Resultado da estratégia será crucial para 2026
Muito se fala sobre a realização de campanhas eleitorais por igrejas evangélicas, mas pouco se sabe sobre a metodologia aplicada por pastores para alavancar candidaturas de aliados.
É tema delicado. A legislação proíbe propaganda “em bens de uso comum”, ou seja, locais aos quais a população em geral tem acesso, e a interpretação da lei não costuma ser consensual em relação ao que é vedado ou permitido. Mas um influente parlamentar da bancada evangélica assegura que é possível saber com relativa precisão quantos votos a igreja dá para candidatos a deputado federal, deputado estadual e vereador.
As igrejas têm coordenadores políticos. Eles dividem cidades e Estados em uma espécie de distritos. Em seguida, é feito o mapeamento dos colégios eleitorais que estão dentro de cada uma dessas áreas e o potencial de votos em função do número de fiéis.
São distribuídas, então, as candidaturas que serão defendidas em cada uma dessas regiões. Nas eleições municipais, o “distrito” tem um candidato ou uma candidata para a câmara de vereadores. Quando há eleições nacionais, são feitas “dobradinhas” entre uma candidatura a deputado federal e outra a deputado estadual.
A quantidade de votos desses candidatos nessas áreas sempre é semelhante, assegura a fonte.
É nesse cenário que o PT tenta reduzir a rejeição dos evangélicos ao partido. Nos últimos meses, a comunicação da Presidência já tentou adaptar a linguagem de peças publicitárias para alcançar esse público, de 40 milhões de eleitores, segundo dados da própria legenda. E há auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que defendem uma aproximação mais intensa dos líderes religiosos de base, os quais poderiam ser agentes para ajudar a dar capilaridade a programas sociais.
Mas uma cartilha divulgada em meados de agosto pela Fundação Perseu Abramo, instituição vinculada ao Partido dos Trabalhadores, vai além. Ela aponta caminhos práticos para que a militância tente disputar o voto do eleitor evangélico.
A cartilha aponta, por exemplo, que as igrejas são espaços fundamentais para seus integrantes. Tornaram-se os locais onde, na ausência do Estado, encontram apoio espiritual e material.
O documento cita passagens bíblicas com as quais pode haver convergência de pensamento entre militantes do partido e religiosos, com uma pegada social. Lembra que muitas das famílias brasileiras são lideradas por mulheres negras e evangélicas de periferia. Elas colocam o bem-estar de seus filhos como objetivo central de suas vidas, o que pode ser explorado nas campanhas citando as políticas públicas do governo.
Segundo o manual de campanha, grupos conservadores têm usado a ideia de perseguição à fé cristã como “isca aglutinadora”. Por isso, destaca, deve-se evitar associar críticas a pastores e crentes à sua fé ou, então, associar eventuais erros cometidos por estes à religião. E um aviso às campanhas: não se pode tratar todo evangélico como fundamentalista.
Em outro trecho, a cartilha ensina que se deve ter cuidado na forma de combater “fake news”. “É preciso refletir antes de compartilhar conteúdos como forma de reduzir a desinformação.” Nesse sentido, alerta-se para que não ocorram exageros ao falar no nome de Deus nem citar a Bíblia sem conhecê-la.
De meados de agosto para cá, no entanto, algumas notícias para o PT nesse campo não são animadoras.
Em São Paulo, pesquisa do Datafolha divulgada em 23 de agosto aponta que Pablo Marçal (PRTB) liderava no segmento evangélico com 30% das intenções de voto, seguido do prefeito Ricardo Nunes (MDB), com 22%. José Luiz Datena, do PSDB, aparecia com 14%. Candidato de Lula e do PT, Guilherme Boulos (Psol) tinha 12%. A arrancada de 7 pontos percentuais de Marçal, ainda segundo o instituto, havia se dado junto aos eleitores de 35 a 59 anos, entre evangélicos, apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aqueles que se declaram “bolsonaristas”. Boulos apresentava maior rejeição entre homens, evangélicos e quem tem renda familiar acima de cinco salários mínimos.
Porto Alegre é outro exemplo. Candidato à reeleição, o prefeito Sebastião Melo (MDB) tinha 40% de intenção de votos entre evangélicos, contra 26% da petista Maria do Rosário, apurou uma pesquisa Quaest. Entre pessoas de outras religiões, havia uma inversão: Maria do Rosário tinha 39%, contra 31% de Melo.
Em Belo Horizonte, o desafio também é grande. O Datafolha apurou que Mauro Tramonte, do Republicanos, tem preferência acima da média entre eleitores com renda familiar de até dois salários (34%) e entre evangélicos (37%). Já pesquisa Quaest disse que ele aparece na frente entre os eleitores evangélicos, com 39% das intenções de voto. Candidato do PT, Rogério Correia tinha apenas 3% nesse grupo.
Em Teresina, aposta do partido de Lula nas capitais, o eleitorado evangélico é disputado por Silvio Mendes (União Brasil) e Fábio Novo (PT). As articulações vão de compromissos com pautas comportamentais, as quais deveriam ser objeto de discussão apenas do Congresso Nacional, até promessas de regularização de residências e templos religiosos em terras pertencentes ao município.
A disputa deste ano vai servir de laboratório para o PT experimentar essa nova estratégia na abordagem do eleitorado evangélico. Seu resultado será crucial para a eleição de 2026.
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