Estou na Amazônia para mais uma viagem de aprendizado na
região. Ela é vastíssima, e minha capacidade de aprender é lenta e sinuosa. A
floresta tem cem mil espécies animais, 43 mil vegetais. As queimadas devem
arder até outubro, a julgar pela experiência dos últimos anos.
Os ânimos parecem ter se acalmado. Angela Merkel deu o tom
no G-7 ao afirmar que é preciso fazer alguma coisa, sem dar a impressão de ser
contra Bolsonaro. Não se trata de um exercício de psicologia individual. Merkel
é uma estadista, tem objetivos maiores, lida com pessoas complicadas como
Trump. Percebeu talvez que Trump e Bolsonaro são frutos de uma época e que não
podem ser tratados com os mesmos critérios do passado.
Bolsonaro anunciou que apresentaria uma política para a
Amazônia. Mas, até o momento, afirmou apenas, em reunião com governadores, que
era preciso explorar as terras indígenas.
Essa história de Bolsonaro com os índios brasileiros esbarra
na Constituição. Para avançar sobre a superfície, precisa de emenda
constitucional e para avançar no subsolo indígena é necessária uma lei
complementar, que Romero Jucá não conseguiu aprovar ao longo desses anos.
Algumas repercussões negativas ainda estão no horizonte:
fundos suecos planejam deixar de investir no Brasil, compradores de couro, como
a Timberland, querem se fechar para a nossa produção.
Importante lembrar que boicotes e sanções contra governos —
pelo menos é a impressão que tenho ao longo dos anos que acompanhei — atingem
as pessoas comuns e acabam fortalecendo os próprios governos visados.
As pessoas vivem grandes paixões políticas. O único caminho
é mostrar a importância da floresta em pé, pelos seus serviços ambientais e
pela riqueza de sua biodiversidade. Nada contra ninguém, é apenas prioritário
divulgar o conhecimento científico sobre a floresta, os serviços ambientais que
presta na regulação do clima, na segurança hidrológica, na captura do carbono.
No meio da semana, visitei o mercado Ver-o-Peso. É
impressionante como convergem para ele os diferentes produtos amazônicos. Há 80
barracas de ervas medicinais e perfumes. Essas propriedades não são ainda
comprovadas cientificamente. Mas a verdade é que a floresta e a sabedoria
tradicional encontram um caminho suplementar para atenuar sofrimento e oferecer
cuidados que nem o SUS pode oferecer.
O Itamaraty seguiu um novo rumo ao cobrar, no contexto do
Acordo de Paris, o pagamento pela captura do carbono, já previsto. É muito
melhor que pedir ajuda em horas difíceis. Não que a ajuda deva ser rejeitada.
Mas, pensando bem nas dimensões do problema, 20 milhões de euros é o preço de
dois apartamentos de luxo em Paris.
O importante é buscar os caminhos previstos no acordo. O
governo Bolsonaro acha que o aquecimento global é uma invenção do globalismo
marxista. É um pouco contraditório apoiar-se num acordo internacional de
redução de emissões, considerando-a uma tarefa desnecessária.
Mas Bolsonaro decidiu continuar no Acordo de Paris. Por que
não buscar também os benefícios que oferece? Um pouco de incoerência não faz
mal a ninguém. Trump também não acredita no aquecimento global. Mas quer
comprar a Groenlândia porque a região se tornará mais explorável com a
temperatura em ascensão.
Existe hoje uma hostilidade populista às descobertas da ciência.
No entanto, o caminho do conhecimento e da informação é essencial.Mesmo porque,
a maioria dos corações já deseja a floresta em pé. As manifestações no mundo
inteiro demonstram isso. Mas revelam ainda pouca informação.
Os políticos brasileiros viajam muito para o exterior. Mas
muito pouco para a Amazônia. A própria imprensa internacional é muito centrada
em conflitos e pouco em universos ainda desconhecidos.
A sociedade brasileira está diante de um desafio. Certas
escolhas, como já mostrou em livro Jared Diamond, podem selar o êxito ou o
fracasso de um país. A ideia básica é desenvolver a Amazônia de forma
sustentável e inclusiva. O fato de não termos ainda conseguido esse objetivo
não pode significar que é um erro. Na verdade, isto está expresso em todos os
planos regionais que o país destinou à Amazônia.
Bolsonaro acha que as pessoas o seguem em tudo. Não acredita
nas pesquisas.
Artigo publicado no jornal O Globo em 02/09/2019
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