As declarações do General Antônio Hamilton Martins Mourão,
proferidas num evento promovido pela Maçonaria em Brasília, atiçaram grupos
sociais pela volta dos militares ao governo da República. Por que razão? Para
acabar com a corrupção e o que mais? Nada mais nefasto que pensar assim quando
se sabe que governos militares assentam-se sobretudo nas armas e não nas
liberdades ou nas ideias, sustentam-se com ameaças, prisões e mortes, e não em
argumentos que levem os cidadãos a apoiá-los e, democraticamente, chancelá-los
para fins de governo, em eleições livres, para a execução de programas e
construção de metas visando o bem-estar de todos.
Teremos futuro sendo um Brasil de governos militares? Não.
Até porque, os militares, se governantes forem, terão que adotar decisões
econômicas, tributárias, fiscais e dar formas “jurídicas” aos seus atos. Seus
assessores representarão que interesses? Que segmentos serão atingidos por suas
decisões? E de que forma isso se dará, sem a manifestação da opinião e da
vontade do povo? Vejamos.
O golpe que empossou Temer abriu as portas para a defesa de
agendas e reformas ultraconservadoras, que restringem os gastos do estado em
várias dimensões apenas para manter perenes e contínuos os ganhos de uma
ditadura financeira sem pés no chão da economia real, da produção, do trabalho,
da arrecadação de tributos e da expansão formal da renda dos assalariados.
Por isso, os que pedem a volta dos militares são covardes,
omissos, incapazes de agir por conta própria, de ler e entender a realidade.
Transferem sua capacidade de intervenção na sociedade para terceiros, no afã de
vê-los superar problemas que eles próprios deveriam enfrentar, debater e
resolver por caminhos democráticos. Certamente, há entre essa gente aqueles
que, como em 1964, sentindo ameaçadas suas benesses e seu patrimônio, lançaram
à sociedade o fantasma do comunismo para apoiar o golpe militar e depois ter na
ditadura sua arma de governo e de acumulação de riquezas, enquanto calavam-se
milhares de brasileiros, pela força, torturas e mortes.
A história provou que o Brasil não seria uma nação comunista
com as reformas de base. João Goulart, um grande dono de terras, e Celso
Furtado, um intelectual estudioso do país, queriam, por exemplo,
industrializar, com empregos formais, renda e mais consumo, o Brasil atrasado
do Nordeste. Queriam mais propriedade privada no campo, mais produtores e mais
mercadorias, com a reforma agrária.
Paulo Freire lançara-se numa ação pela alfabetização em todo
o país, construindo com os excluídos as condições para avançarem, com a leitura
da palavra e do mundo. Óbvio que, desde 1500, ler o mundo pelos de baixo nunca
interessou à colônia, aos donos do império e da república. Por isso o medo do “comunismo”
de Jango, Furtado e Paulo Freire.
A fala do General Mourão foi uma senha, para ver até quando,
com quantos, se forjam as bases para um novo golpe, que jamais será
progressista, em cima do golpe de 2016, cujos autores são, também,
conservadores, corruptos e incapazes de fazer políticas tributárias e fiscais
progressivas e emancipatórias, como foram aqueles que derrubaram a partir de
maio do ano passado.
O capitalismo, em sua voracidade acumulativa, é incompatível
com a democracia e com a justiça social, num mundo neoliberal que a tudo abarca
e formata para os interesses das finanças privadas. Pedir a volta dos militares
é crime contra a democracia, que tem seus próprios caminhos. A força adequada para agirmos está nas ruas e
fará avançar a base para a cassação de corruptos, a prisão de empresários
criminosos, o fim da ditadura financeira e a busca do bem comum.
Paulo Rubem Santiago é professor da Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE) e faz atualmente mestrado em Educação. Foi vereador do
Recife, deputado estadual e deputado federal (de 2003 a 2014). Criador da
Frente Parlamentar de Combate à Corrupção, é filiado atualmente ao Psol.
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