terça-feira, 6 de agosto de 2019

HITLER, CALÍGULA E O CÉSAR TROPICAL

Luís Antônio Giron, ISTOÉ
Os deuses enlouqueciam quem eles queriam matar. Assim nasceu a “hybris” (destempero, em grego), que atingiu protagonistas da tragédia grega, como o rei Agamêmnon, de “A Ilíada”. No caso do capitão Jair Bolsonaro, ao nascer os deuses parecem ter imprimido em sua testa o sinal da “hybris”, dando a ele o poder de alucinar até a morte uma nação de 220 milhões de habitantes. Com mais precisão, o jurista Miguel Reale Junior definiu Bolsonaro como um fera: “O habitat dele é este, o habitat horrendo do mundo das trevas, do mundo da morte, da tortura, da perseguição”.
Em vista do caráter arcaico de suas falas e atitudes, não convém comparar Jair a Adolf ou Benito, como muitos o fazem. O nazista e o fascista eram – com o perdão da heresia – estadistas. Tanto um como outro alimentava projetos de nação: Hitler planejava impulsionar a economia alemã, ao passo que Mussolini ansiava em restaurar o Império Romano. Hitler ordenou a submissão e o genocídio das raças não arianas, algo que não se aplica ao guia nazifasci entreguista brasílico.
Para melhor comparação, Bolsonaro corporificaria o sonho de Benito. Sim, um novo imperador romano! Mas não se trata de um monarca justo, como Augusto ou Marco Aurélio. Jair é análogo aos césares mais notáveis. Calígula, que reinou entre 37 e 41, nomeou cônsul o seu cavalo, Incitatus, e forçou o Senado a homenageá-lo. Entre os anos de 54 a 68, Nero construiu um estádio privado para assistir às torturas de cristãos: denominou-o de Coliseu (Colosseum) para celebrar-se. Após seu suicídio, os três imperadores seguintes mataram-se uns aos outros no intervalo de um ano e meio. Mais tarde, Cômodo, que governou entre 180 e 192, professava a crença no “panis et circenses”, o pão e circo que visava a alienar os cidadãos. Exibia-se em estádios, nos quais combatia lutadores que invariavelmente matava. Quando faltou pão em Roma, decretou cinco dias de jogos gratuitos no já estatizado Coliseu para apaziguar os ânimos. O povo provou que podia viver só com circo. No auge da megalomania, rebatizou Roma de Commodiana. Indiferente ao governo, manteve uma relação de atrito com o Senado.
Abandonado pelos aliados, foi estrangulado por um parceiro de luta, Narciso, enquanto se banhava.
Imperator Bolsonarus, o césar tropical, merece melhor sorte, claro. Mas de uma coisa podemos ter certeza: Calígula, Nero, Hitler e outros tantos ensinaram que todo o governo autocrático costuma terminar mal, mais tarde ou, melhor ainda, mais cedo.
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