sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

MADURO DEMONSTRA QUE NÃO QUER PROMOVER DISTENSÃO NA DITADURA

Editorial O Globo

Ao retirar das urnas a maior líder da oposição, ditador venezuelano sufoca esperança de transição democrática

O ditador Nicolás Maduro comprovou na semana passada não ter intenção de promover nenhuma distensão na Venezuela. O Tribunal Supremo de Justiça, que não tem independência e onde todos os juízes foram nomeados pelo regime chavista, tornou inelegível por 15 anos a principal líder da oposição, María Corina Machado. Outros políticos também foram afastados das urnas. A decisão da Justiça é reveladora por desnudar o temor de Maduro. Sua impopularidade é tão grande que ele não se sente mais à vontade para disputar as eleições presidenciais deste ano recorrendo somente à fraude, como fez repetidas vezes no passado. Pesquisa recente mostrou María Corina com 70% das intenções de voto, ante 9% para Maduro.

Levou apenas três meses para ele sufocar a esperança de saída democrática para a catástrofe econômica e social vivida pelos venezuelanos. Em outubro, um acordo entre o regime chavista e representantes da oposição, costurado com a ajuda da comunidade internacional, inclusive o Brasil, prometia eleições presidenciais competitivas. O governo americano chegou a anunciar a suspensão por seis meses de sanções impostas aos setores de petróleo, gás e ouro. As medidas foram saudadas como positivas, por apontar uma saída negociada para a ditadura. Agora ficou comprovado que o herdeiro político de Hugo Chávez não pretende recuar do autoritarismo. Desde o início do ano, a onda de perseguições, intimidações e prisões arbitrárias de adversários políticos cresceu.

Em entrevista ao GLOBO, María Corina, questionada sobre seu plano de luta daqui para a frente, respondeu com uma pergunta: o que fará a comunidade internacional? Até o momento, a reação americana foi mais enfática nas palavras que nos atos. O governo Joe Biden criticou a decisão da Justiça, condenou as perseguições e detenções e afirmou que reveria a política de sanções. A única que voltou a impor proíbe transações com a estatal de mineração da Venezuela. Extraoficialmente, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva considerou os últimos acontecimentos um retrocesso, mas ainda não se manifestou.

A ditadura chavista não é uma chaga apenas para os venezuelanos. O regime causa dor de cabeça tanto para Biden quanto para Lula. Para os Estados Unidos, as preocupações são a onda migratória e o mercado internacional de petróleo. Para o Brasil, o garimpo ilegal na reserva ianomâmi, que usa a Venezuela como base de apoio, e a crise na Guiana. Lula alcançou uma vitória diplomática ao obter de Maduro um recuo no rumo bélico que vinha tomando sua pretensão sobre dois terços do território guianense. Mas é preciso não criar ilusões. São conhecidas as simpatias ideológicas de Lula e sua proximidade do chavismo. Ele deveria tê-las aproveitado para, a exemplo do que fez no caso da Guiana, tentar convencer Maduro a realizar eleições livres.

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