A sugestão de usar o FGTS para
estimular o consumo vale uma hora da saudade. O governo autoritário tinha
grande preocupação com o problema habitacional.
Já em 21/8/64 foi criado, pela Lei 4380, o Sistema
Financeiro de Habitação (uma das obras primas do jurista-economista José
Bulhões Pedreira), com o objetivo de estimular, planejar e realizar a
construção de habitação popular e a aquisição da casa própria, por meio do
criado Banco Nacional da Habitação (BNH), que coordenaria várias
instituições.
Em 13/9/66, foi criado o FGTS para substituir o dispositivo
da CLT que estabelecia uma indenização ao trabalhador, no caso de dispensa, de
um salário por ano até o 10º ano, quando ele ganhava estabilidade no emprego.
No longo prazo, o passivo trabalhista destruía a saúde econômica da firma que
era a garantia dos trabalhadores. Com o FGTS, cuja gestão foi entregue ao BNH,
toda empresa passou a depositar —no nome de cada trabalhador— 8% do seu
salário, libertando-o daquela escravidão.
O FGTS é propriedade do trabalhador que pode sacá-lo em
condições especiais. A verdade é que sempre foi mal remunerado e a sua
aplicação (nem sempre republicana) foi exercida pelos governos nos últimos 53
anos. Devolvê-lo ao trabalhador para seu consumo ou investimento de acordo com
seus desejos é, claramente, uma opção razoável.
Infelizmente, entretanto, terá um efeito passageiro muito
pequeno para ajudar a resolver o grande problema que nos aflige: o fantástico
desemprego de 13 milhões de brasileiros produzido pela redução da demanda de
2014 que ainda revela um hiato negativo no PIB da ordem de 4% ou 5%; na
construção civil, de 9% a 10%, e na indústria de transformação não menor do que
7%.
Tanto a dissipação como consumo ou como investimento
daqueles recursos aumentarão, contemporaneamente, a demanda global, mas seus
efeitos são muito diferentes do ponto de vista dinâmico.
Uma expansão do consumo das famílias de R$ 30 bilhões
ou R$
40 bilhões é equivalente a 3% do consumo atual de um trimestre e
esgotar-se-á nele mesmo, sem o aumento da produtividade da economia.
Investido, chegará ao consumidor como salário nos setores
com hiato negativo e ampliará o estoque de capital da sociedade. Gerará a mesma
demanda em tempos diferentes, mas aumentará a produtividade futura da economia
e, logo, mais PIB, mais emprego e mais consumo. E, no final, mais FGTS!
O programa econômico do ilustre ministro Paulo Guedes vai ao
fundamental e caminha relativamente bem. Talvez não seja conveniente acelerá-lo
com artifícios populistas que sempre terminam muito mal.
Antonio Delfim Netto
Economista, ex-ministro da Fazenda (1967-1974). É autor de
“O Problema do Café no Brasil”.
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