quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

BOLSONARO EMPORCALHA A PRESIDÊNCIA ATÉ DURANTE AS FÉRIAS

Bruno Boghossian, Folha de S. Paulo

Jair Bolsonaro já era um político indigno do cargo que ocupava em 1999, quando dava entrevistas para defender atrocidades como assassinatos políticos e agressões a prisioneiros. “Eu sou favorável à tortura, tu sabe disso”, declarou o então deputado ao programa Câmera Aberta, da TV Bandeirantes.

A propaganda continuou nas duas décadas seguintes. O parlamentar ganhava projeção ao glorificar o regime militar e recomendar a execução de rivais. “O erro da ditadura foi torturar e não matar”, repetiu, dois anos antes de ser eleito presidente.

O país escolheu um apologista da tortura para comandar o Palácio do Planalto. Depois de fazer fama com aquelas declarações, ele passou a emporcalhar a Presidência da República com um repertório atualizado de barbaridades –até durante as férias.

Antes de embarcar para o Guarujá (SP), na segunda (28), Bolsonaro lançou dúvidas sobre a tortura que a ex-presidente Dilma Rousseff sofreu na ditadura. “Dizem que a Dilma foi torturada e fraturaram a mandíbula dela”, disse. “Não sou médico, mas até hoje estou aguardando o raio-X.”

Além de repugnante, a ofensa é covarde e desprovida de lógica. Bolsonaro costuma tratar torturadores como exemplos de heroísmo e explora a selvageria praticada nos porões como arma política. Em 2016, ele mesmo citou o chefe do DOI-Codi como “o pavor de Dilma Rousseff”; agora, debocha dos atos que exaltou.

Não é preciso dizer que o presidente tem o direito de discordar de seus opositores em quase tudo. As provocações hediondas que ele escolhe fazer para alimentar esses confrontos, no entanto, só reforçam que seu comportamento é incompatível com o exercício da política.

Essa é a essência de Bolsonaro. No início de maio, enquanto trabalhava em período integral para atrapalhar os esforços de contenção da pandemia do coronavírus, o presidente ainda abriu um espaço na agenda para receber o Major Curió, símbolo da repressão da ditadura. O Planalto divulgou o encontro e chamou o militar reformado de herói.

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