domingo, 14 de abril de 2019

CABRAL MENTE ATÉ EM CONFISSÃO

Elio Gaspari, Folha de S.Paulo
A colaboração de Sérgio Cabral com o Ministério Público do Rio e com o juiz Marcelo Bretas virou conversa de botequim. Até agora, suas confissões confirmam que ele corrompeu o mandato de governador do Rio, mas isso já se sabia, pois está condenado a 198 anos de prisão.
Num depoimento espetaculoso, Cabral contou que em 2011 o chefe de sua Casa Civil, Régis Fichtner, pressionou-o, até com “ameaça”, para que seu cunhado, o desembargador Marco Aurélio Bellizze, fosse nomeado para uma vaga no Superior Tribunal de Justiça, atropelando a candidatura do advogado Rodrigo Candido de Oliveira, sócio do escritório da mulher de Cabral.
O juiz Bretas e o meio jurídico sabem que uma nomeação nada teve a ver diretamente com a outra. Belizze foi escolhido para uma vaga de magistrado, e Rodrigo disputava uma cadeira dos advogados. Ademais, quem nomeia ministros para o STJ é o presidente da República, e Bellizze tinha currículo que superava o parentesco.
O ex-governador disse ao juiz Bretas que foi obrigado a fazer “esse papelão de barrar o sócio de minha esposa”. Colocou-se em outro papelão ao embaralhar os fatos. Os dois disputavam páreos diferentes em ocasiões diferentes, Rodrigo perdeu em abril e Bellizze ganhou em julho. A farofa leva água para a suspeita de que Cabral instrumentaliza suas confissões pelos ventos da política do Rio de Janeiro.
O pastel de vento é demonstrativo da banalização em que caíram as delações. Quando Cabral, o Magnífico Gestor, fez coisas que nem Asmodeu imaginava, tudo parecia normal. Agora, quando Cabral, o Penitente, confessa seu “papelão”, busca crédito de virgem.
Olhando-se para trás, quando Antônio Palocci era o quindim da banca, viam-no como um grande ministro da Fazenda. Apenado, tornou-se uma fábrica de delações espetaculares, vazias de provas. Ele contou que foi nomeado gerente de uma caixinha de empreiteiras, o que pode ser verdade, mas não se sabe ainda como recolheu o dinheiro nem como o distribuiu.
A divulgação do anexo de Palocci pelo juiz Sergio Moro foi instrumentalizada na campanha eleitoral do ano passado. O Rio não precisa que mais essa praga entre na sua política.
O JUIZ DA SUPREMA CORTE LOUVA O BANQUEIRO
Acaba de sair nos Estados Unidos “First”, uma boa biografia da juíza Sandra O’Connor, a primeira mulher nomeada para a Suprema Corte. Há ali uma pequena história reveladora dos jogos de influência que cercam as nomeações para aquele tribunal.
O’Connor é uma tremenda figura. Foi criada num rancho do Arizona e formou-se politicamente no partido republicano. Quando ela estava na universidade Stanford, namorou e quase casou com William Rehnquist, seu colega de turma.
Em 1971, O’Connor era uma juíza influente no andar de cima do Arizona e Rehnquist foi indicado para a Suprema Corte. Ela batalhou pelo ex-colega e conseguiu o apoio do presidente do maior banco do estado, Sherman Hazeltine.
Aprovado pelos senadores, Rehnquist agradeceu à ex-namorada com uma carta:
“Fui surpreendido pelos contatos de Hazeltine junto aos banqueiros do Oeste. Apreciei não só os seus esforços, mas também admirei a eficácia dos seus contatos no Congresso. Talvez seja por isso que os banqueiros têm mais influência que os advogados”.
Rehnquist foi aprovado pelos senadores e presidiu a Corte Suprema por 19 anos, até 2005, quando morreu.
Nenhum magistrado brasileiro tem coragem de escrever uma carta dessas. Rehnquist foi um conservador honrado, espalhafatoso ao se vestir mas com um uma cabeça de primeira ordem.
MULHERÃO
Sandra O’Connor era senadora no estado do Arizona, contrariou um colega e ele lhe disse:
—Se você fosse homem eu acertava o teu nariz.
Ela respondeu:
—Se você fosse homem, acertava.
MADAME NATASHA
Natasha tem horror aos marxistas culturais e votou em Marcelo Crivella porque sua bandeira de campanha era “Eu vou cuidar das pessoas”.
A senhora viu que o prefeito visita áreas alagadas tomando cuidado para não molhar os sapatinhos. Depois de duas enchentes nas quais morreram 14 pessoas em apenas três meses, Crivella reconheceu: “Nós falhamos”.
Natasha acredita que Crivella martiriza as pessoas que votaram nele com suas acrobacias pronominais. Quando fala bem de si, usa o “eu”. Confrontado com a qualidade de sua gestão, pula para o “nós”.
APEX VIROU MÃE JOANA
Ao demitir o embaixador Mário Villalva da presidência da Apex, o chanceler Ernesto Araújo emitiu uma nota informando que ato visava a “dinamização e modernização do sistema de promoção comercial”. Naquele texto a única coisa verdadeira era a data.
Villalva foi chamado pela sua competência, depois que Araújo nomeou e defenestrou um monoglota. O embaixador devia saber onde estava pisando, mas atritou-se com dois diretores saídos do ventre do bolsonarismo. Ele os classificou como “pessoas despreparadas, inexperientes, inconsequentes e irresponsáveis”.
Nesse caso, como em algumas de suas declarações desastrosas, Araújo faz o que ouve no Planalto.
Pelas regras da corte de Brasília, é comum que alguns ministros papagueiem o que ouvem do presidente. Ao serem criticados, os bonecos do ventríloquo acreditam que se fortalecem junto ao chefe. Ricardo Vélez acreditou que esse truque poderia blindá-lo.
WEINTRAUB DELIRA
No seu primeiro dia como ministro da Educação, o doutor Abraham Weintraub fez uma reunião com um colaborador e foi categórico:
“Não pode ficar falando. Se ele toma uma posição sem autorização minha, é mandado embora no mesmo instante”.
O doutor se esquecera de desligar o seu celular e sua fala foi ouvida pela repórter Jussara Soares.
Se Weintraub acha que vai silenciar o MEC, talvez faça melhor tornando-se consultor mundial de blindagens. Conter vazamentos foi o sonho de Barack Obama, que impedia a entrada de celulares em reuniões.
O ministro faria melhor se ouvisse “Maria Moita”, de Carlos Lyra:
“Vou pedir ao meu Babalorixá
Pra fazer uma oração pra Xangô
Pra por pra trabalhar
Gente que nunca trabalhou”.
CÉU DE BOLSONARO
Jair Bolsonaro disse que nos primeiros cem dias seu governo voou em “céu de brigadeiro”.
Seu ministro da Ciência e Tecnologia foi oficial da Força Aérea. Bolsonaro poderia perguntar-lhe em que tipo de céu voa um esquadrão de 22 aviões e dois deles (0,9%) são abatidos (Gustavo Bebianno e Ricardo Vélez).
CIRO QUER QUEBRAR
Ciro Gomes acha que, se o projeto de autonomia do Banco Central passar, será o caso de “ir para a rua e quebrar tudo”.
Falou em linguagem figurada, mas em 2006, quando manifestantes foram para a porta de sua casa à noite para fazer barulho (sem quebrar nada), ele foi para a calçada, peitou-os, mandou-os circular e em seis momentos referiu-se às suas mães.
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