Hubert Alquéres, Blog do Noblat
A questão do papel Estado é um divisor de águas e tende a
estar no centro da disputa presidencial. As duas candidaturas populistas estão
presas a modelos passados que perderam sentido e não respondem às necessidades
do século 21. O Brasil de hoje é inteiramente diferente do que era nos tempos
do varguismo ou do estatismo do presidente militar Ernesto Geisel. Mas a
direita e a esquerda estatistas pensam ainda ser possível alavancar o
desenvolvimento a partir do intervencionismo estatal. Não por coincidência,
Lula e Bolsonaro são pródigos em elogios à era Geisel.
O Estado que aí está gerou o capitalismo de laços, levou o
país à maior crise econômica de sua história. Mais: perpetuou iniquidades e
privilégios de minorias incrustadas em seu aparato. Nele coabitam o
patrimonialismo e o corporativismo, duas forças atrasadas e refratárias às
mudanças.
São elas os principais entraves às reformas necessárias e à
modernização da economia. Vide as resistências à reforma da Previdência e às
privatizações da Eletrobrás e dos aeroportos, emblemáticas do espúrio casamento
entre corporações de trabalhadores e patronais com o clientelismo político.
Na outra ponta, o Estado oferta serviços públicos de
baixíssima qualidade, mesmo sendo financiado por uma carga tributária
altíssima. A sociedade carrega um fardo pesadíssimo para sustentar um aparato
ineficiente, burocrático, perdulário e frequentemente corrupto.
Esse Estado não serve ao Brasil. Não alcançaremos o
crescimento sustentado, não seremos um país socialmente mais justo, não
lograremos a equidade enquanto ele não for desconstruído.
O grande desafio do campo democrático alternativo aos dois
extremos autoritários e regressivos é oferecer aos brasileiros um outro projeto
de Estado, capaz de responder aos desafios de um mundo em intensa transformação
e de colocar o país no patamar das sociedades modernas e desenvolvidas.
Felizmente, não partimos do zero na definição do Estado que
queremos. Já há muita massa crítica e iniciativas que jogam luz no debate
necessário. Todas elas convergem para a necessidade imperiosa da refundação do
Estado, tese que permeou o seminário Desafios Políticos de um Mundo em Intensa
Transformação, promovido pelo ITV/PSDB e FAP/PPS, que está presente no
manifesto dos intelectuais do PSDB e nas conclusões do Quarto Encontro da Roda
Democrática – movimento suprapartidário do qual faço parte.
A pedra de toque é a redefinição de seu papel, no sentido da
transformação de um Estado produtor e financiador da produção, em um Estado
regulador e provedor de serviços públicos de qualidade.
Se no passado se fazia necessária a forte presença estatal
na economia — como aconteceu nos anos 1950/60 -- hoje isso não se justifica
mais. Em uma economia globalizada e de forte inovação tecnológica o motor do
desenvolvimento são os investimentos privados, internos e externos. A inflexão
se impõe também porque o Estado não tem pujança para alavancar os investimentos
e ao mesmo tempo cumprir com suas obrigações sociais.
Ao Estado moderno compete desenhar o marco regulatório para
a atração do capital privado, definir as normas de proteção dos consumidores e
do meio ambiente, dar segurança jurídica aos investidores, assegurar a
concorrência.
O esforço, portanto, deve ir na direção da abertura da
economia brasileira e de realizar um ousado programa de privatização para que
possa redirecionar seus recursos e energia para outras prioridades.
O Estado não é um fim em si mesmo, ou não deveria ser. Seu
principal papel é o de ser o meio para a promoção da equidade, da igualdade de
oportunidades.
Liberado de sua função de produtor e financiador da
produção, suas prioridades seriam fornecer aos brasileiros educação de
qualidade, saúde e segurança, entre outros serviços.
No caso da educação, o foco deve ser o ensino básico. As
nações que conquistaram a equidade e o crescimento sustentado trilharam esse
caminho. Não será diferente com o Brasil.
Na era da Quarta Revolução Industrial, da robotização e da
inteligência artificial os países que não ingressarem no restrito clube da
inovação tecnológica serão meros coadjuvantes no cenário internacional. Nessa
área, o atraso do Brasil é gritante, motivo mais do que suficiente para
revolucionar também a concepção do Estado.
Sem um novo pacto federativo, sem as reformas estruturantes
-entre as quais a previdenciária-, sem o enxugamento do aparato estatal, o
Brasil continuará refém de políticos parasitários e fisiológicos, de
capitalistas de compadrio, de corporações sindicais e de servidores que não
abrem mão de privilégios.
Refundar o Estado significa livrar o país destes grilhões e
acabar com o patrimonialismo e o corporativismo.
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