Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes defendeu a inclusão de um artigo na legislação para deixar claro que as regras do mundo real devem prevalecer também no ambiente virtual
Durante a reunião convocada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para discutir políticas de prevenção e enfrentamento à violência nas escolas, ontem, no Palácio do Planalto, com todos os governadores, ministros e representantes do Congresso, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes defendeu a inclusão de um artigo na legislação brasileira para deixar claro que as regras do mundo real devem prevalecer também no ambiente virtual. “Precisamos, de uma vez por todas, determinar que o que não pode ser feito na vida real, no mundo real, não pode ser feito no mundo virtual”, disse.
Para isso, segundo o ministro, bastaria a inclusão de um artigo na lei, a ser regulamentado pelo Congresso. Segundo Moraes, os problemas de violência e preconceito nas escolas têm uma mesma origem: a desinformação que, em geral, é promovida via redes sociais.
“O modus operandi dessas agressões instrumentalizadas, divulgadas e incentivadas pelas redes sociais em relação às escolas é exatamente idêntico ao modus operandi que foi utilizado contra as urnas eletrônicas e contra a democracia. É o modus operandi instrumentalizado para o 8 de janeiro. Não há nenhuma diferença”.
O Palácio do Planalto agarrou com as duas mãos a proposta do ministro. Ontem à tarde, na Câmara, o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, em entrevista sobre a pauta do Congresso — o novo arcabouço fiscal, as medidas provisórias dos primeiros 100 dias de governo e a CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) do 8 de janeiro, que governo já dá como fato consumado —, repetiu as palavras de Moraes, para quem as redes sociais ainda se sentem terra de ninguém, uma terra sem lei. Padilha anunciou que o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do projeto de regulamentação das “bigtecs”, tem o apoio do governo para apresentar seu substitutivo.
Responsável pelo inquérito das fake news, que também investiga os envolvidos na tentativa de golpe de 8 de janeiro, quando o Palácio do Planalto, o Congresso e o STF foram invadidos e depredados, Moraes revelou que foi preciso muito trabalho de inteligência para chegar aos responsáveis pela disseminação da violência, que chegou às redes sociais.
“Há alguns anos, a deep web divulgava esses tipos de mensagens. A investigação era muito mais difícil porque era necessário infiltrar pessoas naquele ambiente para chegarmos aos responsáveis. Hoje é na rede social normal que isso acontece. É no Twitter. Você entra no Google e ensina uma criança a fazer uma bomba, e a incentiva a repetir os atentados que ocorreram nos Estados Unidos”, criticou o ministro.
Projeto pronto
De autoria do deputado federal João Maia (PL-RN), o projeto de regulamentação da atuação das plataformas digitais está pronto para ser incluído na pauta pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). “No Projeto de Lei 2.768/22, proponho uma regulação na linha da Comissão Europeia, mas de forma bem menos detalhada. Isso porque estamos lidando com questões de extrema relevância, que exigem respostas regulatórias, ao mesmo tempo, novas e muito rápidas”, argumenta Maia. O pomo da discórdia é o papel atribuído à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), que ganharia superpoderes para controlar a internet, inclusive seu conteúdo.
O órgão do governo que possui expertise mais próxima da requerida para regular plataformas digitais é a Anatel. Como acontece na União Europeia, o projeto distingue usuários profissionais e finais. Também estabelece critérios para a definição de operadores de plataformas digitais, que serão considerados como detentores de poder de controle de acesso essencial, a receita anual igual ou superior a R$ 70 milhões. A principal crítica conceitual ao modelo proposto por Maia parte da ideia de que o setor se desenvolve de forma disruptiva e esse tipo de regulação seria absorvido pelas “bigtechs”, mas mataria o desenvolvimento das startups, como aconteceu na Europa.
As “bigtechs”, as grandes empresas de tecnologia, principalmente Google, Facebook, Amazon e Apple, todas norte-americanas, mantêm uma queda de braço com as autoridades judiciais brasileiras. O senso comum de que as plataformas digitais representavam uma revolução democrática, e não apenas tecnológica, está em xeque, devido à violência, ao uso maciço de fake news e à manipulação da opinião pública nas eleições. Essa influência negativa está sendo cada vez mais questionada.
A manipulação dos algoritmos por empresas como a Cambridge Analytica, decisiva na campanha do Brexit, na Inglaterra, e da atuação de hackers, principalmente russos, como ocorreu na eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos, em 2016, ligaram o alerta.
Em 2018, o presidente Jair Bolsonaro surpreendeu os adversários ao estruturar sua campanha e focar o marketing eleitoral nas redes sociais, sem que houvesse qualquer controle da Justiça Eleitoral. No ano passado, porém, foi diferente. Desde então, o STF investiga bolsonaristas responsáveis pela produção de fake news nas redes sociais, com objetivos antidemocráticos.
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