Da ISTOÉ
A “Quadrilha”, de Carlos Drummond de Andrade, cada dia
descreve com mais exatidão o que ocorre nos tribunais de contas do País. “João
amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava
Lili”. Reproduzindo em versos livres: a ministra do Tribunal de Contas da União
(TCU), Ana Arraes, era filha do governador Miguel Arraes (PE), que era avô do
governador Eduardo Campos (PE), que era primo do conselheiro do Tribunal de
Contas de Pernambuco, João Henrique. E a estrofe continua: Marcos Loreto, que
não tinha entrado na história, e é primo de Renata Campos, que era mulher de
Eduardo Campos, virou Conselheiro do Tribunal de Contas de Pernambuco.
A nobreza política hereditária tem outros casos exemplares.
Um deles é o do Conselheiro do Tribunal de Contas do Rio Grande do Norte, Paulo
Alves. Ele é irmão do senador e ex-governador Garibaldi Alves, sobrinho do
ex-governador Aluizio Alves, primo do ex-presidente da Câmara Henrique Alves e
do prefeito de Natal, Carlos Eduardo Alves.
Mas os Alves não estão sós no TC do Rio Grande do Norte. O
conselheiro Tarcísio Costa, foi indicado pelo irmão e deputado estadual Vivaldo
Costa; Renato Dias é irmão do deputado estadual e ex-presidente da Assembleia
Álvaro Dias; Poti Cavalcante é ex-deputado estadual e irmão do ex-deputado
Alexandre Cavalcanti, assim como tio do atual vice-prefeito de São Gonçalo do
Amarante, Poti Neto.
Esses Tribunais oferecem bons salários para seus ocupantes.
Os ministros do TCU recebem o mesmo que os ministros do STJ. Estes ganham
95,25% dos salários dos ministros do STF, que é de R$ 33.700,00, o que dá para
os conselheiros do TCU a bagatela de R$ 32 mil. Mas é claro que não estão
contabilizados aí os escandalosos penduricalhos individuais, como auxílio
moradia, gratificação por função, férias de 60 dias, entre outras coisas. Os
conselheiros dos Tribunais de Contas Estaduais recebem o mesmo que os
desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados, que correspondem a
90,25%, dos R$ 33.700,00 dos ministros do STF, ou um total de R$ 30 mil.
Um conjunto de grandes famílias controlam as finanças
públicas dos Tribunais da União e dos Estados. A Transparência Brasil fez um
levantamento, em 2015, e constatou que entre os 233 conselheiros dos Tribunais
de Contas, 73 deles tinham chegado lá pelo parentesco com pesos pesados da
política: governadores, senadores, ministros de governo, secretários de estado,
ministros de Tribunais Superiores e deputados. Competência à parte, eles
chegaram lá pela estratégia do elevado QI (Quem Indica).
Ponto final
A revolta contra essa política de grande família se amplia
na opinião pública à medida que ela vai tomando conhecimento desta ação entre
amigos. Por isso, surgem vários movimentos para mudar o processo de indicação
de conselheiros e ministros de Tribunais de Contas. A palavra de ordem é a da
redução dos apadrinhamentos. As associações de classe de procuradores e
técnicos de contas atuam para diminuir o número de nomeações feitas pelo
Congresso, Assembléias Legislativas e governantes.
No TCU, as vagas do Legislativo cairiam de seis para quatro
e o presidente da República não faria mais nenhuma indicação. Hoje faz uma. A
maioria passaria a ser de nomeações técnicas.
Nos Tribunais de Contas Estaduais, as Assembleias indicariam
três, e não quatro como hoje. Os governadores também perderiam sua vaga.
O porta-voz da mudança é o senador Cássio Cunha Lima (PSDB).
Ele é autor da Proposta de Emenda Constitucional que pretende colocar um ponto
final nas nomeações de políticos e parentes para os Tribunais de Contas. Por
ora, o espeto é de pau na casa do ferreiro Cunha Lima: para o TC da Paraíba,
ele nomeou um primo, Arthur Lima, e um tio, Fernando Catão.
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