialmente possam vir a
ser candidatas e dos partidos políticos. Os partidos, a maioria deles, criou
essa crise. Agora é preciso deixa a sociedade recuperar o seu direito legítimo,
inscrito no artigo 1º da Constituição: “todo poder emana do povo, e por ele
será exercido”. Para que ela possa repactuar as bases sobre as qual nós vamos
legitimar esse programa de transição. A Rede defende as diretas entendendo que
é o melhor caminho. Eu estou dizendo isso desde 2015: o impeachment [da
ex-presidente Dilma] tinha legalidade, mas não ia alcançar a finalidade, pois
[os 2 integrantes da] chapa Dilma-Temer são faces da mesma moeda. Eles
praticaram os mesmos erros e os mesmos crimes juntos.
É preciso ser muito crédulo [para achar que] você poderia
tirar uma parte e a outra seria a solução. Então neste momento nós estamos
chegando no lugar onde nunca deveríamos ter saído, que é a cassação da chapa
Dilma-Temer. Por uma razão muito simples: a Justiça criminal está fazendo o seu
trabalho. Está punindo empresários, políticos, quem quer que seja. A Justiça
Eleitoral tem dupla razão para fazer também o seu. A 1a é o fato de que, se são
crimes, precisam ser julgados e punidos. E a 2a razão é que são crimes contra a
democracia. E ela tem a obrigação de mostrar exemplarmente que o crime
eleitoral, o crime contra a democracia, não compensa.
Você acha que alguns políticos estão exagerando nesse papel
de pré-candidato, neste momento?
Se for a pré-candidatura para 2018, é legítimo. [Há] os que
já estão com as suas pré-candidaturas na rua, porque aí é o calendário normal
das eleições. Eu me refiro a este momento agora, em que ainda não temos uma
decisão do TSE. Não temos ainda uma decisão de se haverá uma eleição direta,
ainda que seja o melhor caminho. E eu sei que há base legal para que se possa
fazer isso. Se colocar como candidato antes que haja a decisão constitucional
de que é possível haver eleição seria, como diz a minha avó, colocar o carro
adiante dos bois.
Alguns críticos dizem que a senhora só reaparece na época da
eleição. Como você responde?
Primeiro, dizendo que isso não é verdade. Você mesmo acabou
de dizer que eu escrevi 1 artigo [para o Poder360, em 22.dez.2016] dizendo que
o presidente deveria renunciar quando existia uma parte que queria incensa-lo e
outros que o estavam demonizando. Eu dizia que o caminho era o julgamento da
chapa [no TSE] e que os atalhos só iriam levar a abismos. Porque é claro que as
investigações, que estavam prosperando, iam chegar onde chegaram. Levando a uma
crise da sustentação política e ética [de Michel Temer] para dirigir a nação.
Eu entendo isso muito mais como uma estratégia autoritária
por parte de alguns. Como eu não faço parte de um dos campos que promovem a
polarização, e tenho um posicionamento independente, as pessoas não conseguem
imaginar que possa existir uma outra fala, ou que possa existir um outro lugar.
Então, se você não é contra o Temer e à favor da Dilma, ou vice-versa, você não
existe. Eu sempre dizia que o impeachment não era golpe. Mas que, além de não
alcançar a legalidade, não ia alcançar a finalidade. Ninguém estava dizendo
isso. Então as pessoas preferiam dizer que não é uma fala.
Eu dizia que o melhor caminho era o julgamento do TSE. As
pessoas não estavam dizendo isso. Nem o PSDB, que entrou com a ação [contra a
chapa Dilma-Temer]. Então, preferem dizer que eu estava calada. Eu dizia que
era preciso dar todo apoio à Lava Jato, que ninguém está acima da lei. Que a
Justiça está fazendo um trabalho histórico para o Brasil e que está ajudando a
fazer a reforma política na prática. Ninguém estava dizendo isso, então
preferem dizer que não era uma fala. É uma fala, só que de um outro lugar, de
um outro campo.
