Carlos Alberto Sardenberg, O Globo
O presidente do Senado pode se hospedar no luxuoso Hotel
Emiliano, em São Paulo, com diária base de R$ 2.236,50, paga pelos cofres
públicos, e ali receber um empreiteiro ao qual pediu dinheiro para a campanha
eleitoral de seu filho?
Para Renan Calheiros, não tem nada demais. Está dentro de
suas prerrogativas institucionais. O senador confirmou que esteve com o
empreiteiro Ricardo Pessoa no Emiliano; que pediu doação para a campanha de
Renan Filho a governador de Alagoas; que recebeu o dinheiro (R$ 1 milhão) via
diretório estadual do PMDB.
Negou a outra parte constante da delação premiada de Ricardo
Pessoa. Segundo o empreiteiro, o dinheiro doado tinha sido desviado de um
contrato para construção de Angra III e era uma espécie de pedágio pago ao
PMDB.
Renan disse que não sabia nada disso e que a doação foi
pedida e recebida legalmente.
Digamos que ele esteja falando a verdade. Resta no mínimo
uma irregularidade e, com certeza, um desvio ético grave: com o dinheiro do
Senado, do contribuinte, pois, o presidente se instala no caríssimo hotel para
tratar com empreiteiros da campanha de seu filho. O fato de Renan não ter se
preocupado com esse detalhe, quando negou a corrupção, mostra bem como esse
pessoal se julga dono da coisa pública.
Ricardo Pessoa entregou vários políticos do PMDB, como o
senador Romero Jucá e o ex-ministro de Minas e Energia Edson Lobão, também
senador. Todos negaram que se tratava de propina, mas também não se preocuparam
com o entorno dos fatos. Confirmaram que as doações foram combinadas em
jantares nos restaurantes dos hotéis Emiliano e Fasano, este um pouco mais
barato, com diária promocional, ontem, de R$ 1.370,25, sem café da manhã (mais
R$ 89,27).
Quem terá pago a conta dos jantares, que não saem por menos
de R$ 200 por pessoa, sem bebidas? O contribuinte brasileiro ou o empreiteiro
que vivia de contratos com o governo? Resultado: o povo brasileiro, em qualquer
hipótese.
Pode parecer exagero, mas vamos prestar atenção às
circunstâncias. Suponhamos que Ricardo Pessoa esteja dizendo a verdade, uma
hipótese possível, já que a sua delação premiada só vale, e ele recebe o
benefício de cumprir a pena em casa, se oferecer provas ou indícios
suficientes. Nesse caso ficamos assim: um senador usa dinheiro público para se
hospedar ou jantar em casas de luxo, onde recolhe dinheiro proveniente de
corrupção em obras públicas.
Não era dinheiro de corrupção — é tudo que negam.
Não é de estranhar.
Querem outro exemplo desse tipo de visão do dinheiro
público? Cada um dos 81 senadores tem direito a carro de luxo para uso
“institucional”. Aliás, o Senado está renovando sua frota por estes dias.
Renan Calheiros, lógico, tem direito a seu carro. Mas como é
o presidente da Casa, pode usar um veículo mais luxuoso e tem direito a mais
um. O que nos leva a uma situação assim: Renan está deixando o Senado e o
segurança pergunta ao assessor: “Sua Excelência está como simples senador ou
como presidente?”
“Presidente”, responde o assessor.
E o segurança: “Então é aquele carro ali da direita.”
O terceiro carro, luxuoso igualmente, é da segurança — e
neste caso é sempre o mesmo.
Via Blog do Noblat. Carlos Alberto Sardenberg é jornalista
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