Disputa entre Trump e Musk expõe pontos fracos da
democracia americana e põe apoiadores em dissonância cognitiva que pode ter
efeito salutar
Dois egos desproporcionalmente grandes não podem ocupar o
mesmo espaço de poder ao mesmo tempo. À luz da psicologia, um rompimento
entre Donald
Trump e Elon Musk era
mais ou menos inevitável. Ainda assim, surpreendem a velocidade
da deterioração da relação entre os dois e os termos
fortes com os quais um qualifica o outro agora.
As divergências entre o par vinham se acumulando já havia
algum tempo, mas apenas uma semana atrás eles ainda tentavam dar um ar de
civilidade ao divórcio. Na sexta-feira (30), Trump organizou na Casa Branca uma
despedida para Musk, que deixava o governo para cuidar de suas empresas. Ali
trocaram palavras elogiosas e juraram amor eterno.
Na quinta (5), a eternidade acabou. A
amizade inquebrantável deu lugar a asperezas, que incluíram insinuação de
envolvimento com pedofilia, pedido de impeachment e ameaça de retaliações
bilionárias, tudo em estilo ultra-hiperbólico. Se há algo que as redes sociais
favorecem, é a escalada de conflitos interpessoais.
Eu estaria mentindo se não dissesse que estou me divertindo
a valer com a contenda. Mas há mais coisas em jogo aqui do que o deleite de
quem não gosta de Trump nem de Musk. Como escrevi há pouco aqui,
baixaria também é informação.
A disputa escancara pontos fracos da democracia americana,
em especial no que diz respeito ao financiamento de campanhas e na posterior
retribuição de doadores com favores do governo. Se tivessem juízo, legisladores
e magistrados começariam a repensar essas questões.
A refrega também pode ter o efeito de despertar alguns
eleitores e políticos republicanos de seu sonho dogmático. Sei que estou sendo
mais otimista do que recomenda a prudência, mas não é impossível que alguns
indivíduos que são fãs tanto de Trump como de Musk resolvam a dissonância
cognitiva que o embate entre eles impõe afastando-se de ambos. Afinal, se eles
sempre dizem verdades, nenhum dos dois presta; se mentem, então não havia razão
para idolatrá-los.
Sob vários aspectos, é uma briga didática.


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