Quando Dilma Rousseff foi eleita com Michel Temer na
vice-presidência, em 2010, dirigentes do PMDB vaticinavam que haveria o dia em
que a presidente não poderia ir à Bolívia sem correr o risco de perder o lugar.
De protagonista da cena.
Na época, soava a gracejo. Não apenas porque aqueles eram
tempos de alta popularidade para a “mulher do Lula”. O temperamento ameno, as
maneiras discretas, a formalidade e a vocação de Temer para pacificador não
autorizavam crédito àquela hipótese. Muito menos que se materializasse com a participação
ativa dele.
Mas o tempo, senhor da razão, cuidou não só de conferir
veracidade à previsão como também de torná-la mais realista do que poderia
supor a “rainha”. Dilma não precisa sair do País nem transferir temporariamente
o cargo para virar coadjuvante do próprio governo.
A transformação tem ocorrido na prática, em cada declaração
de Michel Temer, em cada encontro dele com setores organizados da sociedade e,
agora com toda ênfase e clareza, na viagem oficial à Rússia e à Polônia, na
qual o vice-presidente está à frente de uma comitiva de sete ministros e 51
empresários.
O vice mostrou-se em pleno exercício do poder de fato ao
assegurar que Dilma termina o mandato, atribuindo essa convicção à evidência de
que, segundo ele, a presidente “vem se recuperando cada vez mais”. Temer falou
como se fosse ele o avalista do mandato de Dilma Rousseff.
As palavras do vice são recebidas com mais atenção que as
negativas da titular sobre a possibilidade de uma renúncia. À medida que os
erros persistem vai deixando de ser um ato de vontade. Não passou despercebida
a falácia a que Michel Temer recorreu na Rússia. É óbvio que ela não vem se
recuperando. Pode até se reerguer, mas por enquanto afunda-se a cada gesto,
ação, declaração ou decisão.
Enquanto a presidente se esconde, o vice se expõe. Quando
leva ministros e empresários em missão de negócios e dá a declaração que deu,
Michel Temer está exercendo o papel de chefe da Nação aos olhos de quem
importa: o empresariado, os caciques da política, a população que vê a foto e
lê a notícia.
Ainda mais se seus aliados mais importantes, em destaque o
ex-presidente Lula, silenciam sobre o assunto, deixando a defesa do mandato da
titular ao encargo do suspeito número um.
Encontro marcado. Lideranças do PMDB negam que estejam
conversando com o PSDB sobre o desenho do cenário político na hipótese de um
pós-Dilma antecipado. Não é verdade. Conversam sim e defendem a necessidade de
uma conversa franca entre os presidentes dos dois partidos.
Sinuca de bico. Com a avaliação dos líderes partidários de
que o pacote do ajuste fiscal terá “tramitação dura”, eles estão dizendo que a
missão de aprovar a volta da CPMF é quase impossível. E o governo, quando se
dispõe a propor uma solução amplamente repudiada de antemão, transmite as
seguintes mensagens: está numa sinuca, sem saída, e por isso mesmo vai jogar
duro com o Congresso.
Não tem, contudo, instrumentos eficazes à mão. O único e
último recurso é construir uma narrativa segundo a qual o Congresso levará o
País ao desastre se negar apoio às medidas do Executivo. O êxito dessa
estratégia, no entanto, está diretamente ligado ao grau de confiabilidade de
que dispõe o Palácio do Planalto junto à sociedade. E este, como se sabe, numa
escala de 0 a 100, não chega a oito. Número equivalente ao porcentual dos cidadãos
contentes com a atual administração.
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