quarta-feira, 29 de novembro de 2023

URGÊNCIA DE AÇÃO CONTRASTA COM BAIXAS EXPECTATIVAS DA COP28

Opinião Valor Econômico

Lançamento de gases de efeito estufa deveria cair 45% até 2030, um limiar temporal vital, mas subiram 9%

A COP28 começa amanhã, em Dubai, com expectativas rebaixadas, como a anterior, no Egito. Ditaduras árabes não são o melhor ambiente para uma discussão séria e franca sobre medidas urgentes que precisam ser tomadas para a redução das emissões de carbono - os Emirados Árabes Unidos são o sexto maior produtor mundial de petróleo. A produção de combustíveis fósseis é o elo mais atrasado e resistente a mudanças da cadeia de emissões de gases de efeito estufa. Mantidas as metas de descarbonização global apresentadas pelos países, a temperatura do planeta poderá subir entre 2,6 e 2,9º C, muito além dos 2º C limites do Acordo de Paris e bem acima do 1,5º C considerado aceitável. Muito mais precisa ser feito e é preciso trabalhar urgentemente para isso.

O Brasil teve uma primeira amostra do que significa conviver com a maior temperatura em 125 mil anos, com alguns dias seguidos de termômetros a 2,07 ºC acima da temperatura média pré-industrial (1850-1900). Com as águas do Atlântico perto do Equador aquecidas e ajuda do El Niño, provocado pelo aumento de temperatura do Pacífico, as florestas brasileiras pegaram fogo - da Amazônia ao Pantanal, passando pela vegetação do Cerrado - enquanto que o Sul do país afogou-se em enchentes destrutivas. “Teoricamente você tinha uma seca na Amazônia a cada duas décadas. Agora estamos tendo duas secas fortes por década”, afirma o climatologista Carlos Nobre.

O Brasil foi parte de uma paisagem ameaçada, muito maior. O Canadá teve alguns dos maiores incêndios de sua história, cobrindo de cinzas Nova York, enquanto enchentes se espalhavam por regiões próximas do deserto líbio e a temperatura média da superfície dos oceanos batia recordes.

As 28 conferências do clima realizadas até agora foram pouco eficientes para conter o aquecimento global. A exigência de consenso entre mais de 190 países parece drasticamente inadequada quando apenas 10 deles emitem 90% do total de gases de efeito estufa. As projeções indicam que obter as reduções necessárias para manter temperaturas compatíveis com a vida humana é viável, ainda que politicamente pouco factível. Pelos compromissos atuais, o lançamento de gases de efeito estufa deveria cair 45% até 2030, um limiar temporal vital, mas subiram 9%, segundo o Painel Intergovernamental de Mudança Climática (IPCC).

Para ter alguma chance de limitar o aumento de temperatura entre 1,5º e 2º, seria preciso reduzir drasticamente a exploração e produção de petróleo. As reservas existentes de gás, petróleo e carvão somam 10,6 mil gigatoneladas de CO2 e não mais de 241 mil poderiam ser lançadas na atmosfera para que se restrinja o aquecimento a 1,5º. Admitindo-se que o limite seja de 2º C, o máximo aceitável seria emissão de 660 mil gigatoneladas, pelos cálculos do Potsdam Institute for Climate Impact Research (Valor, 21 de novembro). Mas pelas metas anunciadas, os países produzirão mais do que o dobro (110%) do que seria compatível com a meta de 1,5 ºe 69% a mais do que conteria o aquecimento em 2º C (Folha, 21/11).

Não é por outro motivo que a Agência Internacional de Energia insiste em que não deveria haver a abertura de novas frentes de exploração de petróleo. A situação é pior do que parece, porque governos e empresas estatais dos 19 Estados membros do G20 destinaram US$ 1,3 trilhão em subsídios aos combustíveis fósseis em 2023, segundo a consultoria BloombergNEF (Valor, 24 de novembro). A transição energética está lenta. As emissões de carbono precisariam sofrer inflexão radical até 2030. As empresas petrolíferas, que deveriam ter mudado seu rumo de negócios, não aplicam mais de 2% de seus recursos em energias renováveis, cuja capacidade de fornecimento precisaria triplicar até lá para que seja possível zerar emissões líquidas até 2050. A taxa de investimento nessas energias teria de aumentar para a média de US$ 1,1 trilhão anuais entre 2023 e 2030, mas em 2022 foi pouco mais que a metade disso (US$ 564 bilhões).

O Brasil é o sexto maior emissor de gases de efeito estufa do mundo. Inventário do Observatório do Clima mostra que o país emitiu 2,3 bilhões de toneladas brutas em 2022, uma queda de 8%. O desmatamento emite 48% do total e a agropecuária, 27% (desses, 80% provenientes da pecuária). O país se comprometeu a zerar até 2030 o desmatamento, reduzindo emissões líquidas em 43%, até 685 milhões de toneladas.

A disputa geopolítica entre EUA e China tolhe as iniciativas contra o aquecimento global. Em Dubai, nem Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, nem Xi Jinping, da China, estarão presentes. Há poucas chances de que outro impasse que se arrasta pelas COPs seja resolvido - o financiamento à adaptação e mitigação pelos países ricos para os em desenvolvimento. A promessa de destinação de US$ 100 bilhões anuais, feita na COP15, de 2009 (Copenhague), até hoje não foi cumprida. Dados do Instituto de Meio Ambiente de Estocolmo mostram que cumpri-la faz sentido e que é preciso redobrar os esforços. O 1% mais rico do planeta, 77 milhões de pessoas, foi responsável por 16% das emissões, quantia igual ao das emissões feitas por 66% da população mundial, ou 5,11 bilhões de pessoas.

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