Artigo de Cristovam Buarque, O GLOBO
O jornalista Roberto D’Ávila me perguntou como chegamos à
situação em que nos encontramos e na qual parecemos aprisionados.
A sensação é de que fomos cometendo erros, como se dobrássemos
esquinas caminhando por um labirinto, sem saber o caminho de volta, ainda menos
de ida: para fora das amarras que nos impedem de progredir civilizada e
sustentavelmente.
O labirinto se inicia com a escravidão e o latifúndio, mas
não temos desculpas para os erros dos caminhos tomados nas últimas décadas, que
foram contaminando o Estado, a economia e a sociedade por erros na política.
Dobramos uma esquina do labirinto ao conquistarmos a
democracia e fazermos uma Constituição para apagar o passado autoritário, mas
sem usá-la para construir o futuro da nação. Garantimos direitos sem determinar
deveres, sem definir sentimento de coesão nacional.
Ficamos presos ao imediato de cada grupo sem instrumentos
nem vontade para formular e construir o rumo para todos no longo prazo.
Nos aprofundamos no labirinto por causa do endividamento
público e privado, sem responsabilidade, de acordo com nossos recursos;
derrubamos florestas, secamos rios; transformamos nossas cidades em
“monstrópoles” divididas por “mediterrâneos invisíveis”. Protegemos com
subsídios empresas ineficientes, sem buscar aumentar produtividade,
competência, inovação.
Elegemos governos progressistas, mas eles não fizeram as
reformas necessárias; dobramos uma esquina do labirinto usando o Estado para
financiar campanhas eleitorais com propinas e dando emprego a afilhados dos
políticos e a filiados dos partidos, sem respeito à competência dos nomeados.
Depois do impeachment, no lugar de recuperar a credibilidade
na política, pedida por milhões nas ruas, embrenhamo-nos no labirinto, com o
vice-presidente aparecendo sob suspeita de conivência com a corrupção.
O mergulho no labirinto foi aprofundado por parlamentares
que aprovam leis sem o necessário rigor, olhando o imediato e seus próprios
interesses eleitorais; cortamos verba para setores prioritários e liberamos
recursos públicos para financiar campanhas eleitorais.
Os tribunais, que trazem a esperança do enfrentamento da
corrupção, agravam o caminho labiríntico ao se viciarem em privilégios e ao
criarem instabilidade jurídica.
A injustiça social, a impunidade legal, o incentivo
obsessivo ao consumo, a falta de bons exemplos vindos dos quadros dirigentes,
aprofundaram a marcha adentro no labirinto. Para sair dele, seria fundamental
dispor de interpretações atualizadas sobre a crise da modernidade e o futuro do
Brasil, mas nossas universidades parecem aceitar passivamente o contínuo
caminhar no labirinto, sem inovação ou ineditismo e até sem respeito ao mérito.
O labirinto é o resultado de sucessivas escolhas erradas ao
longo da história, mas a principal foi o descuido com a educação de nossas
crianças, do nascimento até a vida adulta.
Nenhum comentário:
Postar um comentário