Livro mostra que, na história dos EUA, movimentos autoritários convivem com tradições liberais
Uma das grandes narrativas de nosso tempo assevera que os EUA, fiéis a suas tradições liberais, não apenas se converteram numa das primeiras democracias do mundo como ajudaram a espalhar esse regime pelo planeta. Tal enunciado, embora tenha algo de verdade, esconde problemas, como toda grande narrativa. Na vida real, as coisas tendem a ser mais complexas e nuançadas, quando não contraditórias.
"Illiberal America", do historiador Steven Hahn, mostra que, se o liberalismo está inscrito no DNA dos EUA, movimentos iliberais também fazem parte da história do país, desde o início e em altas doses. O mesmo comunitarismo —a auto-organização da sociedade em associações, congregações, clubes etc.— que Alexis de Tocqueville viu como fonte do vigor democrático dos EUA está na origem de disposições autoritárias que muitas vezes se converteram em violência.
Hahn descreve esses movimentos. Há desde os óbvios, como as várias campanhas de limpeza étnica que os colonizadores lançaram contra as populações autóctones, até outros mais sutis, como o formato que a República assumiu a partir do jogo de forças entre federalistas e antifederalistas.
Preconceitos que transitam entre o etnocentrismo, a xenofobia e o racismo sempre estiveram presentes. Pôr indesejáveis para correr cobertos de piche e penas, também. Um elemento bastante forte até os anos 60, o anticatolicismo, quase desapareceu, depois que evangélicos e católicos decidiram unir forças contra o aborto.
O autor mostra ainda que as forças iliberais eram ecumênicas. Grupos indubitavelmente progressistas no século 19 e início do 20 abraçaram com gosto a eugenia. Foi aliás na eugenia americana que Hitler buscou inspiração.
O livro é interessante, altamente informativo e tem uma pegada bem de esquerda. O autor destrincha alguns elementos iliberais no neoliberalismo.
A história é sempre mais complexa do que querem as grandes narrativas.
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