sexta-feira, 3 de julho de 2020

O PAÍS DO "MORRA QUEM MORRER"

Bernardo Mello Franco, O GLOBO

Agora que a pandemia ultrapassa as 60 mil vítimas, o prefeito de Itabuna informa: “Mandei fazer o decreto que no dia 9 abre. Morra quem morrer”.

A frase de Fernando Gomes choca pela sinceridade, não pelo conteúdo. De norte a sul, o país assiste a uma reabertura geral do comércio. A doença ainda está fora de controle, mas muitos políticos resolveram fingir que o vírus sumiu.

É o caso do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha. Em abril, ele tornou obrigatório o uso de máscaras. Nesta quinta, descumpriu o próprio decreto e desfilou de cara limpa em agenda oficial.

O governador se elegeu com o discurso da “nova política”, mas age como o prefeito de Itabuna, no poder desde a ditadura. Quando Gomes estreou no cargo, em 1977, o Brasil ainda era governado pelo general Ernesto Geisel. Aos 81 anos, ele exerce o quinto mandato municipal.

A biografia do prefeito é recheada de fatos notáveis. Em 1991, a revista “Veja” o descreveu como o “marajá dos marajás”. Ele recebia o equivalente a US$ 17.600, seis vezes mais que o então governador da Bahia. Além disso, empregava cinco parentes na prefeitura.

Orgulhoso, Gomes abriu a casa e posou diante da piscina, decorada com uma cascata artificial de quatro metros de altura. A reportagem conta que ele cativava eleitores com a distribuição de dinheiro vivo.

O prefeito já tentou dividir a Bahia e criar o estado de Santa Cruz. Para barganhar votos no Congresso, prometeu ceder um trecho do litoral a Minas Gerais, que finalmente ganharia saída para o mar. O objetivo, claro, era candidatar-se a governador. A ideia naufragou, mas ele continuou a dominar a política municipal.

Itabuna tem 213 mil habitantes e um desempenho trágico na educação. Entre 5.570 municípios brasileiros, amarga o 5.184º lugar na avaliação do fim do ensino fundamental. A cidade já registrou 67 mortes e está com todos os leitos de UTI lotados. No vídeo do “morra quem morrer”, o prefeito aparece de máscara no queixo.

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