O juiz federal Marcelo da Costa Bretas, da 7ª Vara Federal
Criminal do Rio, aceitou no início da noite a denúncia apresentada hoje pelo
Ministério Público Federal (MPF) contra o ex-governador Sérgio Cabral Filho
(PMDB). Agora, o peemedebista é réu em quatro ações penais, sendo três em
tramitação no Rio e uma em Curitiba.
Na denúncia, o ex-governador é acusado de 184 crimes de
lavagem de dinheiro, como resultado da Operação Eficiência, desdobramento
fluminense das investigações da Força-Tarefa da Lava Jato. Além de Cabral,
foram denunciados por crimes de lavagem de dinheiro Carlos Miranda (147 vezes),
Carlos Bezerra (97), Sérgio Castro de Oliveira (seis), Ary Ferreira da Costa
Filho (dois), Adriana Ancelmo (sete), Thiago de Aragão Gonçalves (sete),
Francisco de Assis Neto (29), Álvaro José Galliez Novis (32).
Sérgio de Oliveira, Thiago de Aragão, Francisco de Assis e
Álvaro Novis também foram denunciados por integrarem a suposta organização
criminosa chefiada pelo ex-governador. A denúncia também apresenta crimes
atribuídos a dois colaboradores no processo, os doleiros e irmãos Renato e
Marcelo Chebar. Eles faziam parte da organização como operadores financeiros,
enviavam dinheiro para o exterior em nome da quadrilha. Fizeram acordo de
delação premiada para receberem penas menores (seis meses de prisão domiciliar
e seis meses de prestação de serviços). A Operação Eficiência investiga a
prática de corrupção em obras públicas de grande porte no Rio de Janeiro
durante o governo Cabral, de janeiro de 2007 a abril de 2014.
Uma planilha de controle de gastos com mais de 1.500 itens
fornecida pelos irmãos Chebar é a base da segunda denúncia do Ministério
Público a partir da Operação Eficiência. Dessa vez, os procuradores da Lava
Jato no Rio se debruçaram sobre os gastos de Cabral no Brasil. De acordo com o
procurador Sergio Pinel, a planilha mostra como Cabral se valia de uma
“instituição financeira paralela” – os serviços dos Chebar – para bancar seus
hábitos luxuosos.
Entre os 1.500 itens da planilha de controle de caixa, os
procuradores conseguiram decifrar 150 fontes de gastos. Os demais estão
registrados em código ainda não decifrado. Há 19 citações a um prestador de
serviço que oferecia ao então governador fretamentos de voos de helicópteros,
emissão de passagens aéreas e serviços de embarque e desembarque, no total de R$
1,06 milhão.
“Em viagens a Londres e Dubai, gastaram 287 mil. São viagens
feitas por eles com dinheiro administrado por essa instituição financeira
paralela, que eram os colaboradores (os irmãos Chebar). Eles recebiam dinheiro
dos operadores da organização criminosa e empregavam para pagar as contas de
Cabral e da família”.
A denúncia mostra que Cabral fez 21 viagens de helicóptero
nos meses de janeiro e fevereiro de 2015 com esse prestador de serviço. Gastou
dessa forma R$ 187 mil. Os deslocamentos mais caros foram entre os dias 24 de
janeiro e 26 de janeiro de 2015. No sábado, 24, o helicóptero fez o trajeto
Aeroporto de Jacarepaguá – Mangaratiba (onde o ex-governador tem casa de
veraneio), Mangaratiba-Guarulhos e Guarulhos-Aeroporto de Jacarepaguá. No dia
seguinte, o helicóptero voltou a Guarulhos, a serviço de Cabral. E em 26 de
janeiro, fez duas vezes o trajeto Mangaratiba-Aeroporto de Jacarepaguá;
Jacarepaguá-Palácio Guanabara; e de volta ao aeroporto. O passeio no fim de
semana custou R$ 116,1 mil.
“Sérgio Cabral usufruía muito bem desse dinheiro”, afirmou o
procurador.
Cruzamento feito pelo Estado mostra que em 26 de janeiro de
2015, Adriana Ancelmo voltou de Londres, no voo BA 0247, da British Airways,
que pousou em Garulhos. A então primeira dama passou pelo controle de
passaporte da Polícia Federal às 7h03.
Pinel explicou que a primeira denúncia da Eficiência foi
referente a lavagem e evasão de divisas ligadas a Eike Batista e suas empresas.
“Esta (nova) denúncia é relacionada aos crimes de lavagem de dinheiro cometidas
aqui no Brasil e não tem nenhuma relação ao Eike”, afirmou o procurador.
Os doleiros recebiam dos outros denunciados dinheiro em
espécie supostamente gerado por crimes de corrupção, mantinham os recursos sob
seu controle e os usavam para pagamentos de despesas em favor dos membros da
suposta quadrilha. Entre 1º de agosto de 2014 a 10 de junho de 2015, o valor
desses desembolsos chegou a R$ 39.757.947,69. A média de gastos era de
aproximadamente R$ 4 milhões por mês.
As provas reunidas nas Operações Calicute e Eficiência
indicam que Cabral,Carlos Miranda, Carlos Bezerra, Sérgio de Oliveira, Thiago
Aragão, Adriana Ancelmo, Álvaro Novis, Francisco de Assis Neto, Ary Ferreira
da Costa Filho e os colaboradores promoveram a lavagem de ativos, no Brasil, de
sete maneiras. Uma foi o pagamento, no Rio, de despesas pessoais de Cabral e
seus familiares; outra foi a quitação de despesas pessoais de Carlos Miranda e
sua família; uma terceira foi a movimentação de recursos ilícitos para Carlos
Bezerra. Houve ainda distribuição de recursos ilícitos por Sérgio de
Oliveira; o envio de dinheiro sujo para Thiago Aragão; o mesmo tipo de
operação para Francisco de Assis Neto; e entrega de dinheiro, por Novis, aos
irmãos Chebar
Segundo a denúncia do MPF, “os conjuntos de atos de lavagem
de dinheiro narrados tinham por objetivo converter os recursos de propina em
ativos de aparência lícita e/ou distanciar ainda mais de sua origem ilícita
o dinheiro derivado de crimes de corrupção praticados pela organização
criminosa”.
Cabral e os demais acusados foram denunciados pelos crimes
de pertencimento a organização criminosa e lavagem de dinheiro cometidos no
Brasil. O MPF ressaltou, porém, que, diante do tamanho do esquema criminoso, a
nova denúncia não esgota todos os crimes de lavagem de dinheiro cometidos no
Brasil, tampouco todos os fatos criminosos supostamente praticados pelo grupo.
Eles poderão ser objeto de novas denúncias.
A denúncia é assinada pelos procuradores da República
Leonardo Cardoso de Freitas, José Augusto Vagos, Eduardo El Hage, Renato Silva
de Oliveira, Rodrigo Timóteo, Rafael Barretto, Sérgio Pinel, Jessé Ambrósio
Junior e Lauro Coelho Júnior. Na peça, eles afirmam que “o vultuoso volume de
recursos obtidos em razão dos crimes praticados pelo grupo criminoso exigia
uma forte estrutura destinada à movimentação e lavagem do dinheiro da
propina”.
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