Alexandre Padilha na articulação política e Fernando Haddad na chefia da Economia estão na restrita cota de confiança de Lula
Vinte anos após subir pela primeira vez a rampa do Palácio do Planalto, em 2003, Luiz Inácio Lula da Silva assume neste domingo, 1º, o terceiro mandato à frente do governo com desafios que vão além da economia. Do “Lulinha paz e amor” à “jararaca”, o presidente que chega agora ao poder diz ter passado por um “processo de ressurreição” e, munido de um discurso conciliador, chamou políticos de centro para compor o Ministério. Os nomes mais influentes da equipe, porém, ainda são do PT.
Em recente conversa com sindicalistas, Lula afirmou que, para ter governabilidade, precisa dialogar até com a extrema-direita. “Eu aprendi muito com o impeachment da Dilma”, argumentou ele, numa referência à presidente Dilma Rousseff, que teve o mandato cassado pelo Congresso, em 2016. “Fora da política não há solução. Quem não conversa, não governa”, emendou.
A composição da Esplanada com 37 ministérios – dois a menos que no segundo mandato de Dilma – abriga agora 9 partidos, incluindo o PT, que vai controlar onze pastas. O ministro que comandará a articulação política do Planalto com o Congresso é Alexandre Padilha, um dos homens da confiança de Lula. Deputado eleito pelo PT, ele ocupou o mesmo cargo na segunda gestão de Lula e também foi titular da Saúde sob Dilma, de 2011 a 2014.
Era Padilha quem estava com o presidente nas negociações de última hora para a entrada do União Brasil no governo. Houve racha no partido, que tem o senador eleito Sérgio Moro em suas fileiras, porque uma ala queria emplacar o deputado Elmar Nascimento (BA) no primeiro escalão. Não obteve sucesso. Elmar foi indicado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), expoente do Centrão.
“A frente ampla do PT vai do P até o T”, ironizou o deputado Danilo Forte (União Brasil-CE). “Agora, tudo é lua de mel, mas depois de 1.º de fevereiro vem a realpolitik. E o comportamento do Congresso em relação ao governo Lula vai depender muito do reflexo das ruas”, insistiu Forte, numa referência à data das eleições que definirão as novas cúpulas da Câmara e do Senado.
Apesar da arranjo às vésperas da posse, os deputados que estão nos partidos com os quais Lula fechou acordo não somam os 308 votos necessários para aprovar, por exemplo, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) na Câmara. A situação é um pouco mais confortável no Senado.
“Estamos dando o primeiro passo na montagem do governo, temos o maior número de mulheres da história do País em ministérios (11) e fizemos um esforço político regional nessa composição. Ainda há muita coisa por vir”, amenizou Padilha, na tentativa de apagar incêndios políticos com Arthur Lira, que disputa a reeleição ao comando da Câmara. Houve também queixas do Solidariedade e do PV, que ficaram sem cargos.
Se a articulação do novo governo com o Congresso está sob os cuidados de Padilha, que foi da Juventude do PT, a economia terá à frente aquele que é conhecido como “o mais tucano entre os petistas”: Fernando Haddad.Lula se aproximou ainda mais de Haddad no período em que esteve preso, de abril de 2018 a novembro de 2019, acusado na Lava Jato pelo então juiz Sérgio Moro, que depois se tornou ministro da Justiça no governo de Jair Bolsonaro. Haddad foi o principal padrinho da união entre Lula e Geraldo Alckmin, no ano passado. À época, Alckmin era do PSDB e adversário do PT. Em dezembro de 2017, o então governador de São Paulo chegou a dizer que “depois de ter quebrado o Brasil”, o petista queria “voltar à cena do crime”.
Guinada
Com um giro de 180 graus na oratória, o ex-tucano fez para Lula, nessa campanha, o papel da Carta ao Povo Brasileiro de 2002, que acalmou o mercado financeiro. Mesmo assim, embora tenha se filiado ao PSB, Alckmin enfrenta a resistência de integrantes da cúpula do PT, que o veem como possível candidato à sucessão do presidente, em 2026. Para Lula, porém, o vice merece todos os elogios. “Vai ser um mascate”, resumiu ele, ao revelar que Alckmin acumularia a função de vice com a de ministro da Indústria e Comércio.
Dias antes de anunciar que Haddad seria ministro da Fazenda e Simone Tebet (MDB) chefiaria o Ministério do Planejamento, Lula foi questionado por sindicalistas sobre a possível indicação de um liberal para o governo. O presidente da CUT, Sérgio Nobre, cobrou um perfil “progressista e desenvolvimentista”, e não ortodoxo, para a equipe econômica. “Não se preocupe. O progressista no governo sou eu”, respondeu Lula.
Na prática, o governo começa com alguns potenciais candidatos à cadeira de Lula: Haddad, Alckmin e Tebet. Não por acaso o PT fez pressão para que ela não ficasse com o Ministério do Desenvolvimento Social, entregue a Wellington Dias (PT), ex-governador do Piauí. A pasta administra o Bolsa Família, vitrine social do partido, e Dias também está na lista dos presidenciáveis de 2026.
Após ser eleito, em outubro, Lula disse a correligionários que, pela primeira vez, o PT enfrentaria oposição nas ruas, no início do governo. Diante dessa constatação, ele escalou o deputado Márcio Macêdo (SE) para a Secretaria-Geral da Presidência. Vice-presidente do PT e tesoureiro da campanha, Macêdo tem trânsito nos movimentos sociais e terá a missão de ampliar o diálogo com esse segmento. Da velha guarda do PT, o ex-ministro Gilberto Carvalho, por sua vez, ficou encarregado de manter conversas com os religiosos.
“O PT precisa compreender a teoria da prosperidade, que mobiliza quase 40% da população”, insistiu o líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes (MG), ao apontar desafios do partido no governo Lula 3. “Para ter diálogo moderno com os evangélicos, é necessário fazer das redes e das ruas um espaço permanente de disputa de narrativas”, completou. Nos bastidores, dirigentes do PT admitem que o partido também vai disputar os rumos do governo Lula 3 com os novos aliados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário