quarta-feira, 21 de agosto de 2019

FISCALISMO SUICIDA

José Luis Oreiro, DCI
O presidente Jair Bolsonaro declarou recentemente que “o Brasil inteiro está sem dinheiro. Os ministros estão apavorados”. Essa afirmativa foi para justificar cortes no orçamento da União feitos pelo Ministério da Economia, os quais ameaçam levar à paralisação de várias atividades governamentais como o funcionamento das universidade públicas, o pagamento de bolsas de pesquisa para mais de 84 mil pesquisadores pelo CNPq e a dispensa de contingente expressivo de recrutas das Forças Armadas brasileiras.
O que talvez o presidente não saiba é que isso não resulta de “escassez de dinheiro”, mas trata-se de um martírio imposto para a sociedade brasileira pelas regras fiscais anacrônicas e conflitantes existentes no Brasil. Em outras palavras, o problema não é que o “dinheiro acabou”; mas sim que existem regras fiscais absurdas que impedem o governo de gastar, mesmo em situações, como a atual, na qual gastos governamentais são imprescindíveis para recuperação cíclica da economia brasileira e para manutenção do funcionamento normal do Estado. Hoje existem três regras fiscais, a saber: a regra do teto de gastos, a regra de resultado primário e a “regra de ouro”. A primeira impõe limite para os gastos primários da União (o que exclui o pagamento de juros da dívida pública), os quais são reajustados anualmente com base na inflação ocorrida no ano anterior. A segunda, definida na LDO de 2019, fixa que a União pode incorrer em déficit primário de, no máximo, R$ 139 bilhões. Por fim, a “regra de ouro”, definida na Constituição Federal de 1988, diz que a União só pode se financiar para pagar despesas de capital, não despesas de consumo e de custeio.
Nenhum país do mundo civilizado possui essa profusão de regras fiscais que o Brasil tem, até porque a multiplicidade de regras traz o sério risco de se criar um arcabouço fiscal inconsistente; no qual os formuladores de política econômica podem se ver incapacitados de cumprir todas as regras simultaneamente por absoluta falta de instrumentos de política econômica. Esse é o caso do Brasil. Para o ano de 2019, o Brasil consegue cumprir com uma certa folga a regra do teto de gastos, a qual só deve se tornar “efetiva” em 2021; mas não conseguirá cumprir a “regra de ouro” e talvez não consiga cumprir a regra de resultado primário. Para o ano de 2019, o Congresso Nacional já aprovou “crédito suplementar” para a União no valor necessário para o atendimento da “regra de ouro”, de maneira que essa regra não será um problema para o corrente ano. Contudo, devido aos efeitos que a lenta recuperação do nível de atividade econômica após o término da recessão de 2014-2016 tem sobre o ritmo de crescimento das receitas da União, é possível que a meta de déficit primário não seja cumprida, o que obriga o ministério da economia a contingenciar parte do orçamento da União, causa da situação atual de “escassez de dinheiro”.
A boa notícia é que se trata de um problema simples de ser resolvido. Basta o presidente da República encaminhar ao Congresso Nacional um pedido de revisão da meta de déficit primário, aumentando o déficit máximo para R$ 170 bilhões; permitindo assim o fim do contingenciamento de recursos. A aprovação da reforma da Previdência pela Câmara dos Deputados manterá ancoradas as expectativas de médio e longo prazo da situação das contas públicas, abrindo o espaço necessário para uma bem-vinda expansão fiscal no curto prazo.
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