sexta-feira, 1 de março de 2024

QUEDA DE MATRÍCULAS EVIDENCIA ATRASO DAS REFORMAS DO ENSINO

Opinião Valor Econômico

Além de melhorar a qualidade do ensino, governo precisa avançar na oferta de vagas para o ensino técnico-profissionalizante e definir a reforma do ensino médio

O primeiro ano do governo Lula não foi positivo para a educação. Caiu o número de matrículas em todas as etapas do ensino básico, e a evasão escolar aumentou. A reforma do ensino médio empacou e o Plano Nacional da Educação (PNE) também rateia. Mais do que boa vontade, será necessário um esforço extra para tocar os projetos em frente e agilizar as mudanças prometidas para reverter esse quadro.

O Censo Escolar de 2023 divulgado na semana passada mostrou queda de 0,2% nas matrículas no ensino básico, de 47,4 milhões em 2022 para 47,3 milhões no ano passado. A redução se concentrou nas escolas públicas, que perderam cerca de 500 mil alunos, para 37,9 milhões, um recuo equivalente a 1,3%. Já as escolas privadas registraram aumento de 4,7% nas matrículas, para 9,4 milhões de estudantes.

O governo apressou-se em explicar que as famílias que matricularam seus filhos nas escolas públicas durante a pandemia estavam voltando para as instituições privadas. Mas a realidade é que essa conta não fecha. Além disso, antes da pandemia, em 2019, o número de estudantes do ensino básico era de 47,9 milhões, 600 mil a mais do que os matriculados no ano passado. O ministro da Educação, Camilo Santana, falou também do aumento da evasão escolar, que se estima em 450 mil alunos por ano no ensino médio.

A maior queda de matrículas ocorreu na Educação de Jovens e Adultos (EJA), de 6,9%, para 2,6 milhões, o menor número em 11 anos. Conhecida como a última oportunidade para quem não completou o ensino fundamental ou o médio na idade adequada, a EJA vê queda nos números de matriculados desde 2018. Houve recuo de matrículas também nas outras etapas da educação. No ensino fundamental, foi de 1,5%, para 26,1 milhões de matrículas em comparação com 26,5 milhões em 2022. No ensino médio, considerado mais desafiador pelos estudantes, a queda de matrículas foi de 2,4%, para 7,7 milhões.

Do lado positivo, as matrículas na educação infantil aumentaram 4,8%, notadamente na pré-escola. O crescimento das matrículas em creches, para crianças de até 3 anos de idade, foi de 4,7%, somando 4,1 milhões de crianças. Mas o número ainda está longe da meta de oferecer 5 milhões de vagas neste ano, previsto no PNE. A procura pelo ensino integral e profissionalizante também aumentou. No caso do ensino integral, as matrículas cresceram tanto no ensino fundamental quanto no médio, caso em que o índice foi de 21,9%.

O crescimento mais surpreendente foi o da demanda pelo ensino profissionalizante. As matrículas aumentaram 9,1% em 2023, para 2,4 milhões, em comparação com 2,2 milhões em 2022. Isso representa 11% das matrículas do ensino médio. O percentual certamente seria maior se houvesse mais vagas. Pesquisa feita pelo Ministério da Educação e Cultura mostrou o interesse de 80% dos jovens pela modalidade. A Lei 14.645, que estabelece diretrizes para o ensino profissionalizante, foi aprovada em julho de 2023 e sancionada em agosto, mas até agora aguarda regulamentação.

Outra questão urgente a ser encarada é a reforma do ensino médio, que começou a ser aplicada em 2022, mas foi suspensa em abril do ano passado porque, segundo o MEC, é questionada por alunos e professores. A “reforma da reforma” foi apresentada em outubro no Projeto de Lei 5.320, que redefine a Política Nacional de Ensino Médio, e está em análise na Câmara. Enquanto o projeto não anda, a vida de quase 8 milhões de estudantes do ensino médio fica em suspenso.

A maior oferta de ensino técnico-profissionalizante e a definição das regras do ensino médio fazem parte da solução de um dos piores problemas da educação no país, que é a evasão escolar. Enquanto não leva adiante essas questões, o governo recorre a um paliativo, o programa Pé de Meia, que instituiu estímulos financeiros para combater a evasão no ensino médio e incentivar a participação do Enem. O governo estima que 2,5 milhões de estudantes poderão ser beneficiados, ao custo anual de cerca de R$ 7 bilhões.

Ao falar sobre o programa, o presidente Lula justificou que a maior evasão escolar é no ensino médio. “Os meninos não gostam de fazer o curso inteiro e estamos tentando fazer os meninos se motivarem”, disse. Nesse ponto, o presidente se equivocou. Pesquisa feita pelo IBGE, em 2019, com pessoas de 14 a 29 anos e nível de instrução inferior ao ensino médio constatou que 39,1% deixaram a sala de aula pela necessidade de trabalhar e 29,2% pela falta de interesse.

É preciso também melhorar a qualidade do ensino. Na edição de 2022 do Pisa, que é aplicado exatamente a alunos do ensino médio, os brasileiros tiveram nota média 379 em matemática, 20% menor do que a média obtida pelos estudantes dos 81 países que participaram da prova da OCDE. Os brasileiros também ficaram atrás em leitura e ciência.

Aproximadamente 70 milhões de brasileiros não concluíram a educação básica, o que significa 35% da população, com impacto significativo na produtividade. A educação é mais eficiente a longo prazo para reduzir as desigualdades do que os benefícios sociais. Mais importante que a ajuda financeira para estimular o estudante a frequentar o ensino médio é oferecer uma educação que atraia o jovem e que realmente o ajude a se integrar ao mercado de trabalho.

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