Proximidade da eleição presidencial no ano que vem
impossibilita que Executivo e Congresso continuem o simulacro de entendimento a
que dedicaram esforços vãos nos tempos recentes, fingindo que temos um governo
de união nacional
A proximidade da eleição presidencial no ano que vem
impossibilita que Executivo e Congresso continuem o simulacro de entendimento a
que dedicaram esforços vãos nos tempos recentes, fingindo que temos um governo
de união nacional. Nunca se gostaram, têm ideologias distintas e, ao contrário
da vitória apertada do candidato petista sobre o bolsonarismo, no Congresso a
vantagem deste, aliado ao Centrão, dá larga margem vitoriosa à oposição. O
rompimento quase simultâneo dos líderes governistas com os presidentes da
Câmara e do Senado reflete a impossibilidade de a farsa continuar. Daqui para a
frente os embates serão permanentes.
A escolha do deputado Guilherme Derrite para relator do
Projeto de Lei Antifacção na Câmara explicitou a distância que separa o governo
da maioria dos parlamentares, e não poderia ter sido lida de outra maneira pelo
governo. Causou o rompimento do presidente Hugo Motta com o líder petista
Lindbergh Farias, mas foi mais profundo que isso. O próprio presidente Lula
sentiu-se traído por Motta, pois acreditava piamente conseguir lidar com os
políticos do Centrão. Esqueceu, Lula, que há em jogo o controle do poder
central — o que sempre interessa ao Centrão.
O PT não é de abrir mão de espaços para
deixar entrar outros grupos políticos que não dependem dele. Como o Centrão é o
controlador da maioria da Câmara, sempre que possível o PT impedirá seu avanço
institucional. Lula ainda não entendeu que a estrutura política mudou desde
quando chegou pela primeira vez ao poder, em 2003. Naquele momento, o Centrão
não era tão organizado como grupo político e tinha apenas interesses
pragmáticos, cargos públicos e verbas.
Anteriormente, os parlamentares que hoje estão no Centrão
uniram-se para conter o avanço da esquerda na Constituinte e foram
razoavelmente exitosos. Depois não deram continuidade política à ação,
tornando-se um bloco fisiológico. Hoje, Centrão e direita têm maioria na Câmara
e controlam as emendas parlamentares, que cresceram de valor gradativamente e
hoje representam mais que qualquer ministério. O fisiologismo do Centrão
continua a toda prova, mas exacerbou-se a tendência direitista do grupo. Se
antes não se incomodava de termos um governo de esquerda, desde que seus
anseios fossem atendidos, hoje querem mais do que isso.
Se o bolsonarismo deixar que a centro-direita controle a
campanha presidencial e monte uma chapa competitiva, haverá disputa acirrada na
próxima eleição presidencial. Isso implicaria dar a Vice-Presidência a um dos
líderes do grupo. Caso o bolsonarismo insista em manter o controle, haverá
dispersão de candidaturas, que, num primeiro momento, poderá beneficiar Lula.
Como acontece no Chile, porém, é quase automática a união do centro, da direita
e da extrema direita em torno do candidato que chegar ao segundo turno.
Não há expectativa de que a esquerda possa fazer maioria na
Câmara, muito menos no Senado. Continuaremos tendo um Congresso com maioria de
direita, o que facilitará um governo da oposição. Se, porém, a figura pública
de Lula continuar a pairar sobre os partidos políticos, ele terá um quarto
mandato muito mais complicado do que este terceiro. A expectativa de poder será
superada pela síndrome do “pato manco”, o mandatário que não pode mais se
reeleger e fica exposto à sanha dos caçadores — no caso, os partidos e
eleitores de centro-direita.
A desvantagem de Lula é que ele é escolhido não apenas pelo
eleitorado de esquerda, mas por ser um líder político populista e popular. Não
há, na esquerda, nenhum outro político que leve de roldão o eleitorado,
conservador em sua maioria. A direita tem uma série de governadores que podem
substituir, com vantagem, Bolsonaro e sua trupe.


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