Da VEJA
Na manhã de 1 de setembro de 2016, o ex-ministro da
Previdência Carlos Gabas e uma secretária pessoal da ex-presidente Dilma
Rousseff entraram pela porta dos fundos de uma agência da Previdência na Asa
Sul, em Brasília. No dia anterior, o Senado havia formalmente cassado o mandato de Dilma Rousseff. Gabas, já ex-ministro do moribundo governo petista, chamou a
atenção dos funcionários da repartição ao surgir na porta e logo se isolar na
sala do chefe da agência. O que o ex-ministro da Previdência faria ali? Vasculhando
o sistema do INSS, um grupo de servidores logo descobriu algo errado: no
intervalo de poucos minutos que o ex-ministro e a secretária de Dilma estiveram
na agência, o processo de aposentadoria da ex-presidente foi aberto no sistema
e concluído sigilosamente. Graças ao lobby de Gabas e a presença da secretária,
que tinha procuração para assinar a papelada em nome da petista, em poucos
minutos, Dilma deixou a condição de recém-desempregada para furar a fila de
milhares de brasileiros e tornar-se aposentada com o salário máximo de 5 189
reais. Ao tomar conhecimento do caso, o governo abriu uma sindicância para
investigar a concessão do benefício.
Nesta sexta-feira, VEJA obteve as conclusões dessa
investigação. No momento em que o PT trava uma luta contra a reforma da
previdência, os achados da sindicância não poderiam ser mais desabonadores à
ex-presidente petista. Segundo a investigação, aposentada pelo INSS desde
setembro do ano passado, Dilma Rousseff foi favorecida pela conduta irregular
de dois servidores do órgão que manipularam o sistema do INSS para conseguir
aprovar seu benefício e ainda usaram influência política para furar a fila de
benefícios. Despacho assinado pelo ministro do Desenvolvimento Social, Osmar
Terra, aplica punições ao ex-ministro Carlos Gabas, responsável por Dilma ter
furado a fila do INSS, e à servidora Fernanda Doerl, que manipulou
irregularmente o sistema do INSS para regularizar o cadastro da petista.
Por ter usado da influência de ex-ministro da Previdência
para furar a fila de agendamentos do INSS a fim de acelerar o processo de
aposentadoria de Dilma, Carlos Gabas foi suspenso do serviço público por 10 dias.
Servidor de carreira do órgão, Gabas está cedido para o gabinete do petista
Humberto Costa (PE), líder da minoria no Senado. Com a punição assinada pelo
ministro Osmar Terra, ele não poderá trabalhar nesse período e terá o salário
descontado em folha. “As apurações demonstraram que as ações do indiciado
(Gabas) contribuíram para agilizar a concessão do benefício, assegurando seu
deferimento em condições mais favoráveis ou benéficas que o usual”, registra o
relatório final da sindicância: “O servidor atuou como intermediário junto à
repartição pública, fora das exceções permitidas em lei, em atitude
incompatível com a moralidade administrativa”, complementa.
Examinando a papelada apresentada pela ex-presidente Dilma
Rousseff ao INSS e os procedimentos adotados pela servidora no sistema do
órgão, os integrantes da sindicância concluíram que Fernanda Doerl considerou,
para efeitos de cálculo de tempo de serviço de Dilma, informações que a
ex-presidente não comprovava com documentos. Como todo brasileiro que procura o
balcão dos mortais no INSS costuma aprender de maneira dolorosa, não ter
documentos é uma falha que inviabiliza a concessão de aposentadoria. Para
Dilma, no entanto, isso não foi um problema. O cadastro de Dilma foi aprovado
em um dia mesmo sem contar com todos os papeis necessários. “A não observância
à norma legal e regulamentar nos autos presentes, foi materializada na medida
em que se deixou de exigir documentação necessária para a alteração cadastral
da segurada Dilma Vana Rousseff”, diz a sindicância. Para se ter uma ideia do
favorecimento que Dilma teve, dados do INSS mostram que os brasileiros que
estão com toda a documentação regular esperam pelo menos 90 dias — entre
apresentação e a concessão — para obter o benefício. Números atualizados nesta
semana mostram que pelo menos 400 000 brasileiros estão com processos de
aposentadoria represados no INSS nessa situação.
Segundo o regulamento do INSS, ao verificar que a papelada
de Dilma Rousseff estava irregular, a servidora do INSS deveria ter se recusado
a proceder com o benefício. Aos constatar as falhas, Fernanda Doerl, que levou
a pena de advertência por não ter atuado com “zelo”, “dedicação” e sem
“observar as normas legais” no episódio, tinha a obrigação, diz a sindicância,
de “alertar (Dilma) acerca das impropriedades e que o seguimento do pleito só
se daria a partir da apresentação, por completo, de todo o contexto documental
exigido e necessário”.
Ironicamente, apesar de apontar irregularidades e reconhecer
condutas impróprias no caso dos servidores, a sindicância justifica as penas
brandas aplicadas alegando que não verificou “intenção clara” dos investigados
em beneficiar Dilma Rousseff. Já sobre a própria ex-presidente a sindicância
limita-se a cobrar a devolução de 6 188 reais, referentes a um mês de salário
que teria sido pago irregularmente pelo INSS. Apesar da concessão irregular de
aposentadoria por falta de documentos, a sindicância constatou que o valor do
benefício da petista é compatível com o determinado. Dilma Rousseff está
recorrendo para não ter que devolver o dinheiro.
