Gustavo Krause, Blog do Noblat
O quase padre Roberto Campos cometeu o pecado capital de
pensar com brilho, liberdade e coragem de enfrentar a maré montante do
marxismo. Dizia: “Tendo abandonado o dogma religioso, dificilmente me deixaria
seduzir pelo dogma político”. A exemplo de José Guilherme Merquior, dileto
amigo, sequestrado pelas Parcas aos 49 anos, Roberto Campos impressionava não
pela absorção das leituras, mas pelo metabolismo das ideias.
Para os sacerdotes da verdade revelada do igualitarismo, era
um herege. Na ausência da fogueira inquisitorial, foi injuriado com rótulos de
“entreguista” e “Bob Fields”. Com ironia fina e argumento contundente,
reconhecia nos patrulhadores de todos os matizes, a capacidade incomum de
cooptar idiotas, chamando-os de “progressistas” e intimidar patriotas
chamando-os de “entreguistas”.
Mas o campo de Roberto era a elegante disputa dialética no
espaço das ideias. Entre os que discordavam, devotou respeito e admiração, como
foi o caso de Celso Furtado e San Tiago Dantas a quem definiu como um homem de
“esquerda positiva” em contraste com a “esquerda populista” de Brizola.
A despeito da visão liberal, houve um tempo em que acreditou
no planejamento estatal (BNDE, PLANO DE METAS, PAEG, FGTS) que, paulatinamente,
capturado pelos vícios patrimonialistas, levou-o a confessar a Delfim Netto
“Perdi muito tempo lendo, bastava ler Hayek” (Nobel de economia, escola
austríaca e pai do neoliberalismo). Em contrapartida, lutou tenazmente contra o
monopólio da Petrobras (a quem chamou de Petrossauro), definindo-o como “um
pecado à lógica econômica” e contra a autonomia tecnológica em informática que
qualificou “como uma solene estupidez, pois significou uma taxação da
inteligência e uma subvenção à burrice dos nacionalistas e à safadeza de
empresários cartoriais”.
Por coincidência, recente publicação da pesquisa qualitativa
realizada pela Fundação Perseu Abramo, vinculada ao PT, no período de 22\11\16
– 05\12\17, periferia de São Paulo famílias de renda até cinco salários, revela
o inesperado imaginário popular: o adversário da prosperidade não é a burguesia
e, sim, um Estado ineficiente; a ruptura do círculo da pobreza é a criação de
oportunidades conquistadas pela meritocracia, concorrência e ambiente propício
ao empreendedorismo.
Para quem pregou no deserto, a coincidência soa como
presente de aniversário, recebido com um sorriso maroto do polemista e uma
tirada do tipo: eis aí “o liberalismo dos pobres”!
O título do livro organizado por Ives Gandra e Rabello de
Castro acertou em cheio: Campos era uma “Lanterna de Proa”. Acesa.
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