E obviamente que tem um outro equívoco, [cometido por]
alguns por má intenção e outro por desinformação. Durante o processo eleitoral
você tem, por obrigação legal, um espaço em que você aparece todo dia
praticamente [o horário eleitoral]. Aparece nos jornais, que têm que fazer uma
cobertura minimamente equânime. Na exposição da grande mídia. Quando passa o
período eleitoral você não terá mais esse espaço. E existe algumas pessoas que,
até por desinformação, acham que você poderia manter esse espaço. Outros [dizem
isso] por má-fé.
E há também o fato de eu não ter mandato. Eu sou uma cidadã
que tenho que fazer o meu trabalho. Foi uma escolha minha não querer me
recandidatar a um 3º mandato pro Senado ou pra qualquer outro cargo no
Congresso. E obviamente que isso cria uma dificuldade. Quem está na tribuna vai
criando fatos. Alguns fatos que, enfim, não são nem bons de aparecer. E
obviamente que, não aparecendo na mídia também nesses fatos [denúncias] as
pessoas preferem dizer que você não existem.
Ganha força no meio político e jurídico a avaliação de que a
Lava Jato está cometendo abusos e arbitrariedades. Você concorda?
Não concordo. Acho que a operação Lava Jato está fazendo um
grande trabalho para o Brasil. Eles estão fazendo, nesses poucos anos, aquilo
que levaríamos um século para conseguir. Desmontando esse mecanismo perverso de
corrupção que junta o poder econômico e o poder político para perpetuar um
grupo no poder econômico e o outro grupo no poder político. O trabalho que está
sendo feito tem base na Constituição e na legislação. Vivendo sob o fogo
cruzado de uma série de acusações, o tempo todo. Mas em 95% dos casos, se
confirma [nas instâncias superiores] que de fato estava havendo um problema
grave de corrupção.
E claro, a Justiça tem os seus mecanismos [para apurar o que
foi levantado] no expediente da colaboração premiada, sem considerar que aquilo
é a verdade em si mesma. O fato de alguém estar sendo investigado não o coloca
a priori como culpado, mas também não pode colocar como inocente. Senão não
haveria como a Justiça e a polícia fazerem o seu trabalho.
Estão fazendo um trabalho de grande relevância para o país e
sofrem hoje a oposição dos principais partidos da polarização, que estão sendo
investigados. PT, PSDB, PMDB e seus satélites. Exatamente aqueles que nunca se
uniram em função de causas para o Brasil agora se unem em favor de detratar a
Lava Jato. E de tomar medidas para enfraquece-la. É o caso da proposta do
senador Renan [Calheiros, do PMDB-AL], em relação ao abuso de autoridade, o
projeto de anistia para o caixa 2. E também a desconstituição das 10 medidas
que foram apresentadas pelo Ministério Público.
A sra. acha que é possível esse desmonte da Lava Jato?
Eles [PT, PSDB, PMDB] estão tentando. A possibilidade de que
a imprensa vá colocando os fatos sobre o que está acontecendo tem ajudado a
sustentar. Mas o que está sustentando a Lava Jato é a capacidade técnica que os
juízes e os procuradores e os investigadores têm. E obviamente que o expediente
da delação premiada tem dado uma contribuição para que se tenha as pistas para
a investigação. O apoio da sociedade para que o Brasil seja passado a limpo é
imprescindível. Isso não é apoio ao juiz. O juiz é apenas um juiz, ele vai ter
que se ater aos autos, não importa quem seja [o réu]. Se for inocente é
inocente, se for culpado é culpado. O que eu tenho dito é que ninguém pode ser
visto como poderoso demais, importante demais, popular demais para se sentir
acima da lei. A lei deve ser igual para todos. É isso que a Lava Jato está
trazendo de novo, fazendo uma espécie de reforma política na prática. Tornando
a política desinteressante para quem quer fazer negócios espúrios com a
política e deixando a política para quem quer prestar um serviço.
