José Roberto Mendonça de Barros, O Estado de S.Paulo
Em meados de julho passado, o título de minha coluna foi “O mundo entre otimistas e pessimistas”.
Lá foi dito que o futuro depende, essencialmente, dos rumos da economia dos Estados Unidos, o maior e o único país rico a crescer bem neste ano. Existem dois pontos a considerar:
1) “A política agressiva e errática do presidente Trump vem elevando a incerteza e as tensões por causa das inúmeras disputas comerciais e dos atritos em regiões sensíveis, como no Oriente Médio. Entretanto, o conflito mais relevante segue sendo com a China, pois vai muito além do comércio…”
“… Essa disputa ainda vai muito longe e a recente decisão, na reunião do G-20 no Japão, de retomar as negociações sobre tarifas, tem de ser vista como apenas tática…”
2) “… No curto prazo, a pergunta dos bilhões é o que ocorrerá com a economia americana nos próximos meses. Nesse ponto, há uma clara disputa entre os analistas, que se dividem, como sempre, entre otimistas e pessimistas.
O primeiro grupo argumenta que o crescimento econômico ainda vai continuar robusto por mais algum tempo. Não existe nenhuma pressão inflacionária, o Fed deverá baixar os juros e o consumo continua a crescer.
Os pessimistas, entre os quais me incluo, veem uma reversão do ciclo e uma recessão bem próxima, provavelmente até o primeiro trimestre do próximo ano…”
Entretanto, as últimas semanas mostraram uma evolução que, a meu juízo, elevaram as chances dos pessimistas estarem com a razão.
Tudo começou com a decisão do Federal Reserve: embora a redução de 25 pontos na taxa de juros básica já fosse amplamente esperada pelo mercado, a declaração de Powell, de que se tratava de um ajuste pontual de meio de ciclo, caiu muito mal.
A divulgação da ata da reunião nesta semana, apenas mostrou a ampla divisão do colegiado do Fed.
Logo em seguida, no dia 1.º de agosto, veio uma inesperada decisão de Trump de colocar 10% de impostos de importação, a partir de 1.º de setembro, no remanescente dos produtos chineses importados pelos Estados Unidos e ainda não tarifados. Naturalmente, ficou ainda mais difícil qualquer tipo de acordo comercial no curto prazo. A postergação da incidência do imposto em alguns tipos de produtos, como telefones celulares, até o Natal não altera o efeito deletério da decisão presidencial.
Acentuou-se a inversão da curva de juros, com a ampliação do spread negativo, especialmente, entre o papel de 3 meses e o de 10 anos, que chegou a 0,40%. A maioria dos participantes de mercado leva muito a sério a percepção de que no passado, toda vez que isso ocorreu, sucedeu uma recessão nos meses subsequentes.
Com tudo isso, os mercados sentiram muito e no dia 5 de agosto, a Bolsa de Nova York caiu quase 3%.
Acentuou-se a busca por ativos seguros como o ouro, que passou de US$ 1.500,00, franco suíço, iene e, especialmente, a compra de papéis de baixo risco, mesmo com taxas de juros negativas. É extraordinário que se estime que mais de US$ 16 trilhões estejam nessa situação. Em outras palavras, muita gente prefere pagar um preço para não perder mais dinheiro em caso de uma crise.
E ela não tardou com a piora na situação política em Hong Kong, que se tornou aguda quando, no dia 13 de agosto, manifestantes fecharam o aeroporto da cidade, o que levantou o receio de uma intervenção chinesa. A derrocada de Macri, na Argentina, foi também um pequeno choque.
Finalmente, temos uma piora acentuada na percepção do consumidor e na produção industrial nos Estados Unidos, com o indicador PMI não mais sinalizando crescimento.
Por um momento, um quase pânico tomou conta dos mercados globais.
Embora os otimistas acenem com um bom desempenho do consumo e com a possibilidade de ação do Fed, o discurso de Powell em Jackson Hole não trouxe promessas de redução acentuada de juros, como queria o mercado. Ao contrário, chamou a atenção para os efeitos deletérios da guerra comercial.
Parece-me inequívoco que o mundo está mais para os pessimistas, infelizmente.
* Economista e sócio da MB Associados.
domingo, 25 de agosto de 2019
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