As penas impostas quarta-feira pelo Supremo Tribunal Federal
(STF) ao publicitário Marcos Valério, operador do mensalão, nos crimes
cometidos em conjunto com o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, indicam,
segundo especialistas que acompanham o julgamento do processo, que o homem
forte do primeiro governo Lula e acusado de chefiar o esquema terá de cumprir
parte da pena na cadeia.
Dirceu foi condenado por formação de quadrilha e corrupção
ativa por comandar a compra de votos de parlamentares do Congresso Nacional no
primeiro mandato do governo Lula. Por esses mesmos crimes, Marcos Valério foi
condenado pela maioria dos ministros a 10 anos e 7 meses de prisão, sendo 7
anos e 8 meses por corrupção ativa e 2 anos e 11 meses por formação de
quadrilha.
Como a Corte já decidiu que Marcos Valério atuou sob o
comando do então ministro da Casa Civil, os especialistas avaliam que o
tribunal deve impor penas semelhantes ou até maiores para Dirceu. Na
quarta-feira, o relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, chegou a afirmar
que "Marcos Valério aceitou participar da empreitada criminosa comandada
por José Dirceu para dominar o poder político".
Além disso, apontam os especialistas, três fatores aumentam
a probabilidade de ser aplicada a José Dirceu uma pena de prisão acima de 8
anos, o que, pela legislação em vigor, o obrigaria a cumprir parte da punição
em regime inicialmente fechado. Em primeiro lugar, o relator Joaquim Barbosa
indicou, ao longo do julgamento, que fixaria penas maiores aos chefes do
esquema. O mesmo critério será usado pelos demais ministros. O ex-chefe da Casa
Civil foi apontado, pelo Ministério Público, como o líder da quadrilha, mentor
e mandante do esquema.
Um segundo ponto é que os ministros aplicaram, no caso da
corrupção ativa cometida por Marcos Valério, a mais recente lei para esse
crime, aprovada pelo Congresso em novembro de 2003. A norma elevou a pena
mínima de prisão de um para 2 anos e a máxima, de 8 para 12 anos. A
justificativa é que o esquema atuou entre os anos de 2003 e 2005, sendo apenas
desmontado a partir das revelações do delator do mensalão, Roberto Jefferson
(PTB-RJ). A mesma regra deve ser usada pela Corte para o ex-chefe da Casa
Civil.
Outro ponto que reforça a tendência de alta na pena a ser
fixada para José Dirceu é o fato de o ministro Ricardo Lewandowski, revisor do
processo, não participar da dosimetria do ex-ministro da Casa Civil por tê-lo
absolvido dos dois delitos. Na sessão de ontem, Lewandowski contrariou as penas
propostas por Joaquim Barbosa, obteve apoio da maioria no plenário e conseguiu
baixar, em duas oportunidades, as penas aplicadas a Marcos Valério. José Dirceu
não contará com os votos do revisor.
Pela legislação brasileira, um réu que venha ser condenado a
uma pena superior a 8 anos de prisão não ficará na cadeia por todo esse tempo.
Depois de cumprir um sexto da pena, ele terá direito à progressão de regime,
passando do fechado para o semiaberto, pelo qual tem de dormir na prisão, tendo
direito a trabalhar. Contudo, o ex-ministro da Casa Civil só saberá qual seu
destino no processo depois do segundo turno das eleições municipais, marcado
para o domingo, dia 28.
Nos últimos dois dias, o tribunal já aplicou oito penas para
o operador do mensalão pelos crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa,
peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. As penas impostas a Marcos
Valério, se somadas, chegam a 40 anos, 1 mês e 6 dias e quase de R$ 3 milhões
em multas. Para concluir a apreciação das penas impostas ao publicitário, falta
apenas o voto do ministro Marco Aurélio Mello, que pediu para se manifestar
esta tarde quanto aos crimes de corrupção ativa, no caso da compra de votos dos
parlamentares, e evasão de divisas.
Na punição que impôs a maior pena a Marcos Valério por um
crime, de 7 anos e 8 meses de prisão por corrupção ativa, o relator Joaquim
Barbosa destacou que o envolvimento do publicitário na compra de parlamentares
é uma conduta "mais reprovável". "Os motivos dos crimes são
extremamente graves. Os fatos e provas dos autos revelam que o crime foi praticado
porque o PT, cujos correligionários vinham beneficiando as empresas às quais
estava vinculado Marcos Valério, não detinham maioria na Câmara",
concluiu.
Os ministros do STF já admitem ser impossível cumprir o
cronograma traçado por Barbosa e encerrar a análise da dosimetria da pena nesta
semana. O julgamento será interrompido na próxima semana, pois Joaquim Barbosa
já anunciou que viajará para Dusseldorf, na Alemanha, a fim de se submeter a um
tratamento de saúde. E só será retomado no dia 5 de novembro.
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de
envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal
Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele,
parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de
acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o
escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil
e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de
concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República
apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado
e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares e
o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de
quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a
Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre
o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até
três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP,
morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo
publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos
Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além
das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles
respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e
lavagem de dinheiro.
Do portal Terra.
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