Percentual de investimentos em relação ao PIB ainda está bem distante dos 4% estimados como necessários para modernização da infraestrutura do país
Apesar de o governo Lula defender um Estado empresarial, indutor do crescimento, os investimentos públicos em infraestrutura diminuíram no ano passado, mesmo após o anúncio do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Além disso, as emendas parlamentares, das quais pouco ou nenhum controle se tem, abocanharam parte dos recursos destinados a investimentos federais, somando quase um terço do total, e prejudicando a qualidade dos gastos. Neste ano, os recursos públicos destinados a investimentos devem crescer um pouco, mas é a iniciativa privada que vai fazer a diferença mais uma vez.
Levantamento da consultoria Inter.B prevê aumento de 11% dos investimentos em infraestrutura neste ano, para R$ 215,8 bilhões, após R$ 194,45 bilhões em 2023, dos quais 65% são privados e 35% públicos, levando em conta os projetos de energia elétrica, saneamento, telecomunicações e transportes. Em relação ao PIB, passarão de 1,79% para 1,87%. O percentual está bem distante dos 4% estimados como necessários para a modernização da infraestrutura do país e que não é atingido desde o fim do século passado. A Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib) tem uma estimativa um pouco maior e projeta gastos de R$ 235 bilhões, também com uma predominância do setor privado.
As restrições fiscais são a principal causa do reduzido volume de investimento público em infraestrutura, que foi de R$ 68,7 bilhões em 2022, caiu para R$ 64,7 bilhões no ano passado, mesmo com o novo PAC e a PEC da Transição, e pode subir a R$ 74 bilhões neste ano, segundo a Inter.B. A principal preocupação dos analistas é com as emendas parlamentares, que chegaram a representar 40% dos investimentos públicos no início da década e agora recuaram para pouco menos de um terço. As emendas são geralmente destinadas a áreas de influência dos parlamentares. Municípios sem representantes no Congresso ficam sem. São repassadas a empreendimentos pulverizados, desconectados dos projetos federais, que têm um foco mais amplo e visam a um plano nacional.
O transporte será o principal motor do investimento em infraestrutura neste ano, com R$ 75,3 bilhões, 12,1% acima de 2023, sendo R$ 47 bilhões para rodovias, segundo a Inter.B. O restante será dividido entre hidrovias, ferrovias, aeroportos e mobilidade urbana. Saneamento básico vem a seguir, com R$ 30,47 bilhões, um aumento de 24,16% em relação a 2023.
O governo conta com as concessões de infraestrutura previstas para sustentar o crescimento do PIB deste ano, já disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O PIB vem sendo revisto e pode crescer 2,5%, de acordo com algumas previsões mais otimistas.
Levantamento feito por O Globo (22/1) constatou que há pelo menos 56 leilões de concessões e parcerias público-privadas (PPPs) federais e estaduais previstas para este ano, que deverão acarretar investimentos de pelo menos R$ 173 bilhões se for levado em consideração todo o período de execução das obras. Entre os destaques estão projetos nas áreas de saneamento, rodovias, arrendamentos portuários e linhas de transmissão de eletricidade.
Somente o Ministério dos Transportes prevê 13 leilões de concessões rodoviárias, com R$ 122 bilhões em investimentos estimados na implantação dos projetos. Em energia, a agenda inclui dois leilões para a concessão de 16 lotes de linhas de transmissão, com investimentos avaliados em R$ 24,7 bilhões. Doze projetos que estão sendo estruturados pelo BNDES vão a leilão, dos quais apenas três, do setor de saneamento, vão demandar R$ 18,3 bilhões, referentes às concessões de Porto Alegre (RS), 75 cidades de Sergipe e 48 municípios de Rondônia. Na área de energia, haverá duas licitações neste ano que implicam investimentos totais de R$ 24,7 bilhões.
O setor público vem agindo do lado do crédito, que teve papel forte nos investimentos em infraestrutura em governos anteriores do PT, mas com repercussões negativas nas contas públicas. Agora, houve redução nas medidas com juro subsidiado, embora a parcela destinada à inovação na nova política industrial se apoie nessa estratégia, algo a ser acompanhado com atenção. O BNDES aprovou R$ 57,4 bilhões em novos financiamentos para a infraestrutura no ano passado, com aumento de 24% em comparação com 2022, e liberou R$ 36,1 bilhões para projetos já aprovados, 27% a mais. Para 2024, a previsão é de expansão de 25% a 30% nos dois indicadores.
O setor de infraestrutura e o próprio BNDES vêm contando com a emissão das debêntures como fonte de financiamento. Aprovadas em janeiro, as debêntures de infraestrutura gozam de benefício fiscal que a empresa emissora poderá dividir com o investidor, e poderão ter correção cambial. A Abdib estima que devem movimentar R$ 150 bilhões nos próximos quatro anos.
A expansão do investimento em infraestrutura esbarra também em interferências políticas de setores do governo nas regras de concessões e privatizações, o que pode afastar o interesse do investidor. O marco legal do saneamento, por exemplo, é alvo de críticas desde a transição e já sofreu alterações favoráveis às companhias estaduais. Na área de portos, as privatizações ficaram em segundo plano, mas as concessões estão de pé. Diante das restrições fiscais para o Estado empresário e das demandas sociais, o governo precisa pôr o pé no chão.
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