O INPE estima que o desmatamento na Amazônia cresceu 29% em
2016, em relação ao ano anterior. O que deu errado?
O que está acontecendo é que nós temos o maior retrocesso da
história do nosso país na agenda ambiental. Isso começou com o governo da
presidente Dilma. Agora estão sendo aprofundados os retrocessos que ela já
vinha praticando. E [há] as consequências da mudança do Código Florestal. O
Código foi mudado. Inclusive a lei que regularizou uma área enorme de mais de
41 milhões de hectares de terra grilada. Isso passou a ser um incentivo para a
ocupação de novas áreas, principalmente de terras públicas. Para que depois se
faça pressão sobre os governantes para regularizar essas áreas, como foi feito
anteriormente com o código florestal.
Aliás um dos argumentos que eles utilizavam era o de que
isso deveria ser feito em função dos pequenos [produtores rurais]. Agora, o
estudo que foi apresentado, me parece que pelo Imazon, dá conta de que cerca de
60% das áreas que foram regularizadas pertencem a 6% dos proprietários. 6% dos
proprietários ficaram com 60% das áreas que foram regularizadas, de terra
ocupada em espaços públicos que eram áreas de floresta da União, da sociedade
brasileira.
E ainda temos os outros retrocessos que estão em curso. Em
relação à mineração, do licenciamento ambiental, que agora querem que seja um
licenciamento expedito [mais rápido]. E o feito inédito de um governo que não
cria uma unidade de conservação [reserva ambiental] e ainda reduz as que já
existiam, como foi agora o caso da Floresta Nacional do Jamanxin [no Pará] e
mais uma floresta no Paraná. Foram reduzidos 600 mil hectares de floresta
nacional por esse governo. É o primeiro caso de crescimento negativo. Não cria
e ainda revoga as que foram criadas por governos anteriores. Aliás, essa
prática começou com o governo da presidente Dilma, que foi quem menos assentou
trabalhadores rurais, quem menos demarcou terra indígena e quem menos criou
unidades de conservação. O governo Temer não criou uma terra indígena, não
criou uma unidade de conservação e ainda diminuiu as que existem.
Em balanço, a sra. acha que Temer consegue ser ainda pior
que Dilma, ou fica empatado?
Eles são faces da mesma moeda. Ele está aprofundando os
retrocessos que já vinham acontecendo. A presidente teve um dos piores
desempenhos. E obviamente que como eles ganharam o governo sem um
programa, ele só dá continuidade ao que
já vinha sendo feito. Só que agora nós temos o aprofundamento da crise. E, no
governo da presidente Dilma, quando ela começou a ficar mais fragilizada, a
primeira agenda que entrou como moeda de troca foi a agenda ambiental e agenda
indígena.
No governo Temer, ela [a agenda ruralista] está a pleno
andamento no Congresso Nacional, diminuindo unidades de conservação, mudando a
legislação do licenciamento ambiental, impedindo o trabalho que deveria ser
feito pela Funai. E tendo no Ministério da Justiça um ministro [o então
ministro Osmar Serraglio] que advoga a causa de um setor em prejuízo do
trabalho de mediação que deveria fazer em benefício de todos, inclusive dos
índios.
Gostaria que você compartilhasse suas impressões sobre
algumas figuras que estão em evidência neste momento.
Joesley Batista:
Provou ser um dos campeões nacionais da corrupção.
Sérgio Moro:
Um homem que tem colocado o seu compromisso e competência a
serviço da Justiça.
Cármen Lúcia:
Deu uma grande contribuição quando decidiu homologar a
delação feita pela Odebrecht.
Deltan Dallagnol:
Um servidor a serviço da Justiça.
Lula:
Trocou o projeto de país por 1 projeto de poder.
João Dória:
Tem se colocado como o porta-voz da ambiguidade política.
Jair Bolsonaro:
Tem se colocado como um remanescente do autoritarismo.
Ciro Gomes:
É o pré-candidato do PDT.
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