Vice-presidente de jornalismo da Record, Douglas Tavolaro
teria negociado com o senador afastado Aécio Neves, do PSDB, uma entrevista com
o presidente Michel Temer em troca de patrocínio da Caixa Econômica Federal à
programação da emissora. As conversas, divulgadas nesta sexta (2) pelo site
BuzzFeed Brasil, ocorreram em dia 19 de abril e foram grampeadas pela Polícia
Federal, que investigava Neves por ter pedido R$ 2 milhões ao empresário
Joesley Batista, um dos donos da JBS.
O Notícias da TV apurou que, antes da conversa grampeada, Tavolaro
já havia ido até Brasília e conversado com Aécio Neves para que o senador
negociasse, no governo, um investimento de R$ 250 milhões em publicidade de
ministérios e estatais na Record durante 2017. O patrocínio da Caixa estaria
nesse pacote.
Na época das conversas grampeadas, Temer estava no centro de
uma grave crise política, já que a delação da Odebrecht tinha sido divulgada na
semana anterior.
Para controlar os danos, o presidente deu uma série de
entrevistas exclusivas à televisão: no dia 15, falou à Band; no dia 17, ao
jornalismo do SBT; no dia 28, ao Programa do Ratinho.
A conversa com a Record entraria nessa série se a Caixa
comprasse uma cota de patrocínio na emissora _o espaço publicitário vendido a
organizações estatais costumam ser mais caro do que o negociado com empresas
privadas. Como o patrocínio não foi aprovado, a entrevista com o presidente
também não ocorreu.
O BuzzFeed divulgou três áudios, realizados em um intervalo
de dez minutos. No primeiro, entre Tavolaro e Aécio, o executivo da Record
conta que está recebendo ligações do ministro Moreira Franco (da
Secretaria-Geral da Presidência), mas que não iria atendê-lo.
"Eu já deduzo qual seja o assunto. Ele ligou para o
nosso presidente e pediu para a gente tentar colocar nosso número um numas
entrevistas (...). Eu estou muito sem graça de falar com ele. Vou ter que
passar isso para cima e a situação está parada", reclama Tavolaro.
"Não tem como você empurrar um pouquinho, ou pelo menos
ouvir o que ele tem para dizer?", pede Aécio. "Eu já tenho o retorno.
O nosso presidente aqui não vai conseguir fazer [a entrevista]. Só tem um jeito
de sair. Se tiver uma coisa, entendeu?", responde o executivo, dando a
entender que a conversa com Temer só será realizada se o pacote de patrocínio
for aprovado.
Aécio emenda o primeiro telefonema com outro, para Moreira
Franco. Na conversa, deixa claro que esse tipo de negociação não deveria ser
feita daquela maneira. "É aquelas coisas que não precisa falar por
telefone (...). Mas você entrou nesse circuito com o cara da Caixa?",
questiona Aécio. Franco confirma: "Já entrei. Entrei hoje. Peça para ele
[Tavolaro] me ligar".
O senador retorna a ligação para Tavolaro e repassa o
conteúdo da conversa com Franco.
"Liguei para ele e (...) falei que você estava
constrangido de ele pedir outra coisa e você ter que dizer não. Você recebe
ordens. Tem toda a boa vontade, mas não é o dono (...). Deixa passar hoje para
não parecer ansiedade. Aí você liga amanhã de manhã, fala que recebeu o recado
(...). Eu disse a ele [Franco] o seguinte: é o assunto Caixa, o assunto
paralelo, que nada tem a ver com o que você está tratando [a entrevista com
Temer]".
"Ele está juntando num pacote. Não tem problema. Se ele
juntar o pacote [de patrocínios] e sair, eu agito o nosso cá [entrevista],
entendeu? Porque eu acho importante a estratégia dele [de Temer falar com as
emissoras]", responde Tavolaro.
A prática de negociar entrevistas em troca de favores
econômicos não é exclusiva de Tavolaro e também é realizada por outras
emissoras. Mas chama a atenção que o executivo de jornalismo da segunda maior
rede do país tenha se sujeitado a negociar publicidade na emissora, tarefa que
compete ao departamento comercial.
Tavolaro é um homem forte dentro da Record, apontado como
futuro presidente da emissora. É próximo de Edir Macedo, dono da emissora, de
quem escreveu duas biografias (O Bispo e Nada a Perder). Atualmente, produz o
filme que está sendo rodado sobre a vida do bispo.
Procurada, a Record negou, por meio de nota, que tenha
negociado patrocínio em troca de entrevistas.
"Houve uma solicitação de entrevista com o presidente
Michel Temer e a RecordTV queria ter a exclusividade e prioridade, naquele
momento, e não foi atendida.
O vice-presidente de jornalismo, Douglas Tavolaro,
trabalhava com suas fontes para conseguir as informações e a primazia. O
Planalto estava decidindo, através de outra estratégia, de colocar o presidente
para falar, quase simultaneamente, com todos os veículos, como de fato
aconteceu com várias emissoras de TV, rádio, jornais e sites.
Por mais que o vice-presidente de jornalismo da Record TV
tenha elogiado a estratégia, ele defendeu, junto a suas fontes, o desejo de
falar primeiro e exclusivamente com o presidente. Como o Palácio do Planalto
optou por outro formato, a RecordTV decidiu não fazer a entrevista.
Com relação à Caixa Econômica Federal, é um cliente
histórico da emissora e o departamento comercial da RecordTV trata diretamente
com a instituição e seus representantes publicitários, como acontece em
qualquer outro veículo de comunicação", informa a nota, que critica o
vazamento da conversa, já que "o sigilo das relações entre um jornalista e
sua fonte são resguardadas pela Constituição Brasileira".
Ao BuzzFeed, a Caixa Econômica Federal também negou a
negociação: "O ministro Moreira Franco solicitou à Caixa uma avaliação a
respeito da possibilidade de patrocínio ao Grupo Record, que não foi atendido
por não se enquadrar na política de patrocínio do banco", informou o banco
por meio de nota.
Nenhum comentário:
Postar um comentário