Para justificar a aplicação de advertência a Fernanda Daerl,
os integrantes da sindicância registram que a servidora, embora tenha atuado de
maneira displicente, não agiu de má-fé. “Foram demonstrados o descumprimento
das normas regulamentares e a falta de zelo da servidora. Por outro lado, não
há qualquer indício de que tenha havido má-fé da servidora. Não houve qualquer
contato indevido entre a indiciada e a segurada (Dilma) ou qualquer preposto
seu”, registra o relatório. Já Gabas, teve a punição atenuada por ter “bom
comportamento e bons antecedentes” enquanto servidor.
Ao prestar depoimento na sindicância, Gabas negou que
tivesse favorecido Dilma Rousseff ao cuidar pessoalmente do processo na agência
da Previdência em Brasília. Gabas alegou aos investigadores que “o atendimento
diferenciado de pessoas públicas era comum e tinha o objetivo de assegurar a
integridade física e moral dos demais segurados”. Já Fernanda Daerl sustentou
durante todo o processo que agiu de acordo com a lei e que se guiou por normas
do INSS para aprovar os dados cadastrais de Dilma.
Por meio de sua assessoria, a ex-presidente Dilma Rousseff
divulgou nota sobre a investigação. Dilma se diz vítima de perseguição por
parte do governo do presidente Michel Temer e ataca VEJA por divulgar os
resultados de uma sindicância oficial. A ex-presidente não explica, porém, como
conseguiu obter a aposentadoria, em questão de minutos, sem sequer ter
realizado o agendamento formal de seu processo no INSS, uma obrigação imposta a
todos os brasileiros. Atualmente, cerca de 400 000 pessoas estão na fila do
INSS há mais de 90 dias aguardando o desfecho do processo de aposentadoria.
Veja a íntegra da nota da ex-presidente Dilma Rousseff:
NOTA À IMPRENSA
Sobre a matéria de “Veja”
A propósito da matéria “Investigação confirma aposentadoria
irregular de Dilma”, veiculada por Veja a partir de sexta-feira, 18, a
Assessoria de Imprensa de Dilma Rousseff esclarece:
Veja volta a executar o velho Jornalismo de Guerra ao dar
ares de escândalo à aposentadoria da presidenta eleita Dilma Rousseff. O
escândalo está na perseguição que a revista promove e não na aposentadoria em
si.
Depois de 36 anos, 10 meses e 21 dias de serviços prestados
– comprovados documentalmente – aos 68 anos de idade, Dilma Rousseff se
aposentou com vencimentos pouco acima de R$ 5 mil — o teto do INSS. Ela nada
recebe como ex-presidenta da República ou anistiada política. O benefício segue
os rigores da lei. Tampouco se valeu de subterfúgios para o recebimento de
valores indevidos ou excessivos, como ocorre com Michel Temer e ministros do
governo golpista.
Afastada da Presidência pelo golpe construído a partir do
impeachment fraudulento, Dilma Rousseff recebeu em agosto de 2016 seu primeiro
benefício como aposentada.
Inicialmente, o governo golpista se recusara a reconhecer o
tempo de serviço dela, com base nos efeitos da anistia. É que, além de ter sido
encarcerada pela ditadura no início de 1970, Dilma Rousseff foi obrigada, a
partir de 1977, a se afastar de seu trabalho, na Fundação de Economia e
Estatística, por integrar a chamada lista do General Frota. Só no final dos
anos 1980, foi anistiada.
Por isso, Dilma Rousseff pleiteou para a sua aposentadoria o
reconhecimento pelo INSS do período de anistia de aproximadamente dez anos. O
governo golpista negou-lhe os efeitos da anistia com o evidente objetivo de
prejudicá-la. Alegou que tentava fraudar a previdência, procurando se aposentar
antes da hora. A ação foi frustrada porque Dilma Rousseff havia trabalhado por
todo esse período e podia facilmente comprová-lo. Como o fez.
Na sequência, o INSS apontou que uma anotação equivocada por
parte de uma funcionária — sem interferência da presidenta eleita —, ensejou a
concessão do benefício em agosto e não em setembro, como seria o correto. A
própria autarquia avaliou, no entanto, que não houve má-fé por parte da
servidora.
A defesa da presidenta eleita — a cargo dos advogados Bruno
Espiñera Lemos e Victor Minervino Quintiere — deixou claro que não era possível
exigir de Dilma Rousseff que soubesse tratar-se de equívoco por parte do
sistema do INSS. Isso porque o procedimento passou pelos devidos trâmites
regimentais.
Dilma Rousseff está recorrendo da devolução. A
jurisprudência dos tribunais superiores considera incabível a cobrança pelo
erário dos valores recebidos de boa-fé. Ela vê na atitude do governo golpista
uma clara tentativa de prejudicar funcionários de carreira criando uma “falsa
denúncia” para punição abusiva.
A sindicância mencionada por Veja reforça a tese da defesa
da ex-presidente de que não houve “intenção clara dos investigados em
beneficiar Dilma Rousseff”.
Veja dá cores de denúncia ao que é sanha de um governo
usurpador, tomado pelo objetivo de perseguição política e de diversionismo dos
escândalos de corrupção do grupo no poder. Devia era explicar as aposentadorias
precoces do presidente ilegítimo e de seus associados.
A revista também não cumpre a exigência fundamental do
jornalismo isento, ao deixar de procurar a defesa da ex-presidente ou sua
assessoria de imprensa. Não há desculpas ou explicações que justifiquem a
parcialidade e o proselitismo político da revista.
Esse é o retrato dos nossos tempos, em que a democracia se
mantém sufocada pelos interesses inconfessáveis de uma elite insensível ao
bem-estar da população e ao respeito dos direitos democráticos, como a
liberdade de imprensa.
Assessoria de Imprensa
Dilma Rousseff
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