José Paulo Cavalcanti Filho, Blog do Noblat
A legalização da maconha, no Uruguai, excita imaginações.
Como se fosse uma revolução. Quando, na verdade, é só tentativa de resolver um
grave problema de saúde pública. Porque morre-se muito em razão da manipulação
criminosa das drogas. A ideia é substituir uma ruim, por outra – menos letal,
mais barata, legalizada. Seja como for, a decisão deve ser vista como natural.
Tendo em conta o que ocorria por lá. Estima-se que 160 mil, dos 3,5 milhões de
habitantes do país, a consumiam regularmente. E muitos grupos de
auto-cultivadores já tinham, inclusive, autorização para plantar cannabis nas
suas casas. Agora, pacotes com 5 gramas de flores de maconha passam a ser
vendidos nas farmácias de Montevideo. Por 4 reais, a grama. Cada adulto pode
comprar até 40 gramas por mês. Pena que apenas 4, em 380 farmácias da capital,
aderiram ao programa. E uma já se retirou, a Pitágoras (do bairro de Malvin).
Por ter o Banco Santander ameaçado cancelar sua conta. Dado não admitir, entre
seus clientes, quem esteja no ramo da maconha. Tudo está muito ainda no início.
Essa legislação não é novidade uruguaia. Em verdade,
trata-se de uma tendência mais ampla. Nos Estados Unidos, por exemplo, há mais
estados que permitem do que proíbem o uso da maconha. E na Europa, mesmo sem
lei, essa liberação já ocorre. A Suíça
inclusive lançou, com grande sucesso comercial (esse mercado já vale, hoje, 320
milhões de reais anuais), um cigarro de maconha. Com menos de 1% de THC
(tetraidrocannabinol, componente psicoativo da planta). Marca Heimat. Vendido
em supermercados, ou pela internet, a quem tenha mais que 18 anos. Ao preço de
65 reais, cada maço – com 4 gramas de THC e 80% de tabaco. Apesar disso, hotéis
e restaurantes têm restringindo seu uso. Algumas regiões do país, como Ticino,
retiraram o produto das prateleiras. E países vizinhos, como Alemanha e
Áustria, não permitem sua entrada. É complicado.
Ocorre que algo mudou, no quadro teórico sobre o tema. Todos
sabiam que maconha era usada, sobretudo, para controlar uma angústia difusa. No
fundo, tentativa de auto-regulação selvagem para inquietações interiores. E sem
maiores riscos, assim se pensava. Novidade é não ser tão inocente, à saúde.
Para tanto, basta conferir conclusões de estudo (fevereiro de 2015) sob
responsabilidade da prestigiada instituição Open Acess. Financiado, inclusive,
pelo King’s College de Londres. Segundo ele, consumidores de cannabis tem 25%
mais de chances para desenvolver esquizofrenia. Em sua conclusão
(interpretation), vemos que “a associação entre uso da cannabis e o
desenvolvimento da esquizofrenia foi confirmada sob uma perspectiva
epidemiológica”. Atingindo, sobretudo, as pessoas mais frágeis. Física e
mentalmente.
Outro estudo, agora do GREA (Groupement Romand D’Études des
Addictions, maio.2017), vai na mesma linha. Com grandes elogios à maconha
terapêutica – relatando efeitos positivos sobre aids, câncer, doenças
inflamatórias, epilepsia, esclerose, parkinson e dores em geral. Mas
reconhecendo ser inquestionável que também contribui para deflagrar doenças
mentais preexistentes. E, mesmo, que certas disposições genéticas afloram com o
consumo da cannabis. Maconha não seria propriamente a causa, é certo. Mas um
fator que vai permitir a emergência da esquizofrenia e outros males. Resumindo,
não se trata de algo só para divertir. A
droga é, também, perigosa.
Agora, o tema começa a ser debatido no Brasil. A Anvisa,
inclusive, acaba de anunciar que vai regulamentar o plantio da maconha. Até
meios de 2018. Nada contra. No tanto em que a liberação legal da droga parece
constituir tendência mundial. Mas penso que isso deve acontecer, antes, nos
países do primeiro mundo. Não devemos ser cobaias deles, esse o ponto. Tudo
sugerindo que melhor ter cautela, antes de fazer conclusões apressadas. Ou de
querer apressadamente copiar algo assim, por aqui.
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