A cineasta Petra Costa, autora do celebrado “Democracia em
Vertigem”, concluiu seu novo filme. Chama-se “Apocalipse nos Trópicos” e trata
do crescimento das igrejas evangélicas, desembocando no bolsonarismo, para
deslizar na derrota eleitoral de 2023 e nas cenas do 8 de janeiro. O Brasil
passou por momentos apocalípticos e vai bem, obrigado. O longa-metragem estreia
no Rio e em São Paulo no dia 3 de julho.
No mesmo estilo contido de seu filme anterior. Petra
relembrou dias que hoje parecem esquecidos e estão encapsulados em volumes de
processos sobre as tramas golpistas de 2023/2024. Neles, projetos apocalípticos
como o Plano Punhal Verde Amarelo, acabam reduzidos a fanfarronadas de generais
palacianos. Com a colaboração de Anna Virginia Balloussier, foram entrevistados
líderes evangélicos, como o pastor Silas Malafaia.
Por mais estranho que pareça, a melhor
explicação para o crescimento das igrejas evangélicas veio de Lula. A última
pesquisa Quaest revelou que nesse segmento o índice de reprovação de seu
governo chegou a 66%. (Entre os católicos a reprovação está em 53%.)
Em 1980 os evangélicos eram 5% da população brasileira. Hoje
são 26,9%. Feio e irracional, o Brasil de “Apocalipse nos Trópicos” parece ter
passado. Petra Costa revisita os dias da pandemia, quando o país tinha um
presidente que normalizava a morte e duvidava da eficácia das vacinas.
Como em “Democracia em Vertigem”, “Apocalipse nos Trópicos”
mostra um governo desafiado e derrotado. Num caso, quem estava no palácio era
Dilma Rousseff. No outro, Jair Bolsonaro, com suas incitações catastrofistas.
Petra Costa foi feliz no achado do paralelo com um
Apocalipse que ameaça mas não chega.
O filme não trata do governo de Lula 3.0, mas quem for vê-lo
poderá aquilatar-lhe o mérito de ter devolvido o Brasil a uma relativa
normalidade. Aqui e ali estouram crises como as roubalheiras do INSS ou a
trapalhada do IOF, mas a linguagem apocalíptica foi-se embora. Blindados da
Marinha queimando óleo enquanto desfilavam em Brasília mostram um país jogado
em crises artificiais, para nada.
Quem for ver “Apocalipse nos Trópicos” receberá a graça de
poder repetir a despedida de Manuel Bandeira do beco da Lapa, onde vivia com
suas tristezas e perplexidades: “Adeus para nunca mais.”
Os pinguins de Ricardo Nunes
Depois do vexame do tarifaço de Donald Trump, que taxou uma
ilha de pinguins da Austrália, a Secretaria de Educação da cidade de São Paulo
conseguiu acompanhá-lo. Os çábios de Trump valeram-se de algoritmos para
recalcular as tarifas comerciais americanas e ferraram os pinguins, que não
produzem coisa nenhuma. Em São Paulo deu-se coisa parecida. Operando com um
mecanismo de aferição do desempenho dos estudantes da rede municipal,
localizaram 25 escolas com índices insatisfatórios e chamaram seus diretores para
submetê-los a uma necessária reciclagem. Até aí, tudo bem, pois as escolas
precisam ser avaliadas.
O problema surgiu quando entraram na roda o Espaço de Bitita
e seu diretor, Cláudio Marques da Silva Neto. Pela planilha, a Bitita ficou
abaixo do índice. Na vida real, ela tem 800 alunos, com maioria de filhos de
imigrantes. Para cerca da metade das crianças, o português é a segunda língua.
Elas vêm de países como a Bolívia, Afeganistão, Paquistão e até Bangladesh. A
Bitita e seu diretor já foram premiados, inclusive pela Unesco.
Assim como no vexame de Trump com os pinguins, os burocratas
das planilhas são irredutíveis. A Secretaria de Educação explicou-se,
informando que está investido R$ 2,7 milhões na escola, mas a sanção da
reciclagem persistiu, com um precioso palavrório:
“A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP)
informa que seis diretores efetivos foram afastados desde o ano passado com
base nos critérios estabelecidos pela Resolução nº 12, de 23 de janeiro de 2025
(que altera a Resolução SEDUC nº 4, de 19 de janeiro de 2024) . A normativa
regulamenta o processo de avaliação de desempenho dos diretores da rede
estadual, conforme previsto desde 2022, pela Lei 1.374, de 30 de março.”
Puro blablabla. O caso da Bitita expôs um compreensível
ponto cego de um mecanismo de aferição. Em geral ele aponta reais deficiências
das escolas, mas Bitita lida com crianças que vivem em condições especiais,
assim como os pinguins da Austrália. Nada custaria reconhecer a demasia, zero a
zero e bola ao centro. Como os burocratas são irredutíveis, os pinguins
continuam taxados e a Bitita, sancionada.
Covardia nos vestibulares
O repórter Gustavo Gonçalves mostrou que mais de dez
universidades marcaram datas coincidentes para a realização de seus
vestibulares. Pura covardia contra jovens que são obrigados a jogar um ano de
suas vidas em algumas manhãs de exames.
Com a superposição dos exames, os candidatos ficam com suas
opções limitadas. Pouco custaria que esses calendários fossem organizados
facilitando a vida dos jovens.
Quem conhece as mesquinharias das rivalidades acadêmicas
assegura que já houve casos em que uma universidade provocava as coincidências
de datas para prejudicar instituições rivais.
Batendo cabeças
O ministro Sidônio Palmeira precisa trabalhar uma
harmonização verbal entre Lula e Fernando Haddad. Tratando da encrenca do IOF,
de cuja armação o ministro da Fazenda escanteou a Secom, Lula disse:
“O Haddad, no afã de dar uma resposta à sociedade, elaborou
uma proposta da Fazenda. Não acho que tenha sido erro, não, foi momento
político e em nenhum momento o companheiro Haddad teve qualquer problema de
rediscutir o assunto. A apresentação do IOF foi o que pensaram naquele
instante.”
Se foi assim, tudo se resumiu a uma pressa, mas Haddad disse
o seguinte:
“Essas medidas estão sendo analisadas há mais de um ano.”
Musk x Trump
Tendo sobrevivido à presidência de Joe Biden com momentos de
senilidade explícita, a Casa Branca tornou-se território de uma briga de dois
tataranas: Elon Musk e Donald Trump. Por mais arriscado que seja avaliar qual
dos dois é mais perigoso, é provável que o mais doido seja Musk.
Hierarcas tataranas são coisa mais comum do que se supõe.
Nos seus últimos anos de vida, o russo Leonid Brejnev (1906-1982) e o chinês
Mao Zedong (1893-1976), estavam intelectualmente lesados e mal conseguiam
caminhar.
No caso de Brejnev, os parafusos começaram a se soltar em
1968, quando ele tornou-se dependente de pílulas para dormir e para ficar
acordado.
O STF e o Itamaraty
Passando por um período de deslumbramento cenográfico,
alguns ministros do Supremo Tribunal resolveram encrencar com o Itamaraty.
Queixam-se da postura da diplomacia nacional diante da guerrilha que o deputado
Eduardo Bolsonaro vem movendo nos Estados Unidos contra o ministro Alexandre de
Moraes.
Como já houve ministros reclamando do Itamaraty porque não
lhes oferecia escoltas para as farofas a que compareciam em Nova York, fariam
melhor se deixassem os diplomatas em paz.


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