Nova titular da articulação política usa cerimônia de
posse para tentar dissipar mal-estar com ministro da Fazenda, alvo de suas
críticas; Padilha faz discurso contra bolsonaristas
Em cerimônia de posse, a nova titular da articulação
política tentou aparar arestas com ministro da Fazenda. Em 2023, a cúpula do PT
classificou ajuste das contas públicas apresentado por ele de “austericídio
fiscal”.
A nova articuladora política do Palácio do Planalto, Gleisi
Hoffmann, fez questão de aproveitar a cerimônia de posse na Secretaria de
Relações Institucionais, ontem, para fazer um afago ao ministro da Fazenda,
Fernando Haddad, criticado por ela desde o início do governo. Haddad foi o
primeiro ministro citado por Gleisi, na tentativa de mostrar que, ao deixar a
presidência do PT e ocupar essa cadeira, não será adversária da política
econômica conduzida pelo colega.
Em dezembro de 2023, a cúpula do PT
classificou o ajuste das contas públicas apresentado por Haddad de
“austericídio fiscal”. “Tenho plena consciência do meu papel, que é da
articulação política”, disse Gleisi, olhando para o ministro da Fazenda,
sentado na primeira fileira do Salão Nobre do Planalto.
“Estarei aqui, ministro Haddad, para ajudar na consolidação
das pautas econômicas deste governo, as pautas que você conduz e que estão
colocando novamente o Brasil na rota do crescimento, com emprego e renda”.
O ministro da Fazenda foi citado duas vezes no
pronunciamento de Gleisi, em um claro sinal de que deseja uma aproximação com
ele, após ter exposto, em várias ocasiões, suas divergências com a política
econômica. Ao mencionar o projeto de lei que prevê isenção do Imposto de Renda
para quem ganha até R$ 5 mil – a ser enviado na próxima semana ao Congresso –,
Gleisi fez novo aceno ao titular da Fazenda.
“Esta medida vai ajudar milhões de brasileiros, com absoluta
neutralidade fiscal, como já antecipou o ministro Fernando Haddad”, destacou
ela.
ÁGUA NA FERVURA. Gleisi substituiu Alexandre Padilha,
que na mesma cerimônia tomou posse no Ministério da Saúde no lugar de Nísia
Trindade. A solenidade lotou o Salão Nobre com uma plateia que reuniu políticos
do Centrão ao PT, os presidentes da Câmara, Hugo Motta (RepublicanosPB); do
Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), além de ministros, governadores e do
ex-presidente José Sarney.
Se a temperatura passava de 30 graus ali, no discurso de
Gleisi a intenção era a de jogar água na fervura política. Dona de um estilo
marcado pelo enfrentamento e estocadas no Centrão, a nova ministra pregou
união, disse que chegava para somar, resolver problemas e construir soluções.
Chegou a chamar Hugo Motta de “meu presidente”.
Leques vermelhos com a inscrição “Gleisi Hoffmann – “O que
ela quer da gente é Coragem” – foram distribuídos na cerimônia. Nas rodas de
conversa antes e depois da solenidade
havia rumores sobre a demora de Lula em concluir a reforma
ministerial. “Que ninguém se iluda: não chegamos aqui, com a aliança que
construímos, para dar errado! Já superamos desafios muito mais difíceis e
vencemos”, destacou Gleisi.
A nova ministra assume o cargo no momento mais delicado do
governo, que enfrenta queda acentuada de popularidade, com a missão de
articular alianças de apoio a Lula para seu projeto de reeleição, em 2026. O
problema é que partidos como o PP do ex-presidente da Câmara Arthur Lira, que
não compareceu às posses de ontem, ameaçam até mesmo deixar a base aliada.
RESISTÊNCIAS. A escolha de Gleisi para
Secretaria de Relações Institucionais enfrentou resistências tanto da oposição
como de integrantes da base do governo. Para parlamentares, a postura aguerrida
da deputada pode ser um empecilho para o governo ampliar sua base e conquistar
votos no Congresso.
Na opinião de deputados do Centrão, a pasta das Relações
Institucionais deveria ser ocupada por um nome com mais trânsito entre as
diferentes forças políticas.
Porém, para interlocutores do Palácio do Planalto, Gleisi
deverá amenizar seu perfil, uma vez que estará submetida agora ao chefe do
Executivo
INIMIGO. Desafeto de Lira quando comandava a
articulação política do governo, Padilha disse em seu discurso que nunca teve
inimigos, mas, sim, adversários. “Terei sim um inimigo diante do qual não
recuarei: os negacionistas”, disse o novo ministro da Saúde ao afirmar que
apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro têm “as mãos sujas de sangue” desde
sua atuação contra a vacina de covid-19.
O discurso de Padilha marca um novo momento do Ministério da
Saúde, que, a partir de agora, terá uma visão mais política. Em sua despedida,
Nísia Trindade – que não é filiada a nenhum partido – agradeceu a Lula e disse
que saía como “a ministra do SUS”.
Mesmo assim, Nísia fez um desabafo. De saída do cargo, ela
não escondeu a mágoa com o que chamou de “campanha sistemática e misógina” de
“desvalorização” do seu trabalho no período em que comandou a Saúde ( mais
informações nesta página). “Não é possível e não devemos aceitar como natural
um comportamento político dessa natureza”, afirmou. Foi aplaudida de pé.
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