quarta-feira, 1 de julho de 2020

BOLSONARO ABANDONA NEGACIONISMO DA POBREZA

Bruno Boghossian, Folha de S.Paulo

Jair Bolsonaro chegou ao poder como um negacionista da pobreza. Crítico contumaz de programas de transferência de renda, ele disse no ano passado que a fome no Brasil era “uma grande mentira” e que o papel do governo era facilitar a vida “de quem quer produzir”.

Sob risco, o presidente se converteu. Nesta terça (30), o governo anunciou o pagamento do auxílio emergencial do coronavírus por mais dois meses. A prorrogação poderia ser um ato burocrático, mas Bolsonaro organizou uma cerimônia no Planalto e chamou o programa de “o maior projeto social do mundo”.

O presidente adiou o fim do benefício por uma questão de sobrevivência. As novas parcelas e o plano de reformulação do Bolsa Família se tornaram decisivos para a permanência de Bolsonaro no cargo e para sua aposta na reeleição em 2022.

A pandemia marcou uma mudança na composição da base do presidente. Em 2019, os mais pobres correspondiam a 32% do grupo que considerava o governo ótimo ou bom, de acordo com o Datafolha. Desde então, o presidente manteve a popularidade estável, mas o segmento de baixa renda passou a representar 52% de seus apoiadores.

A atuação desastrosa de Bolsonaro na pandemia afastou segmentos mais ricos, mas levou para seu campo eleitores que estão na base da pirâmide social. O fim do pagamento do auxílio representaria um risco de erosão num nicho agora majoritário.

O cálculo político é claro. No início da pandemia, o governo propôs apenas três parcelas de R$ 200 aos mais pobres para amenizar a crise. Só triplicou o valor após pressão do Congresso. Quando o programa chegava ao fim, o ministro da Economia afirmou que a prorrogação era arriscada porque “aí ninguém trabalha”.

Bolsonaro tenta consolidar apoio em novos grupos, mas ainda poderá buscar a retomada de territórios perdidos. “Ele tem chance de recuperar apoio nos segmentos mais abastados se mantiver a postura atual, menos explosiva”, avalia Mauro Paulino, diretor do Datafolha.

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