domingo, 19 de abril de 2015

PAPÉIS SECRETOS

Da Época
Em 3 de dezembro de 2010, a petista Dilma Rousseff, eleita havia poucas semanas para seu primeiro mandato como presidente da República, mandou anunciar o nome do ministro mais poderoso de seu governo. Dali a dias, Antonio Palocci – ex-ministro da Fazenda, ex-deputado federal, ex-prefeito de Ribeirão Preto e hoje alvo ilustre da Operação Lava Jato – assumiria a chefia da Casa Civil. Era a improvável ressurreição política de Palocci, ceifado do governo Lula anos antes, quando, após resistir a toda sorte de acusações de corrupção, acabou por não resistir ao escândalo da quebra dos sigilos do caseiro Francenildo. Perdeu o cargo, mas não a influência. Palocci ressurgiu na eleição de Dilma. Coordenou a campanha e atuou como arrecadador informal da petista, ao lado do tesoureiro do PT, João Vaccari, hoje preso. A nomeação para a Casa Civil, na qual sucederia a Erenice Guerra, premiava seus bons serviços na campanha. Nas palavras de Dilma, Palocci fora “um dos artífices da jornada vitoriosa” que a elegera. Estava claro quem mandaria em Brasília no terceiro mandato petista.
No mesmo dia do anúncio, Palocci recebeu R$ 1 milhão do escritório do criminalista Márcio Thomaz Bastos, segundo documentos da empresa do petista, em poder do Ministério Público Federal (MPF) e obtidos por ÉPOCA. MTB, como era conhecido o advogado, morreu no ano passado. Em 2010, após uma longa passagem pelo Ministério da Justiça do governo Lula, na qual fez muitas tabelinhas com Palocci, resistia como principal conselheiro jurídico da cúpula do PT. O dinheiro foi repassado sem que houvesse sequer contrato formal. Era um contrato de boca. Duas semanas depois, Palocci recebeu mais R$ 1 milhão de MTB. Os R$ 2 milhões somavam-se aos R$ 3,5 milhões repassados durante a campanha e a pré-campanha de Dilma. No total, 11 pagamentos. Sempre sem contrato. Sempre em valores redondos – R$ 500 mil, no auge das eleições, e R$ 250 mil, antes. Sempre depositados, segundo o próprio Palocci, na conta da Projeto, a empresa de consultoria criada por ele após deixar o governo Lula.
Qual a origem do dinheiro? O Pão de Açúcar, dizem os advogados de Palocci e do escritório de MTB. Por que o Pão de Açúcar pagaria uma pequena fortuna a Palocci? Para que o petista, um médico sanitarista que passava aqueles dias de 2010 na intensa faina de uma campanha presidencial, ajudasse na fusão entre o grupo de Abilio Diniz e as Casas Bahia. Não se sabe como Palocci poderia ser tão valioso numa negociação dessa natureza – nem por qual razão o Pão de Açúcar não o contratara diretamente. Mas ele prestou algum serviço? A renomada consultoria Estáter, contratada de forma exclusiva pelo Pão de Açúcar para tocar a fusão, informou ao MPF que, por óbvio, não – Palocci não prestou qualquer serviço, o que despertou suspeitas entre os investigadores. Fontes que participaram das negociações confirmaram a ÉPOCA que Palocci não participou de qualquer reunião, conversa informal ou troca de e-mails durante o negócio. Em ofício ao MPF, o Pão de Açúcar disse que “em função da relação de confiança desenvolvida” é comum que os “serviços de assessoria jurídica sejam contratados de modo mais informal”. Palocci não é advogado. Procurado por ÉPOCA, o Pão de Açúcar informou que não vai se pronunciar.
Palocci não tardou a cair novamente. Pouco após assumir a Casa Civil, o jornal Folha de S.Paulo revelou que ele comprara um apartamento avaliado em R$ 6,6 milhões, antes de voltar a Brasília. Palocci, que não tem herança e sempre foi político, se recusou a explicar a origem do dinheiro. Disse apenas que provinha dos clientes que contratavam a Projeto, sua empresa de consultoria. Preferiu deixar a Casa Civil a revelar os nomes deles – e a declinar para que fora exatamente contratado. Agora, ÉPOCA teve acesso a documentos internos da empresa de Palocci, a uma investigação sigilosa do MPF sobre ela e a uma lista com 30 nomes de empresas que pagaram o ex-ministro. Os papéis oficiais, assim como a investigação dos procuradores, revelam que a prosperidade da empresa de Palocci coincidiu com o momento em que ele assumiu as tarefas de coordenar a campanha de Dilma – e de arrecadar para ela.
Em 2010, Palocci recebeu, ao menos, R$ 12 milhões em pagamentos considerados suspeitos pelo MPF. Além dos pagamentos do escritório de Márcio Thomaz Bastos, supostamente em nome do Pão de Açúcar, os procuradores avaliaram como suspeitos os pagamentos do frigorífico JBS e da concessionária Caoa. Eles somam R$ 6,5 milhões. São suspeitos porque, na visão do MPF, Palocci, mesmo depois de ouvido, não conseguiu comprovar que prestou serviços às empresas – ou foi desmentido por quem estava envolvido, como no caso da consultoria Estáter e do Pão de Açúcar. Ademais, para o MPF, a inexistência de contratos para muitos dos pagamentos reforça os indícios de que as consultorias foram, na verdade, de fachada. Por que grandes empresas gastaram tanto com Palocci? E qual o destino final do dinheiro? Ninguém sabe ainda.
A investigação à qual ÉPOCA teve acesso corre em Brasília, mas será requisitada por procuradores que trabalham nos dois maiores casos de corrupção sob investigação no país: a Lava Jato. No petrolão, a Procuradoria-Geral da República abriu inquérito para apurar a acusação de que o petista arrecadou R$ 2 milhões – para a mesma campanha de Dilma em 2010. A denúncia foi feita pelo delator Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras. Como Palocci não tem foro privilegiado, o processo contra ele corre no Paraná, sob a guarda do juiz Sergio Moro. Com base no trabalho dos procuradores de Brasília, a Força-Tarefa de Curitiba espera avançar mais rapidamente no rastro do dinheiro que circulou pelas contas associadas ao ex-ministro. Eles preparam o pedido de quebra dos sigilos de Palocci, entre outras medidas.
Clique aqui e leia a reportagem completa da revista Época
Bookmark and Share

Nenhum comentário:

Postar um comentário