O presidente Jair Bolsonaro aparenta não sentir medo de
nada. Sua formação de paraquedista, cuja missão é combater atrás das linhas
inimigas e improvisar diante das adversidades, parece comandar suas ações como
presidente da República. Só não sente medo aquele que acredita que nada lhe
pode acontecer. “As pessoas não acreditam nisso quando estão, ou pensam estar,
no meio de grande prosperidade, e são por isso insolentes, desdenhosas e
temerárias”, já dizia Aristoteles, 350 anos antes de Cristo.
Inspirado no filósofo grego, o falecido físico
norte-americano Carl Sagan, já na década de 1980, concluiu que o aquecimento
global era uma grande emboscada. Os chamados combustíveis fósseis — o carvão, o
óleo e o gás — foram a força propulsora do progresso. “A nossa civilização
funciona pela queima dos resíduos de criaturas humildes que habitaram a Terra
centenas de milhões de anos antes que os primeiros humanos aparecessem na
cena”, dizia, para arrematar: “como num terrível culto canibal, subsistimos dos
corpos mortos de nossos ancestrais e parentes distantes”. Entretanto, há um
preço a pagar.
A dependência dessas fontes de energia é uma das principais
causas de conflitos e disputas no mundo, sejam as duas guerras mundiais dos
século passado, sejam os atuais conflitos do Oriente Médio. Por outro lado, a
vida depende de um equilíbrio delicado de gases invisíveis que compõem a
atmosfera da Terra. A queima de carvão, petróleo e gás natural mistura carbono
com oxigênio, sintetizando o dióxido de carbono (CO²), libera uma energia que
estava trancada há 200 milhões de anos nas entranhas do globo. Essa queima e a
destruição de florestas, numa escala cada vez maior, devido a uma série de
reações químicas, aumentam o aquecimento da Terra. Por isso, a questão ambiental
é um problema global, que exige soluções locais.
Pensar globalmente e agir localmente é um dos fundamentos
das políticas públicas ambientalistas. Faz todo sentido, porque a atmosfera não
tem fronteiras, mas as ações dependem dos estados nacionais. No caso de um país
de dimensões continentais como o Brasil, depende também dos estados e
municípios. Cientistas do mundo inteiro acompanham o aquecimento da terra e
seus indicadores, entre os quais as emissões de carbono e desmatamento,
enquanto outros pesquisadores desenvolvem novas tecnologias para reduzir ou
substituir a emissão de carbono, produzindo energia limpa ou equipamentos que
dispensam o carbono para funcionar. O Brasil era um país de vanguarda na luta
contra o aquecimento global, apesar de todos os nossos problemas e
dificuldades.
Perde-perde
Estávamos no caminho certo, embora toda política pública pode ser aperfeiçoada. Entretanto, o presidente Jair Bolsonaro deu um cavalo de pau na política ambiental. O primeiro sinal dramático das consequências dessa inflexão foi a tragédia de Brumadinho, que depois se repetiu em Mariana, ambas em Minas Gerais. Os graves prejuízos ecológicos e perdas humanas mostraram a importância das licenças ambientais e da fiscalização e controle das atividades mineradoras. Agora, os incêndios na Amazônia — que ocorrem numa escala muito acima do que seria o fenômeno sazonal proveniente da seca —, mostram as consequências do cavalo de pau na fronteira agrícola e em regiões de garimpo na Amazônia Legal. Pode o presidente da República falar o que bem quiser, os fatos são teimosos.
Estávamos no caminho certo, embora toda política pública pode ser aperfeiçoada. Entretanto, o presidente Jair Bolsonaro deu um cavalo de pau na política ambiental. O primeiro sinal dramático das consequências dessa inflexão foi a tragédia de Brumadinho, que depois se repetiu em Mariana, ambas em Minas Gerais. Os graves prejuízos ecológicos e perdas humanas mostraram a importância das licenças ambientais e da fiscalização e controle das atividades mineradoras. Agora, os incêndios na Amazônia — que ocorrem numa escala muito acima do que seria o fenômeno sazonal proveniente da seca —, mostram as consequências do cavalo de pau na fronteira agrícola e em regiões de garimpo na Amazônia Legal. Pode o presidente da República falar o que bem quiser, os fatos são teimosos.
Ontem, na reunião com governadores da Amazonia, foi
flagrante a diferença de enfoque entre o presidente da República, que reiterou
seu discurso ideológico contra os índios, os quilombolas e os ambientalistas, e
a preocupação dos governadores da região com a objetividade que o problema
exige: combater os incêndios e buscar ajuda financeira internacional. Bolsonaro
queixa-se do fato de que os países mais desenvolvidos condicionam a liberação
de recursos a contrapartidas que contrariam seus projetos de exploração dos
recursos minerais da Amazônia, como a demarcação de terras indígenas e
quilombolas e a criação de parques nacionais.
Bolsonaro tem razão em alertar para interesses ocultos no
conflito, principalmente quanto às exportações de nossos produtos agrícolas,
mas erra ao não compreender que as nações mantêm relações de competição e
cooperação, simultaneamente. Quando um país abre mão da cooperação, acirra a
competição.
A estratégia do presidente Donald Trump em relação à China é
um bom exemplo de que esse desequilíbrio a favor da competição pode virar um
jogo de perde-perde, ao contrário da cooperação, presidida pela lógica do
ganha-ganha. Carl Sagan dizia que o aquecimento global é uma emboscada para a
civilização, o que se confirmou nos últimos 30 anos, a ponto de o governo da
Indonésia ter decidido, nesta semana, mudar a capital para Bornéu por causa da
progressiva elevação do nível do mar. No caso do Brasil, a guinada
antiambientalista de Bolsonaro, como no provérbio bíblico, “arma uma cilada
contra o próprio sangue”, porque os prejuízos serão muito grandes para o nosso
agronegócio.
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