O maior golpe à democracia brasileira, o Ato Institucional número 5 (AI-5), criado pelo governo militar do general Costa e Silva, em 13 de dezembro de 1968, completa 40 anos. Com ele, o Congresso Nacional e as Assembléias Legislativas estaduais foram colocados em recesso, e o presidente, à época o general Costa e Silva, passou a ter plenos poderes para cassar mandatos eletivos, suspender direitos políticos, demitir ou aposentar juízes e outros funcionários públicos, suspender o habeas-corpus em crimes contra a segurança nacional, legislar por decreto, julgar crimes políticos em tribunais militares, dentre outras medidas autoritárias. Paralelamente, nos porões do regime, generalizava-se o uso da tortura, do assassinato e de outros desmandos. Tudo em nome da "segurança nacional".
O ano de 1968, "o ano que não acabou", ficou marcado na história mundial e na do Brasil como um momento de grande contestação da política e dos costumes. O movimento estudantil celebrizou-se como protesto dos jovens contra a política tradicional, mas principalmente como demanda por novas liberdades. O radicalismo jovem pode ser bem expresso no lema "é proibido proibir". Esse movimento, no Brasil, associou-se a um combate mais organizado contra o regime: intensificaram-se os protestos mais radicais, especialmente o dos universitários, contra a ditadura. Por outro lado, a "linha dura" providenciava instrumentos mais sofisticados e planejava ações mais rigorosas contra a oposição.
A gota d'água para a promulgação do AI-5 foi o pronunciamento do deputado Márcio Moreira Alves, do MDB, na Câmara, nos dias 2 e 3 de setembro, lançando um apelo para que o povo não participasse dos desfiles militares do 7 de Setembro e para que as moças, "ardentes de liberdade", se recusassem a sair com oficiais. Na mesma ocasião outro deputado do MDB, Hermano Alves, escreveu uma série de artigos no Correio da Manhã considerados provocações. O ministro do Exército, Costa e Silva, atendendo ao apelo de seus colegas militares e do Conselho de Segurança Nacional, declarou que os pronunciamentos eram "ofensas e provocações irresponsáveis e intoleráveis".
O governo solicitou então ao Congresso a cassação dos dois deputados. Seguiram-se dias tensos no cenário político, entrecortados pela visita da rainha da Inglaterra ao Brasil, e no dia 12 de dezembro a Câmara recusou, por uma diferença de 75 votos (e com a colaboração da própria Arena), o pedido de licença para processar Márcio Moreira Alves. No dia seguinte foi baixado o AI-5, que autorizava o presidente da República, em caráter excepcional e, portanto, sem apreciação judicial, a: decretar o recesso do Congresso Nacional; intervir nos estados e municípios; cassar mandatos parlamentares; suspender, por dez anos, os direitos políticos de qualquer cidadão; decretar o confisco de bens considerados ilícitos; e suspender a garantia do habeas-corpus. No preâmbulo do ato, dizia-se ser essa uma necessidade para atingir os objetivos da revolução, "com vistas a encontrar os meios indispensáveis para a obra de reconstrução econômica, financeira e moral do país". No mesmo dia foi decretado o recesso do Congresso Nacional por tempo indeterminado - só em outubro de 1969 o Congresso seria reaberto para referendar a escolha do general Emílio Garrastazu Médici para a Presidência da República.
Ao fim do mês de dezembro de 1968, 11 deputados federais foram cassados, entre eles Márcio Moreira Alves e Hermano Alves. A lista de cassações aumentou no mês de janeiro de 1969, atingindo não só parlamentares, mas até ministros do Supremo Tribunal Federal. O AI-5 não só se impunha como um instrumento de intolerância em um momento de intensa polarização ideológica, como referendava uma concepção de modelo econômico em que o crescimento seria feito com "sangue, suor e lágrimas". Mas, sobretudo, o AI-5 atingiu o que restava de esperança de mudar o Brasil, fazê-lo voltar ao caminho democrático, após o desvio de rota causado pelo golpe de 1964. Em conseqüência do Ato 5, muitos dos jovens que se empenhavam na oposição ao regime militar optaram pela luta armada.
Outro ponto importante a ser ressaltado é o fato de muitos dos personagens que participaram da decretação do regime de exceção, ou dele foram beneficiários, hoje posarem de democratas radicais, lutadores contra o autoritarismo. Alguns só faltam dizer que foram perseguidos pelo regime militar, quando na verdade foram seus instrumentos. Outro é o caso daqueles que foram efetivamente punidos pelo AI-5, e hoje dão as mãos aos seus antigos algozes. Estes escolheram um novo rumo para suas vidas.
Importante publicar aqui este acontecimento triste da história brasileira como forma de recuperação daquele passado, para que nosso país não venha a repeti-lo, seja por que pretexto for; para aqueles que não viveram os anos duros do regime militar, que sirvam para que conheçam um momento particularmente importante da nossa história, que valeu, pelo menos, para que muitos brasileiros dessem provas de um espírito de luta em favor da liberdade e da justiça como poucas vezes se viu.
sexta-feira, 12 de dezembro de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário