Nos anos 1970, o economista Edmar Bacha cunhou o termo "Belíndia", que passou a ser usado como sinônimo do abismo entre dois "brasis": a Bélgica dos mais ricos e a Índia dos miseráveis. Em 2009, Bacha disse em entrevista que o conceito não era mais adequado. Em resumo, argumentou que a desigualdade ainda era forte, mas que o crescimento econômico, com aumento de renda e programas sociais, havia melhorado muito a parte "Índia" do Brasil.
Mais de uma década depois, uma pandemia e três anos de um governo que odeia as pessoas pobres, a porção "Índia" está aí, e muito piorada, para qualquer um que tenha os olhos abertos: dorme sob marquises, cata ossos e carcaças, vasculha restos no lixo.
O bolsoguedismo (síntese precisa que li num artigo do professor Silvio Almeida) é uma máquina de produzir desigualdades e o símbolo mais inequívoco disso é o fim do Bolsa Família e sua substituição por outro auxílio que ainda nem tem fonte de recursos assegurada. Mais uma evidência da força destrutiva do bolsoguedismo e de sua base de apoio.
Criado no primeiro governo Lula, o Bolsa Família agrupou programas assistenciais já existentes, ampliou a população atendida e vinculou os pagamentos a uma série de condições a serem cumpridas pelas famílias, tais como vacinar as crianças e mantê-las na escola. Um dos aspectos mais importantes foi pagar o benefício, preferencialmente, às mulheres. Milhares de estudos mostram que o programa ajudou a reduzir a extrema pobreza e a tirar o Brasil do mapa da fome, para onde voltamos, desgraçadamente.
O Brasil de Bolsonaro nos faz retornar a um tempo de brutalidade e indiferença. Em 1947, o poeta Manuel Bandeira escreveu o poema "O Bicho". Diz assim: "Vi ontem um bicho/ Na imundície do pátio/ Catando comida entre os detritos/ Quando achava alguma coisa/ Não examinava nem cheirava/ Engolia com voracidade/ O bicho não era um cão/ Não era um gato/ Não era um rato/ O bicho, meu Deus, era um homem."
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