quarta-feira, 11 de outubro de 2017

NENHUMA DITADURA

Paulo Rubem Santiago, Congresso em Foco
As declarações do General Antônio Hamilton Martins Mourão, proferidas num evento promovido pela Maçonaria em Brasília, atiçaram grupos sociais pela volta dos militares ao governo da República. Por que razão? Para acabar com a corrupção e o que mais? Nada mais nefasto que pensar assim quando se sabe que governos militares assentam-se sobretudo nas armas e não nas liberdades ou nas ideias, sustentam-se com ameaças, prisões e mortes, e não em argumentos que levem os cidadãos a apoiá-los e, democraticamente, chancelá-los para fins de governo, em eleições livres, para a execução de programas e construção de metas visando o bem-estar de todos.
Teremos futuro sendo um Brasil de governos militares? Não. Até porque, os militares, se governantes forem, terão que adotar decisões econômicas, tributárias, fiscais e dar formas “jurídicas” aos seus atos. Seus assessores representarão que interesses? Que segmentos serão atingidos por suas decisões? E de que forma isso se dará, sem a manifestação da opinião e da vontade do povo? Vejamos.
O golpe que empossou Temer abriu as portas para a defesa de agendas e reformas ultraconservadoras, que restringem os gastos do estado em várias dimensões apenas para manter perenes e contínuos os ganhos de uma ditadura financeira sem pés no chão da economia real, da produção, do trabalho, da arrecadação de tributos e da expansão formal da renda dos assalariados.
Por isso, os que pedem a volta dos militares são covardes, omissos, incapazes de agir por conta própria, de ler e entender a realidade. Transferem sua capacidade de intervenção na sociedade para terceiros, no afã de vê-los superar problemas que eles próprios deveriam enfrentar, debater e resolver por caminhos democráticos. Certamente, há entre essa gente aqueles que, como em 1964, sentindo ameaçadas suas benesses e seu patrimônio, lançaram à sociedade o fantasma do comunismo para apoiar o golpe militar e depois ter na ditadura sua arma de governo e de acumulação de riquezas, enquanto calavam-se milhares de brasileiros, pela força, torturas e mortes.
A história provou que o Brasil não seria uma nação comunista com as reformas de base. João Goulart, um grande dono de terras, e Celso Furtado, um intelectual estudioso do país, queriam, por exemplo, industrializar, com empregos formais, renda e mais consumo, o Brasil atrasado do Nordeste. Queriam mais propriedade privada no campo, mais produtores e mais mercadorias, com a reforma agrária.
Paulo Freire lançara-se numa ação pela alfabetização em todo o país, construindo com os excluídos as condições para avançarem, com a leitura da palavra e do mundo. Óbvio que, desde 1500, ler o mundo pelos de baixo nunca interessou à colônia, aos donos do império e da república. Por isso o medo do “comunismo” de Jango, Furtado e Paulo Freire.
A fala do General Mourão foi uma senha, para ver até quando, com quantos, se forjam as bases para um novo golpe, que jamais será progressista, em cima do golpe de 2016, cujos autores são, também, conservadores, corruptos e incapazes de fazer políticas tributárias e fiscais progressivas e emancipatórias, como foram aqueles que derrubaram a partir de maio do ano passado.
O capitalismo, em sua voracidade acumulativa, é incompatível com a democracia e com a justiça social, num mundo neoliberal que a tudo abarca e formata para os interesses das finanças privadas. Pedir a volta dos militares é crime contra a democracia, que tem seus próprios caminhos.  A força adequada para agirmos está nas ruas e fará avançar a base para a cassação de corruptos, a prisão de empresários criminosos, o fim da ditadura financeira e a busca do bem comum.
Paulo Rubem Santiago é professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e faz atualmente mestrado em Educação. Foi vereador do Recife, deputado estadual e deputado federal (de 2003 a 2014). Criador da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção, é filiado atualmente ao Psol